Camille.Pezzino 26/01/2018
O TEMPO DOS DESERTOS
Ler O Deserto dos Tártaros vale a pena.
Acredito que uma afirmação deva sempre vir à frente de uma justificativa, pois é dessa forma que evoluímos. Entendermos as nossas opiniões, compreender a nossa forma de pensar e conseguir explicar o porquê é muito difícil, mas, assim que conseguimos, passamos para um novo estágio: debater, dialogar e conversar com o outro - para que, mais uma vez, possamos investigar o mundo e abrir nossos horizontes. Um ato cotidiano, um ato que devemos levar a sério.
Dizer que ler O Deserto dos Tártaros vale a pena também precisa de uma justificativa: a própria obra fala, exclama por si quanto a isso. Não pelo seu enredo principal, visto que não há nada de surpreendente à primeira vista, mas sim pelas camadas filosóficas que as areias daquele deserto nos transmitem somente por passar os olhos.
Dentro desse fascínio, nós nos perdemos tanto quanto o personagem - supostamente - principal, Giovanni Drogo. Confesso que foi um livro difícil de ler, não por sua densidade gramatical ou por seus contornos literários mais puros, até porque a escrita de Buzzati é extremamente simples e poética com seu tom jornalístico costumeiro, mas porque é um livro que fala de um tempo parado e que se move ao mesmo tempo.
Pode parecer confuso dizê-lo - e é -, porém o que eu quero dizer é que nada - literalmente - acontece durante boa parte da história, somente o tempo se move, ainda que os próprios personagens não sejam capazes de senti-lo antes que seja tarde demais. É um tempo que se move tão lentamente que você sente a história parada, porém, você sabe, a partir das indicações do autor dentro da narrativa, que a história está em constante movimento.
Existe uma ambiguidade singular dentro de toda a obra, mas, a principal delas se remonta ao forte Bastiani. Embora o protagonista seja Drogo, um tenente que acabou de começar a vida e foi enviado para um lugar distante de tudo e todos que conhecia, para mim, o personagem principal é o forte. O Forte é aquele que embora se altere como os homens diante do tempo, é o único entre todos eles que permanece de pé. Além disso, há uma duplicidade nas estruturas que mantém os personagens dentro da trama e dentro do próprio forte: ele liberta ao mesmo tempo que prende.
A liberdade exercida pelo forte está nos contornos, na beleza das paisagens e na segurança de poder - um dia - ir embora. Ao mesmo tempo, o forte prende os personagens que não conseguem escapar da mirada e não podem sair quando querem, pois precisam seguir as ordens. É nesse misto, nessa duplicidade que o Forte Bastiani se mantém na cabeça de Drogo, na cabeça de muitos outros personagens. A liberdade confinada. A prisão livre.
Contudo, entre tudo o que o livro de Buzzati apresenta, o que é mais nítido é a vida. A vida humana. O romance é uma alegoria do ordinário da vida humana, representada a partir da perspectiva de um militar. Essa afirmação é um tanto contraditória com as opiniões de alguns dos especialistas e leitores de O Deserto dos Tártaros, porém, foi o que me pareceu na leitura.
RESTO DA LEITURA EM: https://gctinteiro.com.br/resenha-20-o-tempo-dos-desertos/
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