Julia 25/05/2022
Não é o melhor livro do mundo, mas me envolveu
Ler ‘Solitaire’ sem cuidado e sem se atentar aos gatilhos é muito perigoso.
Grande parte dos leitores, se não todos, tiveram ou terão um contato com o livro por meio da leitura e série de ‘Heartstopper’, o que demonstra que o próprio “Osemanverso” possibilita a expansão e curiosidade para a leitura de outros livros da autora. No entanto, indicar e ler ‘Solitaire’, por exemplo, sem procurar e expor os gatilhos disponibilizados pode ser muito perigoso. Por experiência própria, até mesmo se você pensar que está preparado ou que “não será tudo isso”, ainda há possibilidade de que a leitura vá te afetar.
Embora publicado em 2014 e tendo sofrido edições em 2020, ‘Solitaire’ foi escrito quando Oseman tinha apenas 17 anos (em 2012), atribuindo a importância de ressaltar a idade e experiência da autora antes de formar uma opinião sobre a exposição dos personagens e suas relações, o desenvolvimento e desfecho da obra e até mesmo como algumas questões são retratadas. De maneira geral, como um livro de estreia, atendeu minhas expectativas e merece a nota de 4,5 (por algumas razões específicas também).
Talvez algumas pessoas pensem que se trata de um livro sem graça, ao comparar com outras experiências, uma vez que os personagens se envolvem em grandes aventuras ou vivem romances inesquecíveis. ‘Solitaire’ não é uma história de amor, como a própria capa revela. ‘Solitaire’ possui um enredo realístico e cotidiano, que lida com temas sobre a busca pela própria identidade e saúde mental, demonstrando como Victoria “Tori” Spring, uma narradora pessimista e muito dura consigo, que provavelmente tem ansiedade e/ou depressão não diagnosticadas e precisa de terapia, é tão humana quanto você, caro leitor.
“Extraondinary is only an extension of ordinary” (Extraordinário é só uma extensão do ordinário)
O livro caminha entre os pensamentos e críticas que Tori guarda para si e entre suas vivências com a família, Michael Holden e outros poucos personagens, mesmo que seja de forma superficial. Além disso, pontua as ações, cada vez mais intensas, que ‘Solitaire’, uma espécie de organização situada em um blog, desempenha. Victoria consegue ser muito tóxica para si e muito honesta com as pessoas a sua volta, – algumas partes chegam a doer no fundo do coração - e, ainda assim, é possível observar o quanto ama Charlie, seu irmão, e como faria de tudo para vê-o feliz.
Todavia, o desenrolar é uma mistura de emoções e, em dado instante, pode se tornar desconfortável e até mesmo muito pesado para o leitor. Por isso, não julgo que seja um livro para qualquer um, nem para qualquer momento. Ao menos, é necessário estar bem, consciente que a leitura pode fazer mal.
Não é o melhor livro do mundo. Tem suas falhas e seus descuidos. Entretanto, cumpriu o papel de me envolver com a narrativa.
[POSSÍVEIS SPOILERS]
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Fez com que me identificasse e me importasse com Victoria Spring - mesmo que significasse me engatilhar e largar o livro por dias ou chorar horrores a cada página e querer abraçá-la, dizendo que tudo iria ficar bem. Fez com que eu quisesse a proteger de todo o mal do mundo e de seus próprios pensamentos. Bem como me fez me orgulhar de seu desfecho (da personagem, não do livro em si), ao passo de compreender ser errado julgá-la como uma simples narradora chata.
“Everyone’s got such dreadful problems” (Todo mundo tem problemas tenebrosos)
Por fim, ‘Solitaire’ me fez me identificar com Michael Holden. Amar sua visão de mundo e suas fraquezas. Marcar todas as suas frases fantásticas, para usá-las futuramente, e pensar para além da história. Lembrei-me que já fui como Tori e precisava de alguém como Michael, sem nem saber que precisava. Da mesma forma que hoje sou mais como Michael, buscando me conectar com certas pessoas à minha volta e, quem sabe, mudar um pouquinho suas vidas ou, talvez, ter minha vida transformada.
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