Maria Gabriela 07/10/2022
É excluído por ser diferente? O poder do amor resolve!
"A Extraordinária Garota Chamada Estrela" me decepcionou, e muito. É uma obra que promete apresentar a quebra da normalidade dos estudantes da escola de Mica quando uma misteriosa (e exótica) garota chamada Estrela começa a frequentar as aulas; a princípio, essa é a ideia principal da história e, como esperado, busca apresentar uma lição de moral já muito compreendida: todos os seres humanos são diferentes e ninguém é igual a ninguém, ser diferente de todos é bom e você, leitor, não deve se prender a estereótipos ou se forçar a fazer parte de um grupo que não se sinta confortável, mas que a sociedade aponta como normal e correto a você. É uma receita de enredo simples e funcional para o público alvo da obra, mas esse livro conseguiu falhar no ÚNICO propósito que tinha.
A falha começa pelos personagens. Leo, o narrador-personagem e titulado protagonista da obra, é insuportável. Ele sequer deveria exercer papéis tão importantes se seu único traço é seguir o fluxo do bando, não tomar um partido sequer nos assuntos e narrar tudo de forma tão preguiçosa. Ele é ridículo e não há como alguém conscientemente gostar dele como personagem. A narração dele não passa os sentimentos esperados por todos os personagens, oscila entre se decidir se será extremamente detalhada ou se será muito, mas muito breve mesmo. Mais para frente da história, ele sequer esconde que sempre passou de um "Maria vai com as outras", pois sua principal preocupação nunca foi com a Estrela, mas sim se ele era aceito e incluído pelos demais estudantes da escola (que, detalhe, sequer sabiam que ele existia). Ele não era popular, mas também não era excluído, era somente mais um colega de classe que ocasionalmente apareceria numa foto de turma, mas se não estivesse ali no momento, pouca diferença faz. O romance dele com a Estrela foi forçado, porque é evidente que não passou apenas de um interesse no exótico. Ele era mais um cinegrafista do National Geographic observando e desejando guardar para si o animal mais diferente do mundo, e quando ele conseguiu, ele a tratou como LIXO.
A estrela da história, Estrela, foi uma personagem que eu detestei no início, mas aprendi a gostar conforme os capítulos avançavam. Quando ela apresentou e começou a se portar diferente do "normal" que os estudantes de Mica colocavam como adequado, ela foi retratada como uma pessoa insuportável e extremamente detestável; não importasse se ela apenas fazia o bem e procurava trazer alegria aos colegas, aos olhos do narrador, ela era apenas uma personagem chata e banhada no clichê de "bondade e alegria acima de tudo, assim que se faz uma princesa da Disney". Entretanto, conforme os capítulos e a história avançavam, Estrela se tornou uma personagem gostável: ela era diferente, mas de um jeito bom; ela era única e original, não se importava com as opiniões dos demais e não se preocupava se estivesse cumprindo os requisitos para fazer parte de um determinado grupinho. Ela era única e por isso é uma personagem tão legal.
Dori Dilson merece uma breve menção por ser a única personagem que não foi uma "Maria vai com as outras". Ela não teve nenhuma fala sequer, mas conseguiu fazer mais coisas que o próprio protagonista. Archie, desde o início do livro, foi um personagem que amei muito: assim como a Estrela, ele é original e não se importa com as opiniões ou com as intrigas que os alunos forçam para cima dele. Ele já é um homem de certa idade, não vai gastar seus últimos anos de vida se estressando com um bando de adolescente chatos! Ele e Dori parecem serem os ÚNICOS personagens que se importavam verdadeiramente com Estrela e a aceitavam independentemente do que ela fizesse ou falasse no dia a dia.
Os demais personagens? Simplesmente insuportáveis. Ele são a representação mais preguiçosa e estereotipada de "Maria vai com as outras". Quando a Estrela era popular e querida por todos, eles a imitavam e buscavam espalhar o bem e a alegria como ela; se ela cantasse no refeitório, eles cantavam com ela. Se ela ria, eles riam com ela. Se ela dançava ou distribuía cartões, eles faziam o mesmo. Eles riam COM ela, e não dela. Todo esse amor por ela simplesmente morreu da noite pro dia quando Estrela se comoveu por um adversário de basquete ter se machucado gravemente numa partida e ela ter ido AJUDAR o rapaz. Foi ridículo ver como eles a viram como uma traidora e como o amor se tornou ódio. A questão nesse ponto é como o ego subiu a cabeça de todos e quando Estrela se mostrou humana perto do "inimigo", magicamente ela era uma impostora, alguém que deveria ser exilada.
O bullying que fizeram com ela me deixou com muita raiva. TODA a escola se reuniu para tratá-la mal e ridicularizá-la, mas incrível que não tinha nenhuma alma boa (além de Dori) que visse aquela situação e não pensasse em ajudar. "Ah, mas é uma crítica de como somos muito preocupados com o que os outros vão pensar de nós...", EU SEI! Eu sei muito bem qual foi a intenção nesse momento, mas é quase uma piada que nem mesmo um professor sequer viu aquela situação e não decidiu intervir. Como o Leo, o suposto amigo e namorado de Estrela, viu aquilo e não moveu um dedo para ajudar. "Ah, mas ele estava preocupado com a imagem dele...", EU SEI DISSO TAMBÉM! Mas ele nunca se importou com ela quando sentiu que não era mais parte do coletivo, ele até FORÇOU a menina a mudar seu jeito de agir e ser só para agradar os OUTROS.
Para um livro que buscava ensinar que ser diferente é bom, falhou miseravelmente. Estrela demonstrou ser diferente e foi praticamente isolada de todos. Ninguém, nem mesmo os professores, se importaram em nadar contra essa maré e ajudá-la. Mesmo que ela não se importasse com aquela situação e continuasse a ser diferente de todos, na vida real não é assim. E isso que mais me preocupou. A obra passou uma lição de moral tão distorcida... Atualmente, com a idade que tenho, se alguém não gosta de como eu sou, sequer me importo ou não me afeta em nada; mas e para alguém que é consideravelmente mais novo e está numa fase que as opiniões sociais são mais importantes que seu bem-estar? Que se ele não estiver inserido em um determinado grupo, ele não é parte do coletivo? É preocupante ver que mesmo sendo uma obra cultuado, sua ideia de lição não foi passada de forma correta; pior, foi passada através de alguém que quase deu um chilique quando foi ignorado por um dia!
O final foi revoltante. Mesmo após todos os problemas, de todos jurando de pé junto que jamais a acolheriam de volta, todo o bullying e preconceito foram resolvidos com o poder do amor e da amizade! AMOR E AMIZADE. Magicamente, todos esqueceram que a odiavam e como a repudiavam. Bateu um alzheimer coletivo e todos esqueceram que odiavam a Estrela por ela ser diferente. Ela não fez nada para mudar a concepção das pessoas sobre ela, as pessoais ainda a odiavam quando o esquecimento súbito fez com que ignorassem o ego enfiado até o talo e a "acolhessem".
Eu odiei. Essa deve ser a resenha mais longa que já escrevi, mas tudo vai se resumir em como odiei essa história. Meu ponto de vista ainda se manteria mesmo se eu tivesse lido esse livro anos atrás, quando era pré-adolescente.