Line 27/03/2009
LOBATO: UM ESCRITOR À FRENTE DO SEU TEMPO
Quando se fala em “livros para crianças” o primeiro nome que nos vem à cabeça é o de Monteiro Lobato, entretanto, apesar de ser o maior e mais conhecido entre os que escreveram ao publico infantil, poucos são os que realmente leram (e lêem) a obra de Lobato. Em suas produções, Lobato sempre mostrou estar voltado para o futuro, tanto que suas obras sempre refletiam avanço no que se refere aos costumes vigentes no contexto social em estava inserido.
Inicialmente, um aspecto que merece atenção é a unicidade de personagens, espaço e tempo criados por Lobato, por mais que haja entrada e saída de personagens, dependendo da grande aventura a ser vivida, sempre há um núcleo fixo que é formado pelos moradores do Sítio: duas crianças, com vontade e personalidade próprias autonomia para decidir o que fazer de suas vidas e um posicionamento crítico diante do mundo, bem diferente da visão que se tinha da infancia naquela época. Os adultos, por sua vez, são caracterizados pelas duas senhoras que administram o Sítio (outro avanço mostrado numa época em que a mulher era totalmente dependente do sexo oposto), as duas mulheres não tomam parte nas grandes travessuras das crianças, mas também não as intimida ou reprime-lhes a liberdade, apenas de vez em quando, diante de algum acontecimento fantástico, admiram-se por não entender esse fantástico mundo em que as crianças vivem. No plano espacial, nota-se que por mais que se viaje a mundos longíquos e terras encantadas, sempre haverá a volta ao Sítio, à casa, ao seio familiar.Outro fato interessantíssimo é a construção do Sítio como um mundo digamos, “paralelo”, pois ele mostra-se como se suspenso no espaço, não se sabe onde ele fica, em nenhum livro se dá o endereço ou um apontamento que mostre alguma cidade com que ele poderia ser relacionado, o que se sabe apenas são alguns traços de vizinhança e que o Sítio fica no Brasil, ou, como dito por Regina Zilberman, poder-se-ia ir mais além e afirmar que o Sítio é o Brasil, configurando-se assim uma alegoria ao Brasil agrícola e à mentalidade atrasada das pessoas naquele naquele início do século XX. Da mesma forma que ocorre com a noção de espaço, também ocorre com o tempo, pois o Sítio se apresenta sempre de mesma forma, as duas senhoras já idosas não envelhecem, Pedrinho, que nos primeiros livros vem até o Sítio passar férias, sendo que essas férias jamais acabam e as crianças não crescem.
Esta unicidade é um dos grandes fatores que assegura o sucesso da obra de Lobato, pois causa uma familiaridade, uma aproximação do leitor com o texto. Isso faz lembrar a ambição de Lobato ao iniciar-se nos gêneros infantis: “construir um livro onde as crianças quisessem morar”. Com muita audácia, Lobato desmistificou a concepção de que as crianças seriam seres inferiores ou adultos imperfeitos, utilizando como ferramenta de sua crítica ferrenha a exaltação á imaginação e a demonstração de que as crianças possuem uma inteligência viva e espontânea.
Lobato quebrou as convenções, seguindo uma linha de pensamento já existente na Literatura Infantil Européia, com escritores como Charles Perralt, Lewis Carrol e Irmãos Grimmm, que utilizavam em seus textos o recurso da fantasia livre e o diálogo do real com o fantástico. No Brasil, entretanto, o que predominava era textos que serviam apenas como veículo de transmissão de preceitos morais, religiosos, e comportamentais que as crianças deveriam seguir. Lobato se diferencia dos autores da época por produzir um gênero que se dirigia à criança vista como um ser pensante e ativo e não mais como um “homúnculo” ou inacabado. Para ele, a leitura também deveria ser um meio de diversão e deveria trazer um mundo que as crianças pudessem comparar com sua realidade, mas sem alheamento, muito pelo contrário, em que elas pudessem ver e desenvolver uma visão crítica da realidade que os rodeava. Como veículo dessa crítica vemos o tratamento dispensado à Tia Nastácia pelos demais personagens, o fato de ser negra e pobre sempre sendo apontado como motivo de sua ignorância e imperfeição (resquícios evidentes de uma sociedade recém-saída da escravidão e cheia de ex-escravos ociosos), em contrapartida, temos na voz da própria Tia Nastácia o desdém dado ao excesso de cientificismo e de cultura representados pelo Visconde.
Estas são apenas algumas das notáveis inovações trazidas por Monteiro Lobato que contribuíram muito para a mundança do papel da criança na sociedade e para a admissão da existência da infância como uma fase da vida com características próprias.
Diante de tudo que foi visto pode-se admitir que Lobato foi o maior escritor do gênero Infanto-Juvenil no Brasil, se bem que a questão da existência ou não de uma Literatura específica para a Infância é um tema muito polêmico, então, vou ficando por aqui.
(Tezto adaptado de trabalho acadêmico solicitado na disciplina "Fundamentos da Literatura Infanto-Juvenil I"
LETRAS- UFRN. Semestre 2008.1)