gabriel 11/04/2021
Maravilhoso!
A única coisa que eu lamento sobre este livro, é que eu não posso cometer um ataque hacker contra este site, alterar os parâmetros de avaliação, e colocar umas seis estrelas para ele... ou talvez sete, ou até oito. Que livro incrível! Me senti um hamster dopado lendo isto, parece que ele sequestrou os centros de prazer do meu cérebro, a ponto de eu não conseguir desgrudar dele até as últimas páginas. Simplesmente maravilhoso.
Aqui, Hemingway conta sua passagem por Paris na década de 1920, e tudo é de uma beleza assombrosa e surpreendente. Parece que o livro emana uma luz estranha, você vê a paisagem parisiense mais do que se você estivesse no próprio local. A vida de escritor dele, uma mistura de pobreza e de "bon vivantismo" (nem sei se existe esta palavra), é sensacional e traduzida muito bem em palavras. Cada parágrafo é uma delícia diferente de ler, que ele conduz de maneira magistral.
Não tem tempo ruim com o Hemingway, cada parágrafo adquire uma direção surpreendente, as frases mudam de direção do nada e de repente são emocionantes, ou engraçadas, ou poéticas... a habilidade deste escritor é um troço absurdo. Os relatos são bem escritos, mas ao mesmo tempo muito pessoais e carregados de grande carga afetiva. É um livro que tem a cara dos anos 1920 (os famosos "anos loucos" ou "roaring years", período de otimismo na sociedade e quando se passa o livro). Mas a escrita é dinâmica e atrativa, pois foi escrita já nos anos 1960, por um Hemingway já maduro. Então é uma escrita que exala juventude, mas também com a sabedoria mordaz de quando já olhamos para isso velhos.
Tudo que Hemingway come neste livro (alimentos) é descrito em minúcias, e geralmente quando fazem isso em livros é um saco, mas aqui saboreamos tudo com ele. Cada prato é descrito com sincero prazer, e isso é muito valorizado no livro. Em Paris comia-se bem, mesmo sendo um escritor sem muito dinheiro. O livro tem este apelo "sensorial" muito grande, não só com os alimentos, mas também com as paisagens e lugares.
Ele também fala com carinho de como passou esse período com sua esposa, enquanto era um escritor jovem, lá na casa dos seus vinte e tantos anos. Acho que nunca li um relato tão apaixonado como esse, sobre como ele passou este período com a sua mulher. É de uma delicadeza e paixão que poucas vezes se vê, sem recair na pieguice no entanto.
As partes em que ele fala dos demais amigos e escritores que ele foi conhecendo são também excelentes. Destaque para as passagens sobre Scott Fitzgerald, descrito como um cara hipocondríaco, excêntrico e que não aguentava bebida (além de suportar uma esposa controladora). São um dos pontos altos do livro, num livro que é todo altos.
Os capítulos são quase sempre curtos, diferentes entre si, abordando aspectos diversos dessa vida dele em Paris. Só posso dizer que foi um prazer passar esse tempo com ele por lá. Todo o livro reproduz os endereços com precisão (inclusive o número dos locais), o que pode tornar a leitura um pouco cansativa eventualmente, mas que se torna praticamente um documento de viagem. E permite aquela boa fuçadinha no Google Street View, para rever a Paris do século 21 do Hemingway (isso se não tiverem trocado os nomes das ruas, é claro, o que acredito que não).
Livro altamente recomendável, um privilégio ler esta obra do Hemingway. Cinco estrelas com gosto.