Tracinhas 29/02/2016
por Phyreon Thrower
Enredo
O livro começa com uma introdução feita pelo protagonista, um sujeito chamado Peter Brose, onde ele fala sobre o Mal, com maiúscula. Disserta sobre o quão transformador o Mal é e como pode assolar toda uma sociedade. E diz um monte de coisas sobre si: foi a pessoa que enfrentou este Mal; que – sabe-se lá como – acabou virando Primeiro-Ministro, depois Presidente. Tá lá, na introdução. Como uma biografia, aliás, o livro é a biografia do Peter.
Até agora, nada de Brown ou Asimov, mas continuei.
Depois vem uma cronologia. Descobre-se aí que o mundo foi dividido em Três Nações, e temos as datas de quando Peter vira Ministro e Presidente. Tudo bem. A leitura de fato começa em seguida.
Primeira linha, já lamentei a junção de duas coisas que abomino: primeira pessoa e presente do indicativo. O primeiro – e, queria eu, último – livro nessa linha que li foi Jogos Vorazes, e foi uma tortura até me acostumar com a narrativa bem ruim da Catnip.
A cena é de ação. Há um chinês, o Peter, uma S&W (sei sobre as Smith & Wesson por causa da mortal e seu livro de western pulp estranho) e sangue, escadas, tiros… Peter matou um desconhecido e ficou assustado, as balas se chamam balins e há uma descrição dos disparos em onomatopeias desnecessárias. A cena acaba em um cliffhanger e somos puxados para o passado de Peter.
Uma dica minha é: pule daí até o capítulo chamado Primeiros Anos. Nada, absolutamente nada do que foi escrito nos dois primeiros capítulos e metade do terceiro foi usado ao longo da história. É uma descrição enfadonha de o que a Terra se tornou, contando onde Peter nasceu, sua infância, como as pessoas viviam até os 200 anos e os impactos sociais disso, vários aparatos modernos, sua função e como funciona. Voltas e voltas e voltas sem chegar a lugar nenhum, apenas descrição de background: infância, adolescência, perdendo o cabaço na Estação Espacial, faculdade, conhecendo o amor da vida dele, casando, etc, etc, etc.
Li esperando que ele pescasse alguma coisa do passado, e ele fez uma vez. Mas não adiantou de nada, porque quando foi remeter àquela memória, ele explicou tudo de novo – prevendo que o leitor tinha esquecido, o que tornava a narrativa daquele fato lá atrás totalmente… inútil.
Depois, somos apresentados a Mirtes, a esposa brasileira de Peter (ele se mudou para o Brasil, e baba ovo do país, assim como brasileiro baba ovo de coisa estrangeira) e então, finalmente, depois de um monte de coisa inútil, começa a história.
Mirtes é especialista em virologia, e foi convocada para encontrar a solução para o problema com a bactéria legionella, que estava matando milhares de pessoas na África. Cabe dizer que o mundo de Peter é perfeito e cor de rosa. Não há nem fome, nem seca, nem guerras, nem câncer e nem Aids. Tudo é lindo e maravilhoso, todo mundo é rico e feliz. Uma utopia que contradiz imediatamente o subtítulo, mas relevei, pois pensava que a distopia viria.
Plot twist: Nunca veio.
Assim, uma epidemia dessas pegou todo mundo de surpresa, afinal, a legionella não matava há… séculos? Então, todo mundo surtou.
Mirtes foi até a África para pesquisar sobre a bactéria, e logo seu marido também foi, já que ele era investigador digital – obviamente, naquela época, o mundo era mais virtual que físico – e procuraria alguma irregularidade, porque parecia que alguém estava jogando a bactéria na água.
Dito e feito: realmente era uma conspiração. Então Peter vai investigar, e… se estrepa.
Narrativa
… ou quase. Bem, ele não se estrepa. Enfim, você vai ter que ler.
A ideia do livro é ótima, mas a execução falha em vários aspectos.
Primeiro, o narrador troca passado com presente a cada parágrafo. Vai contar uma historinha sobre algo que aconteceu em 1234 a.C, no pretérito perfeito, e aí volta ao presente. Depois, de novo. Isso fica mais óbvio no início do livro, onde tem muita historinha.
Segundo: Por que nos infernos, senhor Peter, você está narrando um livro de MEMÓRIAS no presente do maldito indicativo?! Qual é o sentido em narrar algo que já passou no presente? Me explique, por favor, use a seção de comentários para tal. Não que eu seja hater de narrativa no presente, certo, sou sim, mas há uma justificativa para isso: Suzanne Collins, de Jogos Vorazes, narrava no presente para dar ao leitor o benefício da dúvida: será que Katniss vai morrer? Será que não? Se está no presente, você não tem como ter essa certeza, e foi o fiapo de esperança que me guiou até o fim, para morrer na praia. Mas e no seu caso, Pete? A gente sabe que você não morre, Pete!
Terceiro, não é um thriller. Eu soube na introdução que você, Peter, saiu vivo dali e ainda virou presidente! Você não morre, só apanha, e bem pouco. Cadê a surpresa? Cadê a tensão? Cadê o medo de o cara legal se danar?
Não tem.
Quarto, cacei traços de Asimov e Brown o livro todo, não achei nada, a menos que só falar de futuro utópico, botar homens em Marte e separar a Terra em poucas nações seja se tornar um Asimov.
Quinto, há muita ação, sim, claro, mas não há reviravoltas, não há UM plot twist sequer! Tudo é bem encaminhado, seguindo uma linha reta. Isso deixou a coisa monótona.
Sexto, tem muita historinha. Parou um capítulo na metade para falar dos metrovinos, e quando voltou ao assunto de antes… hã? Do que a gente tava falando, mesmo? Há muitas interrupções para contar histórias paralelas, e a única realmente útil foi a dos metrovinos. Todas as outras são facilmente descartáveis, mas disso eu falo na parte sobre os personagens.
Sétimo, no final, Peter vira primeiro-ministro. Isso não é spoiler algum. Então, ele faz um discurso, que é a melhor parte do livro em quesito de narrativa, e depois começa a falar dos anos seguintes, e continua numa narração ótima, muito melhor que o livro inteiro! Mas aí ele fala… e fala… e fala… e eu já comecei a olhar quantas páginas faltava pra acabar… e continua falando… e narra toda uma história… e aí ele vira presidente.
Que? Como assim? Espera! Ele finaliza sobre Legionella. Depois narra outra aventura (que daria um livro inteiro) e então acaba virando presidente… pensei que fosse um livro para cada problema, mas não. Então, deixa um cliffhanger no fim, chamando ao segundo livro!
Espero que o nome desse segundo seja: A Burrice Dos Homens, porque olha… pena que a faca da censura por spoiler está no meu pescoço, pois eu xingaria em caixa alta aquelas pessoas.
A narrativa não é tão ruim quanto eu dissequei aí em cima. Peter é alegre demais, isso me incomodou, mas é característica dele, meu gosto não importa. O autor usa frases curtas demais. Isso é meio chato. Porque você tem que pausar. Toda hora.
E todos, TODOS os há estão grafados como a.
(Confira a resenha completa em nosso site!)
site: http://jatracei.com/post/140190939112/resenha-136-legionella