Adriana Pereira Silva 22/09/2019
O despertar de sentimentos e emoções
?Stoner? foi escrita pelo norte-americano John Williams e publicado em 1965 nos Estados Unidos, não tendo despertado grande interesse dos leitores. Mas apenas tornou-se best-seller 50 anos após ter sido escrito, quando o autor já era falecido. Possui uma escrita lúcida, objetiva e extremamente fluida, sugando o leitor por suas páginas.
John Williams soube retratar maravilhosamente a vida do acadêmico William Stoner. Uma obra que tem extraordinária qualidade da escrita, com muita elegância e sensibilidade, clareza cristalina e toque muito delicado.
Narra a trajetória de vida de William Stoner, um homem simples humano e comum, um professor universitário da Universidade de Columbia, no Missouri, EUA, seus dramas, alegrias e angústias, que simplesmente aceita as vicissitudes da vida de forma paciente e resignada. É alguém único, que, em determinados momentos, de alguma forma assiste sua própria vida ser definida e baseada nas atitudes dos outros e não em suas próprias.
Acompanhamos o modo como ele lida com as dificuldades de sua própria vida, como casamento, o destino de sua filha e intrigas na universidade. Com ele sofremos, alegramos, revoltamos, torcemos, sentimos ternura por ele, as vezes temos vontade de interferir na história.
Stoner era um professor que ensinava com amor, mas não era luminoso, mas um personagem humilde e orgulhoso pelo que fazia, muito humano, de grande trabalho literário. Lutava pelo que acreditava, mas as vezes apenas assistia ao que sucedia, sem nada fazer, no entanto, foi fiel a si mesmo acima de tudo, e em paz consigo mesmo. Enfim, construiu uma vida comum.
Percorremos toda a trajetória de sua vida, que começa na primeira metade do século XX: sua infância, com seus pais, o envio à universidade, para cursar Ciências Agrárias e poder ajudar o pai na fazenda, sua mudança de curso por se apaixonar pela Literatura inglesa, sua trajetória acadêmica e particular, ficando preso a um casamento infeliz, a uma paixão que é interrompida e a culpa por sentir que foi negligente na educação e na vida de sua filha.
Além disso, Stoner relata toda gama de sentimentos e clima deixados pela vivência de sua vida entre as duas grandes guerras mundiais. Fatos que também o fizeram refletir e transformaram sua vida.
?Mas eu pude ver o que se seguiu. Uma guerra não mata só alguns milhares ou algumas centenas de milhares de jovens. Ela mata algo num povo que nunca pode ser recuperado.? (p. 43)
Sua vida acadêmica tem uma desenvoltura plena para ele, com grande amor pelos estudos em Literatura Inglesa, fazendo tudo o que considerava correto e íntegro para sua carreira, e as vezes deixando de lado oportunidades, não aceitando cargos maiores para se dedicar ao que amava fazer, ensinar e estudar.
?Sua vida era quase como ele queria que fosse. Quando não estava preparando aulas, corrigindo trabalhos ou lendo teses, estudava e escrevia. Tinha a esperança de que, com o tempo, pudesse estabelecer para si mesmo uma reputação como estudioso e como professor.? (p. 115)
Mais tarde, em suas aulas, ?Stoner falava com mais confiança e sentiu uma severidade dura e calorosa crescer dentro dele. Teve a impressão de que estava começando, com dez anos de atraso, a descobrir quem era [...] sentia que finalmente começava a ser um professor de verdade [...]. Era um conhecimento que não conseguia expressar, mais do que o transformou assim que o adquiriu...? (p. 125)
Sua vida particular teve grandes adversidades, com algumas conquistas e muitas decepções e desilusões, tendo descoberto o amor em sua plenitude, e as alegrias da paternidade.
?Enquanto consertava sua mobília e arrumava no seu escritório, era a si mesmo que ele estava lentamente dando forma, era em si mesmo que estava ponde alguma espécie de ordem, era a si mesmo que estava dando uma chance.? (p. 112)
?William Stoner aprendeu o que outros, muito mais jovens que ele, haviam aprendido antes dele: que a pessoa a quem se ama no começo não é a pessoa que enfim se ama, e que o amor não é um fim, mas um processo através do qual uma pessoa experimenta conhecer outra.? (p. 213)
Além de relatar a solidão e trivialidade que passa em sua vida, também descreve como foi marcada por amor e ódio, que moldaram os anos de sua vida e desencadearam mudanças e transformações na sua trajetória, especialmente pelos personagens de Edith e Lomax.
Assim, no decorrer da obra, vamos nos afeiçoando a Stoner, um homem que não consegue se encaixar no mundo e que vai descobrindo profissionalmente, suas esperanças em relação à vida e suas desilusões e angústias que vão se sucedendo em sua vida particular e acadêmica. Um homem que vai amadurecendo e aprendendo a diligenciar suas palavras, sendo muito silencioso, mas observador, cauteloso e que tenta sempre ser democrático, correto, cortês, honesto.
Enfim, um homem bom, capaz de se encantar com o poder da literatura mas não se entusiasmar para lutar por seu casamento desde o início.
É um exemplo para nos fazer refletir sobre quem somos e para onde estamos indo, e podermos aparar nossa vida para segui-la com princípios e paixão no que fazemos, encontrando-nos profissionalmente e em nossa vida particular, para termos uma vida plena, e podermos deixar nossa marca neste mundo ao passar por ele, e termos feito a diferença.
Para todos o tempo passa, mas o jeito em que o levamos e como consideramos o que vamos fazendo com ele e com nossa vida é que fazem a diferença. E as vezes é somente quando o tempo já passou que percebemos o quanto poderíamos ter feito e como deveríamos ter realizado coisas diferentemente do que vivemos.
Com este livro, impossível sair dele como se entrou, pois ele nos envolve e nos transforma. Ele nos ensina e transforma.