Jeff.Rodrigues 25/08/2019Resenha publicada no Leitor CompulsivoO Brasil, eternamente profetizado como o país do futuro. Um tal futuro que, apesar das idas e vindas da história, nunca chega. Esse Brasil de promessas recebe jovens vindos da Europa, rebentos que lá foram estudar, se atualizar e agora retornam trazendo um misto de expectativas e dúvidas. O que a terra pátria tem a oferecer? O que é possível esperar do país do futuro que ainda respira ares coronelistas e oligárquicos? Há, de fato, futuro na terra onde a única coisa que se leva realmente a sério é o carnaval?
Em seu romance de estreia, escrito aos dezoito anos, Jorge Amado nos apresenta uma história repleta de questionamentos e desdobramentos bem diferentes dos que vão marcar pra valer sua obra. O País do Carnaval carrega uma sátira que vai se repetir e se tornar mais ácida em obras futuras, contudo traz uma história que beira o drama e passa longe do estilo que consagrou o autor. Um grupo de jovens “perdido” por Salvador em busca de respostas para questões tão filosóficas quanto complicadas. São poetas e jornalistas, homens que carregam a cultura que falta à massa do país que procura o caminho desenvolvimento. Um grupo que se reúne em torno da produção de um jornal, que segue conselhos de um consagrado, mas já pouco influente cronista, e que segue de bar em bar atrás de um sentido para tudo que os rodeia.
Protagonizado por Paulo Rigger, filho de fazendeiro que voltou dos estudos na França, O País do Carnaval percorre através dos dramas de seus personagens o drama de um Brasil que não desengata. As desilusões amorosas, financeiras, políticas e religiosas que cada um enfrenta são, em grande parte, metáforas daquilo que o próprio país tem diante de si. Mesmo que o próprio autor deixe claro na abertura que se trata apenas de um romance sobre “homens em busca do sentido da existência”, é impossível não associarmos ao momento de tensão em que o Brasil vivia. Um país em busca de um sentido. Avançar e olhar para a frente ou se manter preso às amarras do passado?
Em muitos aspectos, e isso chega a ser um pouco assustador, algumas passagens do livro mostram-se extremamente atuais. Há certas frases que soam proféticas ou poderiam ter sido escritas por um Jorge em plena atividade em 2019.
“O Brasil é o país verde por excelência. Futuroso, esperançoso… Nunca passou disso… Vocês, brasileiros, velhos que já foram e rapazes que são a esperança da Pátria, sonham o futuro. ‘Dentro de cem anos o Brasil será o primeiro país do mundo’. Garanto que aqueles detestável cronista Pero Vaz de Caminha teve essa mesma frase ao achar Cabral, por um acaso, o país que viera expressamente descobrir. ”
A galeria de personagens em O País do Carnaval não é tão rica como veremos nas obras futuras do autor. Apegado aos conceitos e dúvidas que permeiam as vidas desses jovens, Jorge não se preocupou em desenvolvê-los tão bem como virá a fazer. Mesmo assim, a baianidade exala seus aromas e temperos a cada página.
A saga de Paulo Rigger vai terminar no mesmo ponto em que começou. Olhando para o Cristo Redentor ele parte com tantas dúvidas quanto no dia em que desembarcou. Ao longe, a folia toma conta das ruas cariocas e, oitenta e oito anos depois da publicação, ainda nos questionamos se há, de fato, futuro na terra onde a única coisa que se leva realmente a sério é o carnaval.
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