ana 01/02/2018
Abusado - como o próprio título informa - narra a história do dono do morro da Dona Marta. Juliano VP, pseudônimo de Marcinho VP, foi um traficante “pop”, suas ações, falas e principalmente seu nome estavam muito presentes na mídia, situação esta que o colocou diversas vezes na mira policial. A narrativa de Caco Barcelos nos faz ver não apenas um traficante comum/estereotipado, mas sim um homem como todos os outros, com seus problemas, seus medos, ideais, suas lutas e suas glórias.
O livro é envolvente, nos faz ingressar no morro, nos faz ver uma realidade que é tão distante e ao mesmo tempo tão próxima da sociedade “normal”, a favela parece algo à parte, algo de outro mundo, mas não, ela está presente, ela faz parte da nossa história nacional e determina a vida de milhões de pessoas. E o autor conseguiu trazer isso com maestria, mostrando o cotidiano e a vida das pessoas do morro, mostrando de uma forma clara que a realidade retratada no livro é algo comum para eles, a violência é rotineira e está impregnada na comunidade. Isso é explícito quando Barcellos apresenta o encanto que Juliano VP transpassa às pessoas, e ao mesmo tempo o terror que ele causa.
A narrativa não esconde as barbáries realizadas pelo tráfico, mostra de uma forma meio nebulosa o interior do Comando Vermelho, visto que Juliano VP era um membro fiel do grupo criminoso. Há ações horrendas, cruéis que mostram o que acontece com quem desobedece ou trai o dono do morro ou o CV. O livro envolve tanto, que parece que estamos vivendo a cena, Caco Barcellos não se limita ao narrar as guerras, as punições, a vida cotidiana.
Mas o que mais me chamou a atenção durante a leitura foi a preocupação social que Juliano tinha com a comunidade. Sempre que podia, ele afirmava o lema inicial do Comando Vermelho: paz, justiça e liberdade. Ele pregava isso, de uma forma meio torta, meio errada, mas ele tentava, ele realmente acreditava que através do tráfico ele conseguiria mudar a vida da comunidade onde nasceu. Juliano VP, não era um traficante comum, ele gostava de ler, lia sociologia, filosofia, direito, gostava de falar sobre. Através de suas cartas endereçadas aos chefões do CV, é mostrado que ele estava insatisfeito com o “andar da carruagem” que sua organização estava tomando, prevalecendo o dinheiro sobre a irmandade.
O livro é incrível, a leitura é envolvente e rápida. Eu super indico pra quem quer conhecer essa realidade, e pra quem se interessa por esse tema. O livro traz desde violência policial até o companheirismo e lealdade “criminosa”. Poderia ser um estudo antropológico, sociológico enfim, vale muito a leitura!