Lucas Rabêlo 13/01/2024
Em que você pensa? eu, em continuar viva.
Alice Walker, expoente na política da comunidade negra norte-americana, através da literatura disseca um máximo, a complexa relação humana - num conjunto, das suas mulheres pretas. "A cor púrpura", seu maior sucesso, obra lançada em 1983 e vencedora do Pulitzer, alçou-a na miscelânia de outros autores que investigam o fenômeno étnico.
Celie, garota pobre e sem perspectiva, se casa com um violento homem de poucas posses no sul segregacionista e se vê separada de seu bem mais precioso, sua irmã Nettie, que parte à África para se tornar missionária. Deste mote, a colcha de retalhos da narrativa vai se alinhavando num cenário ainda desconhecido.
Sem ter a quem comunicar seus anseios, escreve a Deus por meio de cartas, como se fossem endereçadas à Nettie, já que pensa tê-la perdido. Para Ele, numa linguagem simples e informal (inovadora na forma de contar), até lírica, revela um desabrochar íntimo por vir, e, deste recurso, aproveita Walker para expor não apenas a violência física, mas psicológica endereçada a protagonista pueril, vinda de pretos e brancos.
Enquanto isso, Nettie, do outro lado do mundo, mantém a frequência da promessa, lhe escreve continuamente, material este interceptado pelo abusivo Albert, esposo e "senhor" de Celie, que as separou configurando a irmã caçula como ameaça à sua integridade moral: na verdade, um homem de desejos. Mas a entrada de personagens irreverentes - Shug Avery, Sofia, Harpo - farão presença na vida doméstica de Celie, acolhida numa jornada sensível que ditará sua permanência numa sociedade irregular às muitas minorias.
Walker não apela e não invisibiliza. Emociona, encanta e da vazão para sua Celie viver. Há muito pelo que viver, em especial pelo desfecho delicado e otimista do fim de uma longa batalha. Primeiro livro do ano às lágrimas.