spoiler visualizarTiti 22/10/2023
Um sentimento de cor púrpura
Querido Deus,
Assim a escritora inicia sua história, que é narrada através de cartas que a personagem (Celie) escreve para Deus: "É melhor você nunca contar pra ninguém, só pra Deus. Isso mataria sua mamãe." A partir disso, Alice Walker constrói toda a narrativa da vida de Celie, uma mulher, negra, pobre, nascida no Sul dos Estados Unidos em uma sociedade misógina e racista. Celie, já desde pequena com seus 14 anos, foi abusada de seu próprio padrasto. E posteriormente, foi vítima de violência doméstica constante por parte de seu companheiro (Harpo). Ela também foi separada de sua irmã (Nettie) e passa a escrever cartas para ela, mesmo acreditando que ela estava morta. A autora utiliza-se da licença poética para retratar mais fielmente os sofrimentos que a personagem sofria, mostrando como ela também foi privada de um ensino de qualidade.
Além disso, o racismo é muito presente na sua vida, como por exemplo, neste trecho: "Alguma vez você já viu uma pessoa branca e uma negra sentada lado a lado num carro." E junto com a questão racial, vê-se uma crítica implícita a religião, não a religão cristã como um todo, mas sim a um grupo de religiosos que utilizam da sua fé para justificar as suas atitudes racistas, algo que Celie com o seu senso crítico questiona veementemente. Celie percebe que o amor de Deus é indiferente a sua cor, tanto que ela escreve cartas para Deus ("Meu querido Deus), ela encontra nEle seu conforto, o alívio de suas dores e algo que a faz persistir.
Ademais, outro fator que acaba dificultando mais ainda é o fato de Celie ser lgbt (ao que parece lésbica ou bissexual) e não saber disso, portanto vemos um processo de autodescoberta e o sofrimento dela por Shug ao decorrer do livro, que fica mais evidente neste trecho: "Acaba com isso, Shug, eu falei. Você tá me matando (...) Bom, eu falei, se as palavra matassem, eu taria precisando de uma ambulância." Esse trecho narra nitidamente o sofriemento dela ao ver Shug falar de outra pessoa em sua frente, o que indica para o fato de que ela a amava românticamente, não apenas como uma amizade forte como algumas pessoas interpretam.
(A estrofe a seguir contém spoilers)
Ao meu ver, Shug e Celie ficaram juntas no final, pelo fato de que no fim do livro descreve que ela estava com a Nettie, Shug, Albert, Samuel, Harpo, Sofia, Jack e a Odessa e que eles nunca se sentiram tão jovens, e em outro trecho é dito: "A gente conversa sobre você, eu falei. De como a gente ama você. Ela sorri, bota a cabeça no meu peito. Suspira longamente." Todavia, vemos também uma profunda lição sobre dependência emocianal, na qual a personagem demonstra ter amadurecido ao ponto de dizer que: "Se ela voltar, fico feliz. Se ela num voltar, fico contente."
Há muita outras coisas que gostaria de falar sobre essa obra que abriu meus olhos para assuntos tão importantes, mas creio que se fizesse isso teria que escrever um livro para falar tudo (quem sabe no futuro?). Deixo aqui minha recomendação para vocês! Uma leitura curta, mas bem impactante. Termino com um trecho do livro:
"Somos pretos que nem os africanos. E nós e os africanos estaremos trabalhando juntos por um objetivo comum: uma vida melhor para os negros do mundo todo."