Dan 22/10/2018
A obra do neologismo e das adaptações linguísticas
Pulando a parte do resumo e indo direto para a análise: Depois de ler esse livro, tive a impressão (e, pelas minhas pesquisas, parece que estou certo) de que, acima da retratação do sertanejo, o que Guimarães Rosa quis demonstrar aqui é toda a sua capacidade de criação, adaptação e fusão da linguagem, quase como se o mesmo estivesse brincando com o nosso português.
A princípio, é importante salientar que apesar de ser encaixado nesta característica, a obra não pertence de maneira integral ao regionalismo tradicional, explicarei o porquê. Ao retratar a vida do sertanejo mineiro, o autor não insere em suas histórias fatores e problemáticas que são específicas dessa cultura, isto é, o mesmo trata de questões mais abrangentes que acometem toda a população, e não uma parcela dela. Além disso, podemos dizer que por ter uma narrativa oral e extremamente literária, ou seja, pautada na musicalidade, no jogo de palavras e no "eruditismo", o autor faz uma fusão linguística da variante do português em MG com outros termos, as vezes neologismos, arcaísmos, coloquialismos, etc. Isso quer dizer que Guimarães não mostra, de fato, como é o verdadeiro "mineirês", mas o torna esqueleto de uma composição maior constituída pela sua famosa capacidade de criação de novos vocábulos. Outrossim, o que faz com que a obra não possa ser encaixada de maneira integral ao regionalismo é o fato dela possuir um descritivismo exacerbado, além de, na maioria das vezes, as histórias terem cunho de uma visão transcendental, como abordar temas que convidam o interlocutor ao devaneio.
Por fim, há de se lembrar que no período em que foi escrita a obra, a ditadura Varguista, assim como a 2ª Guerra Mundial, já apresentavam seus últimos acontecimentos, sendo os 2 findados em 1945. O fim da repressão e tensão sociopolítica trouxe alguns sentimentos de mudança para o modernismo - movimento literário no qual Guimarães fazia parte -, inspirando os escritores a romper também com alguns valores tradicionais da época. Prova disso é que no livro percebemos a maior independência feminina quanto ao casamento e as relações, não estando mais tão subalternas aos homens e às instituições de controle (estado e igreja).
Contudo, se por um lado o autor insere em seus contos uma característica de esperança, por outro ele também não esquece de retratar a violência no interior de Minas Gerais, onde a tão sonhada civilidade não ganha espaço num ambiente marcado pela "lei do mais forte", que lembra muito as cenas de Faroeste norte-americanas.
Estou dando 3 estrelas apenas porque achei que o forte detalhismo e neologismo dificulta muitas vezes a compreensão da história. Espero relê-lo quando tiver mais bagagem cultural e linguística.
site: https://www.youtube.com/watch?v=Jfxx0UbCQk8