Carol - @ressacaliteraria_ 09/04/2020
Resenha
"O Oitavo Vilarejo" é o primeiro livro de uma trilogia que conta a história dos irmãos órfãos Tibor e Sátir. Seus pais, que moravam em um acampamento de ciganos, morreram há dois anos em um incêndio na floresta, e sem contato com parentes próximos vivem em um orfanato nada amigável desde então. Contudo, são finalmente localizados por sua avó paterna que nem se lembravam conhecer, e agora estão a caminho de sua nova casa no sítio da avó Gailde, que os espera cheia de amor para dar.
" - Meu nobre rapaz, o saber é a grande virtude de um ser!"
Com a chegada dos netos, Gailde explica que os procurou desde a noite do acidente mas que por conta de alguns problemas sua busca foi interrompida algumas vezes. Entretanto, com o passar do tempo, a rotina no sítio se torna bem agradável, os irmãos fazem diversas descobertas e entre elas um novo amigo chamado Rurique, o amor entre os netos e avó só cresce, e eles finalmente se sentem de volta ao lar. Mas como tudo nem sempre são flores, a Quaresma se aproxima, e Dona Gailde e Rurique começam a alertá-los sobre os perigos que espreitam a região nessa época, inclusive a Vila do Meio.
" - Eu sei, eu sei. Só não gosto de estudar! [...] Prefiro a liberdade."
Sete vilarejos compõe a cidade, mas como o título já deixa a dica, existe um oitavo. E é justamente durante a Quaresma, que os irmãos descobrem que boa parte das lendas locais não eram somente lendas, coisas estranhas começam a acontecer, uma criatura pode estar prestes a escapar do Oitavo Vilarejo e o trio embarca em grandes, marcantes e perigosas aventuras.
"Siga sempre o seu coração! A razão é importante, mas o coração é a fonte de tudo. Siga-o e você estará seguindo o caminho certo, seja qual for a sua decisão. Acredite nisso!"
A trama se desenrola a partir daí e os irmãos nem imaginam que vão descobrir muito mais sobre o lugar onde agora vivem, sua família e seu passado.
"Seu rosto, à primeira vista, era bondoso. Isso confortou Tibor, o que foi bom para que suas mãos deixassem de suar tanto. Reparou que sua irmã analisava a senhora de alto a baixo, como se estivesse avaliando se poderia confiar nela."
Abordando com maestria lendas folclóricas como a Mula-sem-cabeça, Curupira, Boitatá, Saci, Cuca, Pisadeira, A Porca dos Sete Leitões e diversos outros mitos folclóricos que fizeram parte da infância de muita gente, inclusive da minha, Gustavo Rosseb consegue nos fazer emergir em sua obra de forma tão mágica quanto as próprias lendas que nos fez relembrar com nostalgia singular.
"Sem sabe por quê, Tibor sentiu algo de perigoso na mulher, e não foi o único. Sátir já o puxava pela camiseta, para correrem dali, enquanto a velha chegava mais perto."
Uma história rica, envolvente, extremamente detalhada, cheia de mistérios, ação, aventura, e muito folclore, "O Oitavo Vilarejo" é um livro que deve ser degustado e apreciado. Em 16 capítulos temos o gostinho de infância de volta de forma muito leve e fluída.
"Ele mirava sua lanterna para todos os lados, com medo do que podia se esconder nas sombras, e, embora ninguém dissesse nada, percebia que seu medo era compartilhado pelos outros dois."
Os personagens foram muito bem construídos, até os secundários, e cada um tem sua personalidade e extrema importância na história. Somos capazes de ver o amadurecimento de cada um e a superação de seus medos de forma natural, assim como os cenários que nos foram apresentados e até a sensação de aconchego no sítio da avó.
A descrição das cenas é muito bem feita e em alguns momentos me lembrou até a escrita de J. K. Rowling com o trio aflito por aventuras e a mesa de café da manhã como as mesas da Escola de Hogwarts.
Vale lembrar que o livro é uma recontagem das lendas, onde o autor dá o seu toque especial e por isso nem sempre elas vão ser exatamente como as originais que já conhecemos, porém, de maneira algumas atrapalhou, pelo contrário, me deixou ainda mais curiosa para saber o desfecho e viciada na leitura, tanto que só larguei o livro quando terminei (li em apenas um dia!) e dei graças por já ter o próximo volume em mãos.
A capa ficou fantástica e diz muito sobre o que nos espera (foi o próprio autor que desenhou!). A narrativa é em terceira pessoa, e a diagramação ficou muito boa, sem erros de gramática ou concordância, de tamanho e fonte agradáveis para leitura e páginas amarelas.
Gustavo está de parabéns, conseguiu causar a rara empolgação da literatura fantástica de qualidade trazendo um livro InfantoJuvenil cheio de novidades explorando a nossa própria cultura e mostrando o quanto ele é rica. Um exemplo, a Quaresma foi muito bem abordada, já que o autor faz uma boa apropriação do período. Espero de verdade que todos que tiverem a oportunidade de ler, que leiam, pois as lendas folclóricas brasileiras estão cada vez mais esquecidas pelas novas gerações e poder lembrá-las de forma tão singela é espetacular.
É clara a oportunidade que o livro tem de ser o livro perfeito para crianças descobrirem o gosto pela leitura. E a propósito, a obra teve os direitos vendidos pra uma produtora de filmes e já estou ansiosa para assistir.
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