Henrique Fendrich 01/02/2019
Esse espantoso russo faz um painel que é ao mesmo tempo o seu testemunho de como é ser condenado a trabalhos forçados na Sibéria, em meio à Rússia stalinista. Ora, nesses campos de concentração, visivelmente, um ser humano deixa de ser um humano. Os sentidos ficam de tal forma embotados que se matam uns aos outros a troco de nada, ou a troco de um pedaço de pão ou de um tabaco vulgar. Passa-se muita fome nesse tipo de lugar e um dos relatos mais chocantes feitos por Chalámov a esse respeito é o dos prisioneiros que decidiram abrir uma sepultura, pegar as roupas de morto e revendê-las a fim de conseguir alguns trocos que permitissem ter as suas necessidades satisfeitas. Em outro conto, mata-se um cachorro para matar a fome. Esses prisioneiros vivem apenas para o dia que estão vivendo, isto é, não pensam no amanhã, quando talvez nem estejam mais vivos. Muitos procuram a morte, e muitos são os que se mutilam porque, então, não serão obrigados a fazer o trabalho extenuante. Um dos contos que achei mais sensíveis diz respeito a isso e se chama “Chuva”. Há vários momentos crus e violentos, com atitudes chocantes, mas isso era o que um condenado por trabalhos forçados realmente vivia. O testemunho de Chalámov, como muitos outros, deveria ser suficiente para que a humanidade nunca mais cometesse semelhantes atrocidades. Entretanto, quem pode garantir que tudo isso não se repita, quando a humanidade achar conveniente?