LAPLACE 07/03/2016Esperando por Doggo - Mark B. MillsDaniel é muito azarado, além de estar desempregado, ainda foi largado por Clara, sua namorada já há alguns anos, que partiu sem aviso prévio, ou ao menos após uma briga. Simplesmente ele acordou um dia e ela não estava mais lá, restando apenas uma carta onde criticava tudo aquilo que o mais novo solteiro jurava que ela amava em sua pessoa.
Se já não bastasse o coração partido, Clara ainda o incumbiu de devolver Doggo ao abrigo de cães. Um vira lata muito feio, Doggo foi adotado sem o consentimento de Daniel, e o animal nunca hesitou em demonstrar que não nutria o menor sentimento de amor pelo namorado de sua dona.
Enquanto busca qualquer notícia sobre o paradeiro de Clara, Daniel precisa se preparar para uma entrevista de emprego que pode ser a oportunidade para sua conta não ficar negativa. E também tenta dar destino ao cachorro mais feio do mundo, que embora tenha sido igualmente abandonado, ainda assim não demonstra que passará a simpatizar com aquele com quem foi deixado sem ter tido a chance de escolher.
Quer saber o que acontece? Então corre para ler o livro!
***
O livro do Mark me conquistou pela capa e o texto da contracapa que, não, não é a sinopse. É um trecho da carta que a Clara deixou para o Daniel. Sim, o autor já apresenta seu trabalho assim, de forma direta. Aliás, a trama não possui rodeios, fique sabendo, Mark foi bastante objetivo em seus capítulos, e isso até me incomodou um pouco no começo.
Não considero que tenha sido um erro de escrita, apenas eu não li muitas histórias onde o autor joga a cena em nossa cara sem nem sempre fazer uma ambientação antes. O Mark capricha nisso, iniciando capítulos com diálogos e outras situações que nos deixam meio confusos por um segundo. A meu ver essa estratégia é boa porque nos ajuda a nos identificarmos com o Daniel, ficando meio perdido em meio ao que anda acontecendo em sua vida. E como a narrativa é em 1ª pessoa, esse sentimento fica ainda mais forte.
Esperando por Doggo é muito mais do que uma história sobre o relacionamento entre o homem e o cachorro que não escolheu ter, com o passar das páginas vemos que o protagonista está preso em um turbilhão de problemas e incertezas maior do que ele próprio imaginava.
Gostei muito da forma como o Mark tratou os conflitos do Daniel. Ele nos bombardeia com novas informações e depois se silencia, como quem diz: “Quer saber o que acontece? Pois espere um pouco, porque agora nós vamos tratar de outro assunto”. O autor domina bem o texto, mostrando que ele manda na história. Não são os personagens e muito menos nós que iremos conseguir o que queremos antes que ele diga quando teremos direito às nossas respostas. Isso me fez gostar, também, porque o dia a dia é bem assim, nem sempre quando surge um problema nós conseguimos resolvê-lo, às vezes temos que ser pacientes e ir levando a vida até o momento certo chegar.
A forma como o romance foi trabalhado também me conquistou. Como já falei em inúmeras resenhas, não curto romances românticos demais, e o livro do Mark não tem nada disso. Ele tratou o assunto como eu gostaria de tratar em um livro meu, desenvolvendo o amor passo a passo, sem paixão a primeira a vista com direito a câmera lenta e música romântica do momento de fundo como geralmente vemos. O autor torna real. E então, quando um relacionamento se oficializa, nós vemos que foi construído todo um alicerce para isso e conseguimos acreditar que essa foi a melhor escolha e que vai dar certo.
Uma coisa que preciso alertá-los sobre a obra é que o Mark adora soltar spoilers de filmes. Sua linguagem é bastante ácida e irônica, e temos vários momentos onde ele faz uso disso através da menção de alguns filmes, e o autor soltar spoilers — até mesmo o final das produções — sem piedade. Portanto, se você estiver lendo esse livro e o ver no texto algo sobre um filme que você gostaria de assistir, assista ao longa antes de continuar a leitura, porque certamente o Mark irá te contar o que acontece.
Para mim, Esperando por Doggo só não foi perfeito por um detalhe, uma escolha do protagonista, que para alguns pode parecer algo bobo, mas que me incomodou. Não me conformo que o Daniel tenha tomado uma decisão por causa de um medo que sentia. Eu compreendo esse medo, mas para mim sua atitude foi covarde, até porque, como podemos ver pelo que foi construído com o desenrolar da história, ele parece ter compreendido que esse medo era só coisa da sua cabeça. Mesmo assim, essa é uma obra que eu adoraria ver adaptada para o cinema.