Lauraa Machado 29/12/2019
Inesperadamente decepcionante
O tombo que eu levei com esse livro foi feio. O primeiro, Seraphina, por mais que eu tenha tido expectativas maiores antes de começar, até que foi bem bacana. Não tinha muita ação ou enredo, mas o vi como uma construção da história desse segundo. Minha surpresa foi descobrir que este tem menos enredo ainda e que ele existe basicamente para destruir tudo de bom que vinha do outro.
Essa falta de acontecimentos no enredo é extremamente irritante! A protagonista, Seraphina, só vai de um lugar para o outro o livro inteiro, sem conseguir fazer nada direito, numa missão chata e infinita que vai ficando cada vez maior e mais repetitiva. A vilã da história também foi construída em uma bola de neve, no seu caso, de maldade infundada. Não, traumas infantis não são razão suficiente para resumir toda uma pessoa em maldades sem sentido, menos ainda quando eles só são jogados de qualquer jeito em cenas superficiais. Ela tinha tanto potencial para se desenvolver, principalmente em relação à Seraphina, que talvez seja minha maior decepção.
O clímax também é uma prova do quanto essa duologia desandou nesse segundo livro. No primeiro, achei tudo bem realista, desde as intrigas políticas até a conclusão e a promessa para o final da história. Nesse, apesar de não conseguir tirar o tédio da narrativa, foi tiro para todo lado, aumentando o problema sem limites, a ponto de ele só conseguir ser solucionado pelo maior e praticamente mais literal deus ex machina que eu já li. Nem na Grécia antiga se via história se fechando nessa cara de pau.
Mas o tombo que eu levei foi por outra coisa. No primeiro livro, Seraphina era uma garota ainda nova, que tinha muito a descobrir e a conhecer. Ela, sim, tinha potencial para muito, mas muito mesmo, principalmente considerando que a história é contada pelo seu ponto de vista. Ou seja, dava para a autora explorar seu desenvolvimento até mesmo na narrativa de cenas comuns. Ela tinha muito para crescer e o mais decepcionante é que a própria personagem sabia e admitia isso, mas ficava adiando ter que lidar com um problema simples, em outro exemplo de cara de pau, até encaixar no resto dos acontecimentos.
Já disse que foi um tombo absurdo? Ela passa o livro inteiro como uma boneca de pano que é jogada pelas mãos dos outros personagens para mil lugares diferentes, sem nenhum propósito, consequência ou reviravolta válidos. Tudo pega um ritmo repetitivo de coisas "piorando", ou seja, "ficando mais sérias para o lado dela", mas é tanta coisa jogada de qualquer jeito, que nem dá para acreditar ou levar a sério. A autora também tem uma mania péssima de correr com as cenas mais interessantes, por exemplo, aquelas entre Seraphina, Glisselda e Kiggs. Decepção define.
Mas o tombo veio junto de um tapa na cara histórico também. Eu literalmente falei na resenha do livro anterior, com essas palavras: "Hoje em dia, a maioria dos autores já percebeu que não tem como ser diferente, que criar personagens "floquinhos de neve especiais" e, ironicamente, sem personalidade não leva a nada", em uma tentativa de dizer que a Seraphina era o oposto disso. E não é que a Rachel Hartman vem e me desmente absurdamente depois de passar o livro inteiro fazendo sua protagonista ser mais inútil que a lama do pântano do lado de fora da cidade? Floquinho de neve mais revoltante da literatura fantástica, tá? Vários recordes sendo batidos aqui, percebeu?
Minha nota verdadeira é de 1,5 e eu só arredondei para cima pelo Abdo, um personagem secundário que deveria ser dono da história, apesar de que não teria como o ponto de vista dele salvar todo o enredo inútil do livro. Outra descoberta que esse livro me trouxe foi que eu prefiro dragões de verdade, não meio-dragões. Prefiro eles como animais, não se fazendo de humanos. Por incrível que possa parecer, ainda vou dar uma chance para Tess of the Road, um livro único da autora que também se passa nesse mundo. Só não vai ser logo depois dessa decepção literária.