@apilhadathay 05/02/2012
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Senti uma conexão quase mágica com este livro ao ler as duas primeiras páginas. Em “Corações de Neve”, a épica sequência da trilogia Dragões de Éter, Draccon mais uma vez usa de sua inteligência numa narração surpreendente, chocante e reflexiva, com mais ação e momentos inesperados. Alguns capítulos podem acompanhá-lo por minutos, enquanto acabam antes de você piscar os olhos – literalmente. A analogia da Noz, a profundidade do livro e a riqueza do desenrolar dos fatos fascinaram-me e me fizeram lembrar das aventuras de “O Mundo de Sofia”.
"Cada passo que um homem dá em direção a uma morte não natural é um aviso à humanidade que toda ela falhou em algum ponto." (P. 10)
Reencontramos neste volume muitos dos personagens que aprendemos a amar em “Caçadores de Bruxas”, como Ariane, Maria, Axel e João. Outros receberam maior destaque e se provaram mais fortes do que eu esperava, como Rei Anísio e Branca Coração-de-Neve, a princesa com coração de rainha. Também, o meu “par-perfeitamente-imperfeito", formado por Snail e Liriel. Sério: eusou a única que vê a paixão latente ali?
"Ao longo de sua vida, Adam Bell acreditou que haveria esperança para consertar os erros da humanidade. Mas naquela noite fria, no momento em que sua respiração foi interrompida por setas afiadas que lhe perfuraram o corpo... a impressão que ele tinha era de que esses eternos erros não seriam entendidos nem consertados jamais. Talvez um dia até seriam, sim, entendidos. Mas consertados, jamais." (P. 12)
O autor alterna pontos de vista como se manejasse câmeras ocultas no ar de Nova Ether. Mesmo que Ariane arrebate os nossos corações com aquela alma incrível e Locksley tenha encontrado uma adepta em mim ... De longe, meu personagem favorito foi João Hanson, no ápice de sua fofura e transformação; a pessoa que passou tudo aquilo, amadureceu, e mostra que, depois de uma vida tão conturbada, supera muitos sábios de barba branca.
Ariane fez um desabafo que falava por muitas de nós, mulheres. E sua relação com João me trouxe sérios arrepios, da primeira à última página - eram os momentos deles que eu mais aguardava. Mas gostaria de ressaltar a beleza de outro personagem: Robert Locksley, o líder da insurreição, com suas ideias anarquistas e revolucionárias pela libertação de Sherwood, e que conduziu uma luta de dar orgulho a todos nós. Consciente, forte, determinado. Um homem temido, assustador, e ao mesmo tempo, uma alma apaixonada.
"... O homem contornou a casa e a viu. Ela estava usando roupas que apenas homens deveriam usar. Estava fazendo serviços que apenas homens deveriam fazer; não porque o sexo feminino seja frágil demais para se igualar ao masculino, mas porque mulheres são seres fantásticos demais para utilizarem suas energias em trabalhos que não são dignos de sua sensibilidade. (...) Existem poucas, bem poucas coisas pelas quais vale a pena viver e morrer. O amor é uma delas." (P. 170-171)
Um ponto curioso, que eu já notara no primeiro livro, é a linguagem que mescla o erudito e o contemporâneo; à primeira vista, pode soar estranha, por exemplo, em uma página, ver pessoas usarem o tratamento real, com muitas ênclises e formalidade, e na página seguinte, entre os populares, ocorrerem gírias como “maneiro”; mas terminamos por entrar no ritmo e muitas passagens ficam mais divertidas por isso. O livro teve um final emocionante, do tipo de fazer a gente se descabelar e correr para virar as páginas, descobrir o que vem depois.
O autor ainda traz a religião à tona, mostrando as reações de algumas pessoas que veem suas crenças sendo questionadas. De que adianta abrir os olhos quando vivemos na escuridão? Esta é uma história que envolve amor, paixão, família, honra de família, decisões difíceis, magia e tecnologia caminhando juntas, novos forasteiros trazendo a magia do oriente.
"Se você é capaz de tremer de indignação a cada vez que se comete uma injustiça no mundo, então somos companheiros." (P. 241)
“CORAÇÕES DE NEVE” tem alma própria, personagens que amadurecem cedo e tomam as rédeas do próprio destino. É um livro ainda mais divertido que o primeiro, e que carrega sua própria filosofia. Fala de luta, povo, dinheiro e diferenças sociais. Ri e chorei com as descobertas de João sobre as mulheres, e o conflito da amizade que se transformou em paixão. A visão do autor sobre o mundo e o comportamento feminino foi bem acertada – eu particularmente não acreditava que um homem pudesse compreender assim a nossa essência, especialmente as coisas que fazemos involuntariamente, por instinto. Mas ele acertou em cheio – falo por mim.
Confesso que me perdi no torneio de pugilismo, que não é o meu forte e teve muitos golpes que não conheço. Mas no geral, o livro me encantou de forma única. Temos várias referências a filmes famosos, animes e a ótima releitura dos contos de fadas que já sãoconhecidos do grande público.
O livro é dividido em três atos: Corações de Inverno/ Corações de Gelo/ Corações de Neve. A diagramação interna e a arte de capa, como era de se esperar, ficaram supremas. A capa, de Renato Alarcão, é do tipo que você segura em mãos e se perde em pensamentos a cada contorno, a cada nuance de cor. Absolutamente linda, como todas as capas da trilogia. Na diagramação interna, só senti falta do mapa de Nova Ether, porque precisamos acessar o primeiro em dados momentos. Recomendo com fé o/