spoiler visualizarLetícia.Lari 03/08/2020
Um novo Rei, uma nova Era
"Corações de Neve" é o segundo livro da trilogia de fantasia "Dragões de Éter" escrita pelo brasileiro Raphael Draccon. A obra foi publicada pela primeira vez em 2009, sendo uma das poucas histórias de fantasia nacionais.
Primeiramente, OK, somente neste livro entendi o nome da trilogia: Dragões de Éter. Não é um livro que fala sobre dragões especificamente, mas eles estão ali. Eles fazem parte da filosofia por trás da história, esses seres são a forma do éter, a substância que forma tudo e todos os seres.
É incrível a forma como o autor consegue unir as histórias já conhecidas e criar uma completamente nova e cheia de magia. Uma vez aprendi o conceito de criatividade: não é a habilidade de se criar coisas que não existem, como uma dom divino, mas sim a habilidade de conectar coisas diferentes e que já existem, para criar uma inteiramente nova. E Draccon faz isso com uma naturalidade impressionante. As histórias apresentadas nesse livro já conhecemos: Robin Hood, Branca de Neve, João e Maria, Chapeuzinho Vermelho, e várias outras. Mas quando elas são conectadas no livro, elas ganham outro sentido. E os leitores ficam com um gostinho de easter-egg que todo fã adora, podendo reconhecer as histórias já amadas por eles.
Já no começo do livro temos uma imensa quantidade de referências. Afinal, é a coroação do novo rei de Arzallum, e, portanto, TODOS estão presentes. Todos os reis de todos os lugares, cada um com uma história já conhecida: A Bela e a Fera, A Bela Adormecida, Branca de Neve, Oz, Atlântis,Os Mosqueteiros, Robin Hood, e por aí vai. São tantas referências que acho que nem consegui pegar todas elas.
Bem, na coroação, o novo Rei pode fazer três pedidos aos outros reis presentes, pedidos que não seriam feitos em outra ocasião. Nesse momento a história começa a tomar seu rumo. Um desses pedidos, e o mais importante, é a libertação do prisioneiro Robert de Locksley, conhecido por nós como Robin Hood. Com o pedido aceito e a libertação ocorrida, Robin parte em busca do que não conseguiu antes: a libertação do Condado de Sherwood. Para isso, uma guerra é travada contra os reinos de Stallia e de Minotaurus.
Enquanto isso, no reino de Arzallum, um grande torneio está acontecendo, o Punho de Ferro, onde os melhores campeões de todos os reinos competem pelo título de maior campeão de todos. Só que, nas atuais circunstâncias em que os reinos estão prestes a entrar em guerra, o título que todos buscam é também o de maior nação. O esporte adquire posições também políticas, e é nisso que a história se embasa. Admito que nessa parte fica um pouco cansativa de ler. As cenas de luta são muito boas, mas extensas e cansativas. Os outros personagens ficam em segundo plano e parece que o Punho de Ferro ganha um foco bem maior.
Mas leia. Vale a pena passar por isso para chegar no final. Por que é no final que, tudo que não aconteceu nas 300 primeiras páginas, acontece nas 100 últimas. O final é cheio de reviravoltas e descobertas que fazem seu queixo cair. Pena que são tantos acontecimentos em poucas páginas, que fica tudo corrido e superficial. Esse é o único defeito do livro, o autor podia ter deixado mais páginas para isso, explorado mais as cenas e os sentimentos dos personagens.
Por fim, queria falar sobre a escrita do livro. O autor, como um bom brasileiro, utiliza várias gírias que nos aproximam dos personagens. Isso é muito bom, pois como temos poucas literaturas fantásticas brasileiras, quando ocorre esse tipo de fala dos personagens é quando o leitor lembra que está lendo uma literatura realmente brasileira, e não uma estrangeira. Outro ponto, é a relação leitor-narrador que ele cria. Muitas vezes ele conversa diretamente conosco. Esse recurso foi mais explorado no primeiro livro, sendo deixado um pouco de lado nesse segundo, o que senti um pouco de falta. E, por último, os flashbacks. Eles ficam um pouco confusos em algumas partes em que ele exagera nesse recurso. Algumas falas é difícil de lembrar quando foram faladas. Esse recurso é muito bom na TV, que temos as cenas visuais para lembrar, mas na escrita é mais difícil relembrar e a narrativa quebra seu ritmo (pelo menos foi o que senti) por ficar tentando lembrar quando aquilo aconteceu.
Fora esse pequenos detalhes, a história é muito boa. A leitura é cativante, leve e agradável, como deve ser todo conto de fadas. E Draccon é um ÓTIMO contador de histórias.