MiCandeloro 22/02/2015
Não era nada do que eu imaginava!
Charlotte se orgulha de ser mãe de família e uma empreendedora bem-sucedida, mas se entristece ao se lembrar de que foi traída e abandonada pelo marido, James. No fundo, ela age como se tivesse falhado como esposa e como se o fato de James ter se apaixonado por outra mulher fosse sua culpa.
Desde o divórcio, Charlotte se fechou para o mundo e o seu coração congelou. Mesmo depois de anos longe de James, ela ainda não conseguia se relacionar com nenhum outro homem, muito menos se sentir atraída por alguém. Será que um dia ela voltaria a amar?
"Quando o entorpecimento desliga um coração ferido, é preciso um milagre para religá-lo."
A questão é que Charlotte estava cansada de ficar sozinha. Os filhos, agora crescidos, já não davam tanta bola para ela, e os encontros às cegas aos quais ela se submetia a deixavam ainda mais desanimada. Então Charlotte tomou uma decisão radical, viajou para a Inglaterra e hospedou-se por duas semanas na Austenlândia, afinal, também merecia relaxar e tentar curar as suas feridas.
Pembrook Park era um local mágico, que tinha o intuito de oferecer uma imersão completa no mundo de Jane Austen, com direito a vestimentas de época e chapéus graciosos, chás, cavalheiros fazendo à corte e um baile ao final, incluindo um pedido de casamento.
Claro que tudo era de mentirinha. Mulheres pagavam muito caro para participar dessa fantasia e vivenciarem alguns instantes de paixão. Era exatamente tudo o que Charlotte precisava: amar e se sentir amada, nem que fosse por apenas alguns dias.
Mas então por que o Sr. Mallery a afetava tanto de uma maneira que transcendia a brincadeira? Ele era um ator, certo? Havia sido designado para cortejá-la. Mas seus olhares penetrantes e galanteios desmedidos pareciam ser de verdade. Por que era tão difícil separar o mundo real do faz de conta ali, naquela casa antiga que a deixava com tanto medo?
Sua estadia, que era para ser tranquila e divertida, adquiriu um ar completamente sombrio e assustador quando, no meio de um jogo macabro, Charlotte encontrou um corpo no segundo andar. Charlotte estava decidida a ser a heroína de sua própria história, a enfrentar seus medos e a também desvendar aquele assassinato sangrento, nem que para isso custasse a sua vida.
Querem saber o que vai acontecer? Então leiam!
***
Desde que li Austenlândia, um livro que amei demais, fiquei eufórica para voltar para Pembrook Park e mergulhar novamente, junto de outra protagonista, naquele romance de época de deixar qualquer mocinha suspirando. Justamente por isso, surtei quando soube do lançamento do segundo volume da duologia e tratei de solicitar de imediato Meia-Noite na Austenlândia.
Para aqueles que não curtem séries, não se preocupem, por mais que este volume se passe no mesmo cenário do anterior, as histórias são independentes, e nada os impede de lê-los separadamente. Porém, não recomendo que os leiam fora de ordem, para evitarem perder a graça, já que a autora faz algumas breves considerações em relação à primeira obra.
Meia-Noite na Austenlândia é narrado em terceira pessoa e simplesmente não acho que essa opção de escrita tenha funcionado. Infelizmente, não conseguia me prender na leitura. Lia sem assimilar o conteúdo e tinha sempre que ficar voltando para os parágrafos anteriores e pescar o que perdi. Sem contar que não consegui criar nenhum tipo de relação com os personagens, especialmente com a protagonista.
Charlotte me irritou profundamente. Durante boa parte da história, ostentou uma posição de coitadinha, ao mesmo tempo em que queria tentar ser forte. Suas inseguranças, incertezas e medos são completamente incompatíveis com uma mulher com mais de 30 anos, mãe de dois filhos, e empresária mega sucedida que, sozinha, conquistou seu primeiro milhão de dólares.
Simplesmente ela não me convenceu. Charlotte era boazinha demais, legal demais, gentil demais, abnegada demais, tudo tão demais que ficou chato. Fiquei impressionada com o quanto todos os assuntos foram desenvolvidos com tamanha superficialidade. Nenhum drama foi bem explorado e a reviravolta que a autora tentou dar no enredo foi tremendamente forçada a ponto de ficar "mais artificial impossível".
Mas o que realmente estragou o livro para mim foi o fato de Shannon ter inserido um mistério "a la Agatha Christie" na trama. Quando li Austenlândia, foi porque queria ter a oportunidade de vivenciar uma experiência de época no mundo contemporâneo, que ficou completamente anulada no momento em que tivemos que suportar os desvarios de Charlotte relacionados ao crime que somente ela tinha certeza de ter acontecido.
Charlotte só pensava nisso noite e dia. Sua maior motivação era investigar a tudo e a todos e descobrir o real culpado, que ela tinha certeza de estar entre os hóspedes ou os funcionários da casa, apesar de ninguém acreditar nela. Se o suspense relacionado ao "assassinato sangrento" tivesse sido mantido no mundo de fantasia, teria sido fácil de engolir, teria até ficado legal, como se estivéssemos acompanhando uma mocinha de 1816 solucionando um crime. Porém, quando a autora decidiu trazê-lo para o mundo real, estragou tudo!
O pseudo assassinato foi tratado com tamanha leviandade que chegou a me assustar. Sem contar que a resolução do crime chegou a beirar o ridículo. Além da motivação do assassino ter sido infundada, a reação dos hóspedes e da própria dona da casa foi absurda. Simplesmente incabível pensar que pessoas como essas poderiam ter se comportado daquela maneira frente a um homicídio. Só me resta pensar que tal situação se tornou tão banal a ponto de não abalar mais ninguém. Triste.
Até entendo o porquê dessas investigações de Charlotte terem sido importantes para a personagem. Ela sempre se culpou de não perceber previamente a infidelidade de James, e agora estava decidida a desvendar o mistério e provar que podia ser perspicaz e destemida, mas, na minha opinião, não funcionou. Serviu apenas de um meio de distração para as suas próprias dúvidas, mas que, ao final, surpreendentemente cumpriu a sua função, já que no desfecho a personagem finalmente pareceu pegar as rédeas da sua vida com as próprias mãos. Incongruente, sim, mas o livro pareceu ser assim o tempo todo.
Meia-Noite na Austenlândia é um livro que sei que vai agradar a muitos, principalmente os leitores menos exigentes que apenas buscam por uma leitura de entretenimento que os faça suspirar e se divertir numa elucidação de enigmas, ou então àqueles que adoram um romance de época e se deleitam com inúmeras referências literárias de outras obras. Entretanto, infelizmente não serviu para mim. Achei a leitura arrastada e sofri para terminá-la. O curioso é que, ao final, fiquei sentindo falta do universo de Austenlândia, talvez por ter boas recordações de Pembrook Park e de Jane.
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