@retratodaleitora 26/04/2016Incrível. Amanda e Nina, sua filha de 4 anos, vão passar alguns dias em uma casa de campo, num lugar distante e acolhedor. Logo nos primeiros dias conhecem Carla, vizinha simpática e prestativa com quem Amanda conversa. Em uma dessas conversas Carla vai contar sobre seu filho, David, e o que aconteceu ao menino no passado que, de tão grave, a impossibilita de sentir qualquer coisa por ele. David deixou de ser seu filho há muito tempo.
Em uma viagem vertiginosa ao passado, Carla conta que, quando o garoto tinha apenas alguns anos de vida, ele contraiu uma doença da terra, algo como um verme desconhecido e perigoso que o consumiu de dentro para fora em pouco tempo. Então teve que fazer uma escolha. Agora o corpo de seu filho estava ali, vivo, mas não abrigava mais a alma de David.
Escutando aquele relato angustiante, Amanda sente o fio que a liga a sua filha se tensionar. A distância de resgate; que é como mede a distância que a separa de sua filha para um possível resgate, caso algo aconteça.
Agora, em uma sala da emergência do pronto-socorro e à beira da morte, Amanda é encorajada por David, que lhe faz companhia naquele quarto escuro, a contar tudo o que aconteceu até ali. Do momento em que conheceu a mãe dele até o momento exato em que nascem os vermes. O momento em que tudo mudou.
"Sobre os vermes. A gente precisa ser paciente e esperar. E enquanto espera precisa encontrar o ponto exato onde nascem os vermes. (...) Porque é importante, é muito importante."
Seriam agrotóxicos, uma epidemia ou uma praga naquele lugar? E quando as coisas começaram a dar errado para Amanda e sua filha?
Sabe aquele tipo de leitura que te deixa desnorteado? Que, em poucas páginas, te prende de maneira tal que, quando concluímos a leitura, ficamos ainda com a estória dentro de nós por muito tempo? Aquele livro cujos personagens foram tão belamente construídos que acabam por se tornar parte de nossa família, ou de nós mesmos, durante a leitura? Cuja dor sentimos; cujos sentimentos compartilhamos; cujos acontecimentos improváveis nos desequilibram em igual medida?
Distância de Resgate é justamente esse tipo de livro.
Com uma premissa aparentemente fraca e definitivamente confusa e singelas 144 páginas, esse livro é mais do que eu esperava, do que eu imaginava...
Um drama familiar que se desenvolve em um terreno perigoso e infestado de agrotóxicos mortais? Crianças doentes e parasitas de vermes? Mudança de almas para salvar essas mesmas crianças?
Sim, é isso mesmo; e eu sei, é difícil de entender.
Assim que conclui essa leitura (que fiz em pouquíssimo tempo) fiquei bons minutos imaginando como iria resenhá-lo. Como descrever tudo o que senti e tudo o que Samanta Schweblin nos oferece nessa narrativa de tirar o fôlego e apertar o peito. E o mais importante: sem dar spoiler.
Narrado em primeira pessoa por Amanda, que é incentivada por um menino doente chamado David, o livro não tem divisão de capítulos. É tudo um fôlego só, e assim fazemos a leitura.
Samanta apresenta um relacionamento entre mãe e filha bonito de acompanhar. A dedicação de Amanda com Nina é de uma beleza extraordinária; e tudo fica ainda mais interessante quando a mãe nos conta sobre a distância de resgate e como herdou isso de sua vó; achei tudo isso espetacular.
A autora também explora o apocalipse pessoal pelo qual as personagens passam; o caos interno que só se intensifica conforme a tensão na narrativa cresce.
E esse é um livro tenso! Um terror psicológico que me deixou sim com medo em algumas passagens. Claro que não ajudou ter lido em plena madrugada. E sabemos que narrativas assim ficam ainda mais aterrorizantes quando envolvem crianças, concordam?
E o final...
São tantas as teorias sobre esse desfecho! Confesso que não entendi muito bem as últimas páginas do livro, vou ser sincera. O final foi tão inesperado e rápido (e maluco) que pode ter dezenas de interpretações, nenhuma delas fácil ou menos dolorosa.
Agora, se ainda não os convenci a ler, como proceder? Pois confiem nessa leitora que vos escreve com a boca aberta e o coração ainda na mão e deem uma chance a esse livro fenomenal.
E, se já leu, pega na minha mão e vamos conversar sobre ele, pois necessito disso.
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http://umaleitoravoraz.blogspot.com.br/2016/04/distancia-de-resgate-de-samanta.html