Gabriel Archanjo 25/07/2017
"ASSASSINAR POR IDEOLOGIA É MAIOR ABERRAÇÃO DO SER HUMANO" .
CANÇÕES DE NINAR EM AUSCHWITZ.
Certa vez conversando com um querido professor, o nome Auschwitz veio à tona e eu tive que perder uns segundos para lembrar do que se tratava, e sobretudo quando foi mencionado os horrores feitos pelo Drº Josef Mengele. Angustiado de ter que manter-me em silêncio, pois esta parte da Segunda Guerra Mundial não é muito mencionada no Ensino Médio, resolvi pesquisar mais este campo de concentração polonês.
Passado um tempo, esqueci-me completamente do assunto devido aos múltiplos afazeres, então em visita à biblioteca, deparo-me com o exemplar: Canções de Ninar em Auschwitz. Uma onda invadiu minha cabeça, fazendo-me lembrar daquela cena e imediatamente, mesmo querendo outro, peguei este livro e comecei a lê-lo naquele mesmo dia.
Dizer que é emocionante é pouco, pois vai além de emoções. Estamos diante de um livro impactante, forte, de um livro que causa repulsa em algumas partes, mas que enobrece e traz esperança no valor e amor que o ser humano é capaz de ter em meio as atrocidades de um mundo caótico.
A história é verídica: uma enfermeira alemã chamada Helene Hannemann, raça ariana, como o próprio Mengele diz no prefácio, bela e pura, tem a família levada em Maio de 1943, pela Gestapo, que é a polícia nazista, à Auschwitz, que era o maior campo de concentração nazista. Mesmo sendo ariana, ou seja, tendo o direito à liberdade por ser "perfeita", Helene não se distancia da família, ficando com eles nesta prisão. Daí nasce a trama da narrativa. Sua família é levada, pois seu marido é Johann, um cigano violinista de origem Zíngara - tradicional corrente cigana da Europa - (nem preciso dizer que meu coração congelou, né?) - e tem com ele cinco crianças: Blaz, Otis, o casal de gêmeos Emily e Ernest e a caçulinha Adália.
Tão logo chega a família Hannemann à Auschwitz, eles vão para o acampamento cigano em Birkenau Auschwitz II. Num primeiro momento, somos chocados com a descrição do sofrimento do lugar, sobretudo do ponto de vista de Helene, já que é ela quem narra sua história através de diários. Ela e seus filhos são levados para o barracão número quatro, onde ficam as prisioneiras russas, e ali junto delas, passam por momentos sombrios de medo e solidão. Porém, ela com seu jeito bem peculiar de ser, com sua voz extremamente calma, fria e suave, chama a atenção do Drº Mengele, o mais cruel médico nazista da História Mundial, que é, de uma certa forma, "adocicado" pelo jeito de Helene, e concede a ela alguma liberdade, como estar no acampamento com seu marido e outros ciganos.
Sendo enfermeira, ela é autorizada por Megele, (que descobri no livro que era chamado de "Anjo da Morte") que ao reparar sua postura, sua liderança e seu jeito ao mesmo tempo forte e suave, além de um altruísmo sem fim, uma vez que poderia salvar-se por ser raça pura, a fundar e dirigir uma creche dentro do acampamento.
Tendo posse dessa creche e um limitado aval de Megele, ela consegue suportar a dor e o infindo sofrimento de um campo de concentração para salvar não apenas seus filhos, mas o maior número possível de crianças. Existe aqui, porém, um enorme disparate, pois sabemos que nos campos de concentração haviam somente trabalho sub humano e morte, contudo, Helene, esta heroina negligenciada da História até então, abre suas asas e acolhe todas aquelas crianças que estão protagonizando um tormento absurdo naquele campo de extermínio. Ali, ela torna-se mãe não só de seus cinco filhos, mas de centenas de crianças que já estão sem pais, já estão atormentadas pelos sussurros do que ocorrem por trás das paredes de pedra, por toda a crueldade que - o autor sabiamente deixa em suspense - é feita pelo desalmado Josef Mengele. (Que fazia experiências genéticas com crianças).
Nesta obra, o que causa também grande horror no leitor mais sensível é ver que muito do diálogo daquela época ainda é atual e verbalizado por puristas, por "doutores" da razão, por pessoas que culpam grupos étnicos e religiosos pelos males sociais, que pregam a intolerância, e que pior, não enxergam o outro como próximo devido aos seus ideias. E o que consola e enxuga as lágrimas também de um leitor mais sensível, é saber que existe no mundo Helenes que se sacrificam em prol do amor, que transpira amor num ambiente cujo ar é contaminado de horror e ódio.
Por dezesseis meses, Helene consegue cantar suas canções de ninar em Auschwitz e salvar a vida de centenas ou milhares de pessoas que estavam no pavilhão oito e quatorze da ala Birkenau. Ela conquistou a admiração do "Anjo da Morte", que mesmo sendo uma pérfida alma, não pode deixar de curvar-se à luz de Helene.
Um livro além de qualquer expectativa, e encerro com uma frase dita por Helene que vale muito para a nossa atualidade.
"ASSASSINAR POR IDEOLOGIA É MAIOR ABERRAÇÃO DO SER HUMANO" . p. 68