Val Alves 17/01/2021
Confissões de um escritor profundo e sensível
Romance de formação com traços autobiográficos do controverso e intenso Yukio Mishima, narra a vida de um garoto que descobre a sexualidade de forma prematura ao perceber sua atração por outros garotos na escola. Por sentir-se anormal, ele passa a viver uma vida "de máscaras" , interpretando o que ele considera uma pessoa normal.
"Foi a partir dessa época que comecei a compreender vagamente o mecanismo segundo o qual o que parecia ser uma representação aos olhos das pessoas, era para mim expressão da necessidade de retornar a minha própria essência, ao passo que o que parecia a todos o meu jeito natural de ser era, na realidade, uma encenação."
A escrita de Mishima é linda e profunda, os registros imagéticos do jovem personagem são ricos e impressionantes, uma vez que todos objetos e lembranças por ele resgatados possuem uma carga simbólica essencial para uma tentativa de interpretação de suas representações mentais, seja na descrição das luvas brancas usadas na escola ou mesmo na admiração pela imagem de Joana D'Arc no livro didático (até descobrir que se trata de uma mulher); na fixação pelo jovem que trabalha nas fossas ou a obsessão apaixonada pela imagem de São Sebastião cheio de flechas preso a um tronco. Em seus devaneios vê jovens mutilados e isso lhe causa incontrolável prazer erótico e, ao falar da infância, jura lembrar-se do momento do nascimento. Todas essas imagens parecem mostrar uma coexistência conflitante entre o puro e o profano, o desejo e o senso moral,
e ao representar o amor ele se vê confuso e parece perder-se às vezes com seus sentimentos.
Se por fora ele presencia a guerra entre as nações, por dentro ele vive uma guerra subjetiva por sentir-se uma grande farsa, o que lhe suscitaria também desejos de isolamento e aniquilação.
"E nessa minha vertigem, duas forças disputavam o controle sobre mim. Uma era de autopreservação, a outra era mais profunda, uma força que desejava com maior intensidade ver o colapso de meu equilíbrio interior. Essa última era a compulsão pelo suicídio, um impulso sutil e secreto ao qual as pessoas se rendem com frequência, inconscientemente."
Livro lindíssimo e, como não poderia deixar de ser, entrou para a lista de favoritos.