otxjunior 15/05/2020O Livro dos Baltimore, Joël DickerOs livros de Dicker despencam rápido. Digo despencam porque ele definitivamente sabe como abrir um livro de maneira que prende a atenção do leitor de imediato. Isso e o sabor pitoresco da visão de um europeu (o autor é suíço) sobre o subúrbio americano povoado de sonhos ao molde americano de way of life (tal qual quando o britânico Sam Mendes dirigiu Beleza Americana) são os pontos positivos desta sequência da série protagonizada por Marcus Goldman, escritor celebridade. Aliás são muitas as celebridades ou pessoas extremamente bem sucedidas aqui. Os personagens não se limitam a exercer puramente uma profissão, mas são os melhores em seu campo de trabalho: Letras, Música, Direito, Medicina, Engenharia, Esportes. A América de Dicker brilha, mas não o suficiente para não ser possível discernir os tons de verde das gramas dos "vizinhos".
A história se desloca entre Baltimore, Flórida, Montclair, Madison e durante muitas décadas em que acompanhamos a saga dos Goldman, suas dissidências e rivalidades, até que tudo culmina num episódio familiar denominado pelo narrador por o Drama. Um verdadeiro novelão, divido em 5 partes, com poucos núcleos mas muitas transições no tempo, incluindo a fase adolescente do narrador e seus primos, sem nos poupar de momentos constrangedores.
Há bastante repetições e quando a única maneira do autor resgatar o passado é através de entrevistas insistentes, algumas delas por telefone, a membros de sua família, fica tudo mais cansativo. E, claro, que os entrevistados hesitantes interrompem o diálogo no momento chave para a perfeita conclusão de capítulo. A hesitação some assim que Marcus insiste mais um pouco no próximo telefonema, por exemplo. Ainda entre os pontos negativos estão aqueles que reforçam o androcentrismo. É sinuoso, mas desde o livro anterior da série, percebo uma indulgência quanto aos personagens masculinos; enquanto os femininos são definidos por como seus pares do sexo oposto os percebem. Repare como nunca ficamos sabendo o que Alexandra estuda na faculdade. Aliás, ela é o protótipo da "cool girl" de Garota Exemplar, de Gillian Flynn. Sem parecer, no entanto, trazer qualquer crítica a esta representação de gênero, Dicker desaponta ao parecer menos "estrangeiro" que um Sidney Sheldon. Este ao menos, no subgênero thriller soap opera, mantinha o interesse de seus leitores para além das primeiras páginas.
P.S.: Escrevi essa resenha com pouco mais de 80% lido, mas infelizmente serve para o restante também. Dito isso, o autor consegue despertar uma certa curiosidade sobre sua própria vida, já que ele não se afasta de seu personagem ao atribuir-lhe a autoria do livro. Um truque que tem seu fascínio, mas está desgastado.