Luigi.Schinzari 15/06/2020
Algumas palavras sobre "O Pai Goriot"
Dentro da vasta obra de Honoré de Balzac (1799-1850) - compilada em sua "A Comédia Humana" e com mais de 90 histórias completas, além das dezenas de incompletas, ao longo de seus vários volumes -, "O Pai Goriot", de 1835, é uma das mais célebres.
A história, centrada em uma pensão modesta em uma região suburbana de Paris e em seus habitantes, centra em Goriot, velho alvo de gozações de boa parte de seus vizinhos, e Rastignac, estudante de direito que sonha em entrar nos círculos aristocráticos da cidade pós-revolução (a história se passa em 1819), ambos moradores da pensão da Sra. Vauquer. Não entregando o ouro da narrativa, mas é necessário dizer que Goriot foi um pai devoto às suas duas filhas, a quem deu tudo e mimou muito, acabando por realizar a vontade de incluí-las, por meio de seus maridos, na alta Sociedade (e o S maiúsculo é proposital para Balzac). Com isto, o rico Goriot, que enriqueceu durante a Revolução cobrando alto por suas massas para uma maioria miserável, foi empobrecendo e, por problemas com seus agora genros, acabou se afastando de suas únicas preciosidades (suas filhas) e sendo relegado ao núcleo da suburbana pensão. Rastignac, como forma de adentrar a almejada Sociedade, se envolve com uma das filhas de Goriot, Delphine, casada com o barão Nucigen, e está formada a história base, que terá um desenvolvimento impecável.
A contextualização e a sinopse são válidas para o leitor interessado, mas algo um fator é ainda mais determinante para a qualidade da obra: as questões por ela abordadas.
Balzac, autodenominado historiador de costumes, demonstra uma Paris corrompida pela mesquinharia, pela superficialidade. E, fato este que lustra sua qualidade e que o distingue dos pensadores medíocres, tanto de sua como, principalmente, de nossa época - suas críticas não são atreladas a um único grupo: estes sintomas estão incrustados por todas as camadas.
Em uma leitura superficial, podemos pensar que o único honesto da história seja Goriot, aquele que literalmente se sacrificou por suas filhas, mas, em uma breve reflexão, percebemos que nem ele é poupado; é até mesmo um reflexo para todo o resto: se torna irascível quando ameaçam sua paz (lê-se: suas filhas), foi pragmático ao enriquecer por meio de métodos escusos durante a Revolução de 89, e, o principal: está nesta condição miserável por suas próprias falhas, pois mimou as filhas e, literalmente, alimentou este monstro da luxúria (ambas têm amantes, uma, especialmente, com o aval do próprio Goriot, que é Delphine com Rastignac) e da mesquinharia, da insensibilidade. Ao fim, o romance é um retrato triste da solidão (não só da morte, mas a solidão intrínseca a nossa estrutura urbana) em uma sociedade individualista e insensível, mas não um retrato maniqueísta.
Este texto é apenas uma apresentação, uma recomendação, da obra "O Pai Goriot", de Honoré de Balzac. Não consigo e nem quero esmiuçar todas as suas nuanças; para isso precisaria de mais espaço e mais intelecto. Mas caso não tenha sido convincente, fica aqui uma citação do protagonista Rastignac, após sua primeira desilusão com sua crença: "Acredite em todas as coisas ruins que lhe falarem da sociedade!" C'est le mot.