Tiago 20/11/2015
Um livro mais para fãs de David Byrne do que para fãs de bikes.
David Byrne é o vocalista da banda Talking Heads, e por acaso um apaixonado por bicicletas, tanto que encabeçou a organização de um evento em NY, nos Estados Unidos em 2008, onde levou pessoas que eram ativistas das melhorias na mobilidade urbana para falarem para centenas de pessoas suas ideias. Ele costumava, em em suas turnês, levar uma bicicleta dobrável dentro de uma mala, onde a montava e saía pelas cidades onde ia fazer seus shows. Nessa, surgiu um diário de bordo sobre suas experiências em algumas cidades de vários países, entre Brasil, Argentina, França, Alemanha, Japão, Austrália, etc. O livro tem seu valor pelo apanhado de dados sobre mobilidade urbana, que muitas vezes traz junto não apenas as observações do quanto o sistema de empréstimos de bicicletas em Paris, por exemplo, funciona muito bem, mas faz também um apanhado histórico de como as cidades se construíram e até onde a preocupação com o planejamento urbano as levaram.
É interessante observar, em relação ao Brasil, o quanto seguimos os modelos importados de planejamento urbano, em especial no que diz respeito à mobilidade urbana. Enquanto na França, que historicamente tem uma consciência mais forte de valorização aos diversos tipos de meios de transporte, as ruas são planejadas de modo que pedestres, carros, motos, bicicletas possam andar sem tantos conflitos (há um sinal próprio para as ciclofaixas, assim como para os carros e pedestres; o sinal das ciclofaixas abrem antes dos carros, de modo que assim acidentes sejam evitados), os Estados Unidos, em termos de mobilidade urbana, foi construído quase completamente sob a perspectivas de empresas como GM e Ford, construtoras de automóveis, o que faz com que as ruas sejam quase exclusivamente deles. Só em 2008, saturados das ameaçadas do aquecimento global, etc, foi que surgiu uma maior preocupação com o uso de transportes alternativos, daí as bikes. A partir de quando as bicicletas emprestadas foram instaladas em algumas cidades dos EUA, que tem um planejamento mais próximo do que onde eu moro, Fortaleza, Ceará, um dia busca - ou buscava ser - foi que os órgãos de infraestrutura urbana começaram a se preocupar mais com os transportes alternativos. De 2014 para cá, 2015, várias ciclofaixas foram criadas na minha cidade. Há um número maior de pessoas que passaram a adotar a bicicleta, e considerando que mesmo que apenas algumas ciclofaixas não mudem realmente muita coisa, os ciclistas daqui (eu, oi!) ainda são corajosos por se aventurarem em BRs e outras ruas com quase nenhuma calçada, tendo que disputar espaço com pedestres, motoqueiros e motoristas.
Byrne é otimista com o número imenso de jovens dos Estados Unidos. Historicamente, eles vivem o mesmo que os Fortalezenses estão vivendo: mais da metade da população, hoje, tem entre 15 e 29 anos. Byrne observa que os jovens, sobretudo das áreas mais pobres, andam mais de bikes, e enxergam nelas a melhor forma de locomoção entre um ponto e outro da cidade. Aqui em Fortaleza, a respeito das periferias usarem mais bicicletas, não é diferente. O que particularmente me entristece, é que, ao mesmo tempo que há uma valorização maior aos meios de transporte alternativos nas periferias daqui, há também um enorme desrespeito por parte dos motoristas de carros e motos. Na cidade toda é assim, mas na periferia, pela formação de consciência urbana ser menor, e por talvez a sensação de empoderamento por ter um carro ser maior entre os pobres, quando estão dentro de um eles se sentem com mais ar dentro do peito do que um pombo.
Voltando ao livro, apesar das fugas do tema das bikes, há algumas curiosidades interessantes sobre alguns países. Byrne vai contando um pouco de suas influências musicais (daí, quem não é fã, ao menos se sente um pouco interessado em ouvir alguma coisa dele) e dando vagamente comentários sobre algumas questões filosóficas e artísticas. Nada muito sério, nada que se torne uma grande questão no livro.
O último capítulo e o epílogo são as melhores coisas do livro.