jules salazar 09/05/2020Ferréz é cirúrgico numa narrativa brusca que retrata uma realidade ainda mais brusca. Os cortes das cenas e a velocidade em que acontecem mortes e mais mortes, sem tempo para senti-las ou velá-las é o retrato fiel de um Capão dos anos 90 que muito ouvi nas histórias de família.
Não há tempo a perder, pois a periferia já começa atrasada na corrida por uma vida digna. Muitos embarcam, poucos descem no ponto final. As histórias cruzadas dessas crianças, adolescentes e adultos são histórias de vizinhos, conhecidos, amigos. Doído é ver quanto tempo se passou desde que essa obra foi escrita, ler os relatos ao final, e perceber que chegamos em um 2020 pior do que poderíamos imaginar que seria - especialmente em meio a uma pandemia, na qual já se sabe quem mais sofre: a galera que nem entra pra estatística porque não teve nem exame pra fazer e identificar a causa da morte.
Narrativa brusca, dura, sincera e necessária. Ferréz fez muito bem em apostar na literatura marginal, mesmo onde "ninguém lê". Eu leio, Ferréz. Obrigada.