Toni 18/04/2024
Leituras de 2023
A estrutura da bolha de sabão [1991]
Lygia Fagundes Telles (SP, 1918-2022)
Cia. das Letras, 2010, 184 p.
Apesar de já conhecer o conto “A estrutura da bolha de sabão” (presente em vários volumes paradidáticos, acho que o li umas 2 ou 3 vezes durante meus anos colegiais), não imaginava que ele fosse apenas uma breve amostra das tensões sociais e psicológicas que iriam caracterizar as demais narrativas presentes neste livro. Dando mais uma vez provas de sua incrível versatilidade, Telles apresenta aqui contos que vão do registro realista ao surreal, das vozes de uma burguesia paulista falida ao depoimento de uma migrante vivendo à margem da sociedade, do crime inadvertido (quiçá premeditado) à profunda mágoa de personagens presas a um cotidiano inescapável.
Diferente de outros livros da escritora, este título reúne apenas 8 contos (em quase 170 páginas), 3 deles (os melhores) quase da extensão de novelas: “O espartilho”, “A confissão de Leontina” e “Gaby”. Nessas narrativas mais longas, o aprofundamento psicológico das personagens evidencia-se pelo vai-e-vem da memória em embate constante com o que se desenrola no presente diegético (ainda que o mesmo possa ser dito das narrativas mais curtas, em menor escala e com outros dispositivos, evidentemente). Em “O espartilho”, por exemplo, que começa com “Tudo era harmonioso, sólido, verdadeiro” logo se transforma em um rosário de revelações desconcertantes de uma família tradicional (daquelas… vocês sabem) cheia de segredos. Ainda que se possa argumentar que a imagem do espartilho seja metáfora fácil de “sufocamento”, Lygia não decepciona na elegância crua de seu uso: “Quer que eu tire o espartilho”, pergunta a narradora à avó que passa mal. “Não filha, eu me sentiria pior sem ele.”
De tudo que li da escritora (neste projeto de ler cronologicamente sua obra — há uma aba aqui no perfil com todas as leituras já feitas), este talvez tenha sido seu livro que menos me impactou. Guardo, claro, imensa paixão por Leontina e pelo primeiro conto (bem curto, “A medalha”), mas para quem nunca leu Lygia e quiser começar por suas narrativas breves, reitero a recomendação de “Antes do baile verde”.