Gustavo_Caetano0201 30/03/2024
Doces para um doce (mais ou menos)
Candyman foi uma leitura muito interessante, foi meu primeiro contato com o escritor Clive Barker e eu adorei.
Acho importante falar sobre a escrita dele e de como ela é inteligente e pensada, o livro mesmo sendo curto parece muito maior do que realmente é por conta de sua história bem desenvolvida, um claro sinal de boa escrita e talento do autor.
A protagonista Helen é muito bem trabalhada ao decorrer do livro, nós rapidamente a entendemos como personagem e mesmo assim contestamos algumas de suas ações e opiniões. Na verdade, até os outros personagens secundários, mesmo que não tenham tanto desenvolvimento, tem ótimas funções aqui e enriquecem a história de maneira muito concisa.
Mas algo que não se pode negar é o fato de que a estrela da história é o conjunto habitacional, é o ambiente em que se passa a história. A forma como esse lugar mexe e influencia com a narrativa é muito bacana, é sempre aquela sensação de peso, de descolamento, de estranheza, até mesmo quando vemos dois personagens interagindo. Fica claro que há algo de errado, uma escuridão que parece habitar ali (e de fato habita), mas que num primeiro momento parece apenas a impressão da protagonista.
As pichações, os grafites, o vandalismo, o abandono, a pobreza, a sujeira, tudo isso corrobora pra que essa sensação só crescesse ao longo do conto.
É interessante como ele consegue criar uma dualidade entre o que os personagens falam e sobre suas reais intenções, que residem na intensidade da voz, nos trejeitos, nas expressões da face, sempre contrários ou muito afirmativos as suas opiniões. Gosto também da maneira como o autor explora as falhas de caráter humano aqui, alguns personagens são deploráveis e outros dignos de pena.
A inserção da figura do Candyman na história é muito legal e esperada, mas também muito tardia, acho que aqui ele peca um pouco pela forma como tudo vai se encaminhando muito rápido pro final, gostaria de ter visto mais sobre essa filosofia dele de sobreviver através dos sussuros, das fofocas, dos causos que se conta de geração em geração e acabam virando parte da cultura e imaginário de um povo. Para mim faltou um contraponto, uma discussão maior entre a Helen e o Candyman, na verdade diria que o conto reafirma tudo que ele diz e acredita nele (sendo esse o principal objetivo da entidade).
Também acho que a forma como o complexo e as pessoas que moram lá estavam conectadas ao Candyman foi bem legal, se assemelha a sentir um cerco se fechando, de fato foi uma espécie de traição entre pessoas que se identificam como seres humanos, e ao mesmo tempo se rendem em definitivo para essa figura tão abjeta. É triste e compreensível ao mesmo tempo.
O final foi bem inesperado e poeticamente trágico até, mas ainda assim, senti como se houvesse um gosto de quero mais na boca, acho que ele poderia ter trazido a figura do Candyman mais cedo e debatido mais assuntos. Mas que para um conto, até que é bem compreensível, gostaria até que o autor escrevesse mais sobre esse universo, supriria muito do meu interesse e certamente o dos outros fãs.
No geral, recomendo muito a história, é uma ótima experiência de leitura, super gostosa e interessante sem ser despretensiosa como outros contos. O livro tem muita coisa pra falar e acho que podemos tirar boas reflexões daqui, com certeza vou atrás de outras obras do autor e espero que a qualidade só aumente.