gleicepcouto 20/06/2011Hugh Laurie: muito além de HouseCom um atraso de 14 anos, O Vendedor de Armas (The Gun Seller), livro de estréia (e por enquanto, único) de Hugh Laurie, chegou ao país, pela Editora Planeta Brasil. Se você ainda não associou o nome do autor à pessoa, Hugh Laurie é o protagonista da série norte-americana, House MD, onde interpreta um médico irreverente e com métodos pouco convencionais, Gregory House. A série conquistou milhares de fãs ao redor do mundo e é considerada uma das melhores da atualidade, um sucesso tanto de crítica, quanto de público. A editora, claro, sabia que poderia utilizar isso a seu favor. Espertamente, na edição nacional, colocou uma foto do ator/escritor que ocupa toda a contracapa do livro.
Nessa ficção policial, Hugh Laurie nos apresenta Thomas Lang, um ex-militar de elite que recebe (e nega) uma proposta de alguns milhares de dólares para assassinar um empresário norte-americano, Alexander Woolf. O “problema” é que ele decide alertar a suposta vítima e é aí que a confusão começa. Lang se vê envolvido em uma trama que mistura indústria armamentista, tráfico de drogas, terrorismo, mulheres e tudo mais. Uma verdadeira conspiração em escala global, que passa por Londres, Suiça e até mesmo Marrocos.
Pode parecer que é muita informação para uma história só, e seria, se o autor não conseguisse conduzir com maestria as situações, amarrando a história de início a fim. Talvez, pensando nessa complexidade, que ele tenha optado por dividir a história em duas partes. A primeira explica como Lang é envolvido na conspiração e os responsáveis por ela. Já a segunda, trata da conspiração em si e mostra o grupo “A Espada da Justiça” em ação. Se comparada com a primeira, essa parte é um pouco mais arrastada, mas nada que comprometa o desenrolar da história.
Com tanta ação, investigações e reviravoltas, o livro consegue não ser monótono em ponto algum. Você não desgruda dele até ler a última frase. E tudo isso é culpa da narrativa dinâmica, ferina e intimista de Hugh Laurie. Através do protagonista, o autor conversa com o leitor, o faz realmente sentir que participa da história. Ele te deixa a par da particularidade de cada tipo de arma que utiliza, por justamente saber que o leitor não entende patavinas disso, e aos poucos, dessa forma, você vai sendo transportado para o mundo de Lang. As piadas tem o mesmo efeito e a obra está repleta delas. É quase impossível ler o livro sem rir ou sem, ao menos, um sorriso no rosto.
O destaque mesmo fica por conta de Thomas Lang, um mocinho nem um pouco chato; correto, mas não moralista; gente boa, mas que não hesitaria em puxar o gatilho ou te dar uma porrada, se preciso fosse; e por aí vai… Ou seja, é contraditório, é real. Você acredita, apesar da loucura que é a história, que existe um Thomas Lang e que ele está disposto a levar tudo até as últimas conseqüências.
Dá para associar a personalidade do médico House ao ex-militar nas frases e monólogos carregados de ironia e sagacidade. Mas, sinceramente, a semelhança acaba por aí. Lang, de longe, consegue ser menos 'sóciopata' e mais humano que House. E o fato da série ter começado em 2004 e o livro datar de 1996 quer dizer muita coisa... O autor já devia prever essa comparação, pois assinou os primeiros manuscritos usando um pseudônimo, e somente deu a ‘cara a tapa’, ou melhor, o ‘nome’, quando uma editora aceitou publicar a obra.
A edição nacional do livro ficou redondinha: a tradução de Cassius Medauar está impecável, assim como a revisão do texto feita por Márcia Almeida de Sá está boa, apesar de alguns errinhos de português. O tamanho da fonte, que é a ideal, e o papel com uma gramatura mais grossa mostram o cuidado que a editora teve com o livro. Claro que nem tudo é perfeito, a capa é um pouco estranha (design de Henrique Theo Moller), e o mini-poster com o rosto do autor na contracapa é constrangedor e desnecessário, até porque na própria capa já tem uma chamada com a mesma foto, mas em um tamanho menor.
Desde as primeiras páginas, percebi o potencial do livro para a tela grande. Depois, soube que é justamente isso que vai acontecer: a MGM já comprou os direitos e Hugh Laurie, inclusive, está ajudando com o roteiro e pode até fazer o papel principal.
O autor prometeu uma continuação para o livro, com o título provisório de The Paper Soldier, mas ainda está sem previsão de lançamento. Continuações geralmente são problemáticas, mas espero que o segundo livro se saia tão bem quanto o primeiro. Sei que vai ser difícil, pois O Vendedor de Armas é fantástico.