Luxcorvere 05/01/2023
" [?]Nem a criação nem o sacrifício podem te alçar aos céus"
Meu ano de descanso e relaxamento consegue ser cantivante e ao mesmo tempo desconfortável, a forma como Otessa mostra a perspectiva da personagem principal, uma mulher de 27 anos, rica, privilegiada e ainda sim procurando por uma fuga da sua realidade totalmente transtornada e cheia de problemas em vários pontos, faz com que eu como leitora consiga me conectar com ela de uma forma impecável.
Apesar da querida ofender uma minoria a cada 20 páginas, ela ainda tem seu ponto: A fuga de uma realidade a qual a pertubava incessantemente e tenho que dizer que ela tem toda a razão em o fazê-lo, conviver com uma mente barulhenta, ansiosa e inquieta é totalmente pertubador.
Eu consigo de certa forma enteder o mau humor, a rispidez e até mesmo em algumas partes a falta de carisma da personagem em diversas passagens, por mais que eu tenha tentado achar ela cruel, fria, sem sentimentos para com a amiga, convenhamos aqui: Todos nós somos assim em um ponto da vida.
Otessa consegue trazer em um livro a realidade nua e crua de pessoas como a personagem principal ( que inclusive me conectei muitíssimo e conheço pessoas iguais) a forma talvez um pouco ríspida do desenvolvimento da personalidade da personagem me fez pensar muito sobre como todos nós somos um pouco como ela, sinceramente entendo muito o lado dela, viveu uma infância e uma juventude totalmente negligenciada, nunca teve afetos verdadeiros da mãe e do pai, foi abusada, usada e depois largada como se larga uma sacola de lixo, tudo isso cria uma pessoa como ela, que apesar de ter fortuna, privilégio e beleza porém tem um grande vazio inimaginável por dentro.
Em certos pontos cheguei a me incomodar com o jeito que ela tratava Reva, mas em outros realmente sentia o descontentamento de ter que estar perto de uma pessoa que sempre olhava para o próprio umbigo e no fim sempre dizia um " eu te amo", Reva é o paradoxo intrigante entre gostar de alguém porém do mesmo jeito ter aversão a ela, vou ser bem sincera: Eu também sentiria aversão e desgosto pela Reva mais do que gostar dela, a todo momento reclamando da vida e tentando se encaixar em um molde da sociedade e sempre se frustando por coisas que o outro consegue mas ela não, às vezes ( leia-se: sempre que possível!) é de um extremo cansaço para quem já está cansado da consciência habitual. Mas é de se confessar que no fim, nossa querida protagonista realmente a amava.
Também consigo compreender Reva, tentando se ajustar a um padrão de sociedade que é imposto até hoje, porém nos anos 2000 era uma onda enorme de magreza, o que levou ela a um estado de anorexia e alcoolismo, a querida apesar de uma infância aparentemente saudável e bem estruturada, ainda tinha problemas com ela mesma, em que em um ponto era consideravelmente entendido. O caso dela com o chefe e o fim, de certa forma ( e provavelmente) sempre foi unilateral e o que gerou um certo problema a longo ou curto prazo (????) para ela, porém trazendo alguns benefícios. Acredito que o episódio onde podemos ver realmente o desajuste de Reva é quando nossa protagonista vai atrás de seus remédios e adentra o apartamento dela, o que podemos ver que no fim ambas são lados opostos de uma mesma moeda. E no fim, acho que a despedida das duas, foi algo que de alguma forma me emocional, foi como se eu fosse a personagem principalmente no último ato de um ciclo de amizade que em algum momento foi boa e depois se perdeu!
A psiquiatra? Um alívio cômico, não? Por mais que ela seja o terror da psiquiatria e Psicológia, ainda me fascinava como ela falava com propriedade sobre certos assuntos, sempre coloquei em jogo se ela realmente era formada ou apenas era uma charlatã qualquer, provavelmente não era já que ela era conveniada com planos de saúde, mas enfim ainda ficou minhas dúvidas.
O aparecimento de Trevor nos últimos capítulos não é de me espantar e muito menos de me frustar, nossa querida sempre teve uma dependência nele e era nítido isso, o que mais me incomodou foi o relativismo que a autora deu aos abusos que ele cometia com a personagem, fora isso é de extrema compreensão tudo que se deu até ela entrar em uma hibernação de fato. Trevor é o verdadeiro retrato do homem hétero cis normativo padrão que só pensa no seu próprio prazer e esquece do outro lado da moeda, extremamente abusivo e um tanto quanto tóxico, venhamos e convenhamos o cara é o esteriótipo perfeito de homens com ego que precisa ser massageado a cada infelicidade.
Por fim, eu consigo realmente enteder tudo que a personagem queria passar, de fato ela vivia em um ápice de depressão com um misto de ansiedade e entendo também tudo que a levou a passar por um ano de descanso e relaxamento, que no fim foi algo que realmente a mudou, a fez ser alguém com pensamentos e hábitos melhores, conseguir finalmente viver uma vida plena e talvez prazerosa.
Eu não sei se Otessa teve a intenção de passar a mensagem sobre superar seus traumas em algum momento ou viver APESAR dos traumas, mas essa foi a mensagem que ela me passou, a personagem acima de tudo tinha traumas a serem superados, coisas consigo mesma a serem resolvidas, encerrar aquilo que já não lhe cabia mais e ela realmente o fez.
As reflexões que esse livro me trouxe em um todo, os pensamentos que vagaram e me deixaram em devaneio por algumas horas, foram realmente espetacular, a forma como o devaneio sobre o sacrifício do velho para surgir algo novo é realmente algo visceral, provavelmente se eu tivesse lido esse livro anos atrás eu acharia uma completa coisa sem sentindo e uma grande perca de tempo, no entanto, hoje acho que esse livro foi de um grande divisor de águas para algumas vivências minhas.
Apesar de não ficar uma minoria sobre minoria, Otessa ainda sim conseguiu escrever um livro com maestria e digno de ser lido.
Tenho que abrir um único adendo: A aparição de 111 vezes de nome de remédios psicotepeuticos, psicodélicos, antilaucinogeno e psicotrópicos chega ser estupidamente incrível.
Devo avisar também que é pertubador o fato de NUNCA sabermos o nome da protagonista, o que de uma forma me irritou um pouco!
O único perigo desse livro é a questão da mistura de TANTOS remédios, fora isso tá tudo bem !)