Cindy 12/10/2018
Pior mocinha da história da literatura ocidental...
De acordo com os elogios descritos na sinopse, o livro é recomendado "para os fãs de A Rainha Vermelha e de Sansa Stark, de Game of Thrones"; para "os fãs das séries A seleção e Jogos vorazes (que) vão adorar a jornada da princesa Theodosia, com seus aliados inesperados e ousados planos de fuga". Também é classificado, pela autora Virginia Boecker, como "a história de uma princesa enfraquecida porém implacável incitando uma rebelião" e "um toque inteligente e feminista ao conto tradicional da heroína derrotada". Sério mesmo?! Então vamos lá...
Os fãs de A Rainha Vermelha que curtiram a reviravolta pra pior (que me fez até descontinuar a leitura da série de tanta raiva) no livro 3 - quando a mocinha se transforma numa fraca, covarde, submissa - realmente vão adorar esse livro do início ao fim. Theodosia é simplesmente a personagem mais fraca, covarde, submissa, egoísta, irritante, idiota e sem personalidade da história da literatura ocidental. Eu tomei tanto nojo dessa personagem e das atitudes dela que é até difícil encontrar palavras para descrevê-la - talvez "verme rastejante de esgoto" chegue perto. Alguém vai dizer "coitada, ela sofreu pra caramba". Pois é, "sofreu" é um eufemismo, ela foi praticamente martirizada em um calvário interminável e revoltante de padecimentos durante todo o livro. "Mas nem assim você sentiu pena dela?" - alguém poderia perguntar. Senti, muita pena. Entretanto, no decorrer da narrativa, com tantas demonstrações de fraqueza, covardia, egoísmo, submissão, falta de honra e de caráter da parte dela, só consegui sentir raiva, revolta e vontade de abandonar o livro. Ela fica lá apanhando de cabecinha baixa, agradecendo sorridente pelas surras e humilhações e pensando "nossa eu queria matar o rei de forma brutal - ele me chicoteia e humilha há 10 anos, escravizou e matou meu povo - mas vou me rastejar pelo chão sorridente e fingir que está tudo bem, esta vai ser minha maior rebeldia, uau!" ou "nossa, eu queria ter coragem de matar o general de forma brutal - ele matou minha mãe na minha frente, matou e escravizou meu povo - mas vou cumprimentá-lo sorridente como se nada tivesse acontecido e ser a melhor amiga da filha dele, ela me trata feito uma criada e tá cagando pro meu sofrimento, mas sei que ela é boa e me adora". Várias pessoas morrem e são torturadas por causa dela - por sua fraqueza, covardia e egoísmo - que só pensa em preservar a própria vida. E tudo isso pra quê? Pra continuar sendo espancada, chicoteada e humilhada por mais uns 50 ou 60 anos?
Não sei por que motivo os fãs de Jogos Vorazes iriam adorar essa leitura, refleti muito sobre isso, mas não consegui entender. O mesmo vale para os fãs de A Seleção - será que é por que o príncipe tem um crush por ela? Aliás, o príncipe Søren é a versão 2.0 plus do Dorian de Trono de Vidro - com mais medo do pai, mais covarde, mais submisso e ainda mais mosca-morta. Além disso, nosso "valente e generoso" herói, não tem o menor peso na consciência por escravizar pessoas inocentes, roubar seus bens, torturá-las e matá-las - e isso porque, ao contrário do pai tirano, a autora dá a entender - e a mocinha também - que ele é "uma boa pessoa". Sério?! Você que tem um crush por uma garota iria assisti-la ser espancada, chicoteada, humilhada - quase diariamente durante 10 anos! - e ficaria sorrindo, com cara de paisagem e fingindo que nada de anormal estava acontecendo?! Depois de uma sessão de humilhações e espancamentos particularmente brutal, acharia uma ótima ideia convidá-la pra almoçar ou jantar e falar sobre futilidades?! Pois é, né...
Finalizando, vamos analisar a opinião de Virginia Boecker (autora de A Caçadora de Bruxos) sobre este livro. Se pudesse colocar uns emoticons nessa resenha, agora era o momento de encher de carinhas gargalhando a ponto de sair lágrimas dos olhos:
1) "A história de uma princesa enfraquecida porém implacável incitando uma rebelião". Oi, "implacável"?! Com certeza não lemos o mesmo livro ou ela nem sequer o leu - o que é mais provável - e emitiu essa opinião favorável pra agradar a autora/editora. Nossa heroína é esculhambada e espancada o livro inteiro, por todo mundo, e qual é a sua "implacável" reação? Abaixar a cabeça, colocar um sorriso fake na cara suja de cinzas, e simplesmente assistir impassível à tortura e execução de mais alguns compatriotas...
2) "Um toque inteligente e feminista ao conto tradicional da heroína derrotada". Só queria saber onde - pelo amor de Deus - está o "empoderamento feminino" neste livro? Em uma mocinha que é espancada e humilhada das formas mais abjetas, por 10 anos, cuja "rebeldia" e "firmeza de caráter" consistem em abaixar a cabeça e se submeter ao jugo dos homens - e seguir sendo achincalhada com um sorriso no rosto e um olhar sereno? Por que ela não toma alguma atitude, por que não enfia um garfo, uma faca de manteiga (ou o cabo de uma colher de chá) no olho ou na garganta do rei e/ou do general, enquanto socializa e faz todas as refeições com eles diariamente?! Por que ter medo de morrer rapidamente por um golpe de espada - ou até mesmo enforcada, estripada e esquartejada que nem o William Wallace, que seja - pra ficar sofrendo torturas e humilhações eternamente? Que vida é essa, gente?! Não é preferível reagir, morrer com honra (e, de quebra, ainda levar algum vilão com ela) em vez disso? Mas não, melhor aceitar tudo passivamente e aguardar por um milagre, por um homem forte e corajoso pra salvá-la...
Por mais que a gente fique com pena da Theodosia, por ser a vítima e por todo seu sofrimento e tal, não dá pra gostar dela. Ela é covarde e egoísta demais - só pensa em preservar a própria vida - e não move um dedo sequer pra ajudar pessoas que se arriscam por ela e, quase sempre, acabam torturadas ou mortas. E, além disso, ela tem uma atitude simplesmente abjeta e revoltante, logo no início do livro, em relação a uma pessoa, por pura covardia. Ao ler um livro de fantasia, esperamos encontrar mocinhos (ou mocinhas) fortes, corajosos, solidários, capazes de arriscar suas vidas por seu povo ou por um ideal de liberdade/justiça. É claro que ninguém espera uma pessoa totalmente maravilhosa, sem defeitos, mas essa Theodosia, francamente... Além de covarde, sem honra - algo muito incomum em uma princesa e heroína de livros de fantasia - e egoísta, ela não tem personalidade, não sabe o que quer da vida, leva uma eternidade pra tomar uma decisão e, quando toma, é sempre a pior possível. Acho até que, pra equilibrar tantos defeitos que nos fariam detestá-la, a autora fez dela uma vítima tremendamente sofrida, na tentativa de conquistar nossa empatia. Pra mim não funcionou. Eu realmente senti muita pena e empatia por ela, enquanto vítima. Entretanto, eu não posso tolerar a falta de caráter, covardia e fraqueza - não em uma heroína, não em alguém que pretende se tornar governante e líder de um povo.
Por essas e outras, eu sempre digo que, na maioria das vezes, as comparações com filmes e séries da moda e elogios de autores conhecidos na sinopse de um livro podem até ajudar a vendê-lo, mas acabam derrubando as avaliações dos leitores pelas expectativas que criam. Lógico que estou me referindo ao leitor que, como eu, comprou o livro (no meu caso, o ebook) e não ao que ganhou o livro de graça pra fazer merchandising - esse, geralmente, nunca avalia o livro com menos de 4 estrelas, não importa o quão ruim ele seja. E olha que eu ainda estou sendo legal ao dar 2 estrelas pra esse livro, mas faço isso somente porque - apesar da raiva e revolta que senti e tornaram a leitura um verdadeiro tormento para mim - consegui terminá-lo.