Henggo 08/11/2022
Uma Master Class de humanidade
Eu era bem criança, 8, 9 anos, não sei, quando li "Antes do Baile Verde" na escola, livro paradidático, obrigação. O conto estava na antologia "Para gostar de ler". Depois de Lygia, compreendi esse prazer. Não parei mais. Foi um torpor ali, tenra idade, infância, mergulho na realidade da vida-morte, festa-obrigação, velório-Carnaval. Tenho certeza de que naquela leitura algo mudou ? não a toa, quando penso em qual foi o primeiro impulso para escrever, nadar em palavras, brincar com entrelinhas, eu aporto em "Antes do Baile Verde".
Esta antologia não é necessariamente completa. Porém, é um estudo maravilhoso da grandiosidade de uma autora que soube ler sutilezas da loucura que é viver. Lygia destrincha, escalpela, escama, fatia, desossa, mastiga, vomita a vida que está ali, diante de nós, mas não vemos.
É autora que enxerga e vê, escuta e ouve, abraça e sente. Junta palavras, tempera com pontuações, muda tudo, corta frases, muda narradores, sobe e desce no aviltante da humanidade; encanta com uma vírgula, faz chorar com um ponto final.
Ler estes contos foi um processo longo, por vezes cansativo (confesso). Mas a cada término eu ficava ali, parado, em silêncio, degustando, afogando-me, resfolegando. Ler Lygia Fagundes Telles é ler o mundo, a sociedade, a vida; é ler a si e descobrir-se pedaço.
"Os Contos" clama para que larguemos de nossas certezas de sermos inteiros e aceitemos que precisamos juntar cacos para sentir o que é a fragilidade do existir.
Lygia sufoca feito espelho que grita verdades mudas. Ouçamos.