Ana Sá 26/03/2024
O silêncio estridente de Alicia Berenson
Eu estava em busca de um livro que me distraísse sem precisar ser bobo. O o livro que eu procurava poderia até ter cenas fortes ou abordar questões pesadas, mas o importante é que, no geral, ele me desse aquela sensação boa de não querer parar de ler. Após algumas tentativas frustradas entre os títulos mais vendidos da Amazon, acabei sendo sequestrada por "A paciente silenciosa" (2019), de Alex Michaelides... Pensa numa história que me fisgou!
Eu não sou leitora de thrillers, sou apenas leitora. Uma leitora que foi seduzida, do começo ao fim, pelos desdobramentos do silêncio radical adotado pela pintora Alicia após ser acusada do assassinato brutal de seu marido. Depois de ser pega em flagrante, inerte diante da cena do crime, Alicia opta por se calar e acaba internada numa clínica psiquiátrica. Nos resta então, de um lado, fragmentos de seu diário pessoal e, de outro, a perspectiva do psicoterapeuta Theo, que vê no caso de Alicia um desafio pessoal e profissional. É ele quem conduz uma investigação que soma muitas personagens à narrativa, nem todas relevantes à trama, mas todas minimamente curiosas.
Pro meu azar, eu desfiz o mistério rápido. Percebi logo pra onde o desfecho caminharia, então o final não foi tão surpreendente assim. Mas livros são feitos para serem lidos, e não "adivinhados", então isso não diminuiu os bons momentos que passei com "A paciente silenciosa". Envolvente, bem estruturado... Gostei do modo como a profissão de Alicia é costurada à trama. Gostei de detestar a personalidade do psicoterapeuta. Gostei do número excessivo de personagens estranhas. Gostei da transição constante entre diário e personagem-narrador, mas...
[ALERTA: a partir daqui eu posso ferir os olhos de pessoas muito sensíveis a SPOILERS!]
Mas... o livro tem algumas falhas (não graves) de estrutura, principalmente se a gente reler as passagens do Theo (bom, esse foi um pano fácil de passar!). Tem também elementos meio clichês, sendo que, acerca disso, sofri de um incômodo um pouco maior: na minha desumilde opinião, a relevância que é dada à questão do trauma infantil ocasionado pelo desprezo do pai de Alicia - e sobretudo o modo como esse aspecto ganha protagonismo na história - acaba por funcionar, a meu ver, como um clichê freudiano mal jogado (estou falando de tudo que envolve a cena vista do telhado após a morte da mãe de Alicia e o caminho que leva Theo até essa informação). Pra mim, ficou muito "chama o tio Freud aí que ele resolve", sendo que a narrativa, naquela altura, merecia uma justificativa/ uma liga mais elaborada. Enfim, minha experiência de leitura foi boa, mas com uma dose de frustração causada por uma simplificação de narrativa que considerei exagerada!
Registradas as ressalvas inevitáveis, o que fica nas minhas memórias a partir daqui são os inquietantes e igualmente ótimos momentos que passei imersa no silêncio estridente de Alicia Berenson. Gostei!