Itamara 11/05/2021"Mas eu só quero não me sentir a única de peito aberto "Primeiro contato que tive com Jarid Arraes e já posso dizer que foi uma experiência que há muito não sentia. Quem sabe essa seja uma das maiores vantagens da literatura contemporânea, a de criar um senso de pertencimento tão claro que a gente se vê facilmente dentro das histórias. Além da escrita ser bem envolvente, linguagem atual e cheia de regionalismos (que eu particularmente amo), o que me chamou atenção foi o protagonismo feminino, já que todas as personagens principais dos contos são mulheres nas suas mais diversas possibilidades. As conversas da calçada, o primeiro amor que mora na mesma rua, a hora sagrada da novela, os vizinhos fofoqueiros, o marido agressor que vive infernizando a vida da esposa, as beatas da igreja, a devoção aos santos...tudo isso somado à abordagem de temáticas que poderiam ter tomado um rumo clichê ou superficial (como violência doméstica, homofobia, solidão na velhice, violência sexual, a dor do luto, preconceito de gênero, entre outros), mas que na verdade , por meio das metáforas, nos fazem refletir sobre nós mesmos, nosso cotidiano e o quanto certas coisas comuns da infância e adolescência acabaram influenciando nosso presente e muitos "e se" vão surgindo ao longo da leitura. Certamente será um livro a ser trabalhado com meus alunos do ensino médio.
Difícil escolher o preferido, mas sensível como sou, escolho os que me fizeram chorar ou mais me emocionaram:
"Telhado quebrado com gente morando dentro";
"Bordado em branco";
"Marrom-escuro, marrom-claro";
"Amor com cabeça de oito";
"Gilete para peito";
"Voz";
"Gesso";
"Nheim nheim"
"Novo elemento"
"Como é ruim cair num buraco";
"Havia uma segurança na mesmice, uma certeza de que tudo ficaria exatamente como estava. A solidão valia a pena, espantava os parentes, mantinha a casa limpa e não desagradava a Deus. O que mais podia desejar?"