Helena 03/09/2020Obras-primas do gótico e do terror brasileiroPor que duvidar que os gêneros de horror e gótico nacionais nunca existiram e somente valorizar os produtos de entretenimento do exterior? Sendo que o Brasil é formado por um povo naturalmente criativo, com bagagem cultural de diversas histórias de assombrações e seres fantásticos. Essa caprichosa coletânea de contos permite uma quebra de preconceito para todos aqueles que acham que literatura clássica brasileira (sim, alguns nomes são autores que estudamos na escola!) não consegue nos divertir com contos de terror (sobrenatural ou psicológico) de qualidade! Os contos são obras de consagrados escritores da Academia Brasileiro de Letras. Há histórias urbanas, bizarras e inquietantes ambientadas em grandes capitais, tais como Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Mas há também aqueles de ambientação regionalista, nos sertões de Goiás e Minas Gerais, interiores brasileiros: lendas populares e fábulas assombradas narradas por sertanejos. São vários bons autores trazidos pelo livro! Aqui destaco:
- Ilustre Machado de Assis. Ler e interpretar seus contos sem uma ?ajudinha? extra, por causa da linguagem, se fez como um desafio para mim. Difícil sim, mas muito prazeroso quando se entende o que ele escreveu, o que quis denunciar e revelar de nossa sociedade. Mais uma vez, o gênero do terror como um retrato cruel do que há de pior em nossa sociedade - indo além do sobrenatural. O macabro vem dos terrores da escravidão, dos vícios, do sadismo, entre outros exemplos.
- Júlia Lopes de Almeida virou minha queridinha. Ela traz o protagonismo feminino em seus contos imersivos e ricos em detalhes, alguns de natureza sinestésica. São ?terrores femininos? com dinâmica envolvente, capazes de te fazer sentir os medos e dores daquelas mulheres: exigências sociais descabidas, abusos, relacionamentos tóxicos, maternidade doentia, etc.
- Álvares de Azevedo, considerado o expoente do gótico brasileiro, com seu mórbido ?Noite na Taverna?. Além de narrar aventuras de amor e morte (mortes romantizadas dignas de um bom gótico!), há referências a suicídio, homicídio, necrofilia, canibalismo, infanticídio, incesto, aborto, e mais! Tudo isso escrito daquela forma exagerada e rebuscada típica da escola do Romantismo. Mas eu adoro haha. Álvares trata de temas considerados imorais, transgressores e monstruosos da sociedade... se ainda hoje seria uma narrativa chocante, imagine como deve ter sido em 1855!
- Novos escritores que desconhecia. Coelho Neto, João do Rio e Humberto de Campos foram deliciosas e maravilhosas surpresas!