kellen.ssb 05/10/2019
“Macaco senta no próprio rabo para falar mal do rabo dos outros”
A "confusão" em torno do livro do Janot aguçou a minha curiosidade em lê-lo. O pedido feito pelos procuradores do MP para que o livro de Janot fosse apreendido foi o estopim para que a minha curiosidade chegasse a níveis estratosféricos rsrsrs e comprasse o livro.
Foram muitas as críticas negativas e positivas que já li acerca do livro e do seu autor. De louco ressentido a corajoso; de um cara com a consciência pesada - tentando "corrigir" erros do passado - a um cara capaz de falar qualquer coisa para promover seu livro. Várias foram as subjetivações feitas à pessoa do Janot após a divulgação do seu livro. Mas aqui nesse espaço eu me limitarei a avaliar O LIVRO.
Para quem assiste o mínimo de TV, principalmente jornais de emissoras abertas, ou lê as reportagens veiculadas pela grande mídia se sentirá super familiarizado com os personagens e com o conteúdo. Desde alguns anos somos bombardeados por informações da Lava Jato na grande mídia. Os políticos brasileiros tomaram o lugar dos jogadores de futebol nas conversas populares. E ciente disso, Janot aborda em seu livro várias polêmicas noticiadas pela mídia. Explica por que muitas vezes alguns processos foram arquivados e outros não. Se questiona algumas vezes acerca da influência da mídia no andamento da operação Lava Jato. Aborda o jogo político em torno da corrupção. Quando a Lava Jato começou muitos políticos acreditaram que a operação não chegaria a eles, e se aproveitaram da Lava Jato para fazer discursos morais. Até que a operação os atingiu. Nesse contexto, Janot afirma:
"A partir daquele momento, punha-se fim à tática de alguns grupos políticos de esconder as próprias mazelas e gritar pela moralidade no quintal dos adversários. “Macaco senta no próprio rabo para falar mal do rabo dos outros” era a frase antiga da minha mãe que vinha à minha cabeça quando, já sabendo da generalização dos desvios, assistia, de longe, à pantomima de alguns políticos contra outros. Ora, nada mais repulsivo que um corrupto fazer discurso contra a corrupção alheia."
O que talvez incomoda a classe política é que em seu livro Janot aborda cada personagem com o seu devido nome. Foi dado nome a todos os "bois" rsrs Fiquei pasma na parte que ele aborda as visitas dos políticos ao seu gabinete. Cada um apresentava atitudes diferentes para tentar resolver a sua situação: desde presentes e promessas a cartas, choros - literalmente choro - e ameaças. Uma cartinha encerrada com "My life in your hands", enviada pelo senador Aécio Neves, está até hoje guardada com Janot:
"Li a carta, um texto escrito à mão, e a guardei como um documento. Talvez ao longo da história isso diga algo sobre o tamanho de alguns dos nossos homens públicos".
Bom, se eu continuar escrevendo eu não vou parar. Enfim, gostei demais do livro. Fluido, interessante e muito fácil de ler. Indico! É lógico que se trata de uma história contada pelo ponto de vista do ex Procurador Geral da República. Então, para aqueles apaixonados por políticos - e não por política - o livro pode soar "esquerdista" ou "direitista" etc. Mas se a pessoa não tem essa neura, super indico a leitura. É legal ver os bastidores da PGR sob a ótica de um ex PGR, que vale dizer, é um ser humano como qualquer outro, que, embora tenha lutado para que as suas paixões não prevalecessem, tem paixão.
Ah! Compreendi por que os procuradores do MP solicitaram a apreensão do livro do Janot. Em um dado trecho ele nos leva a refletir a relação da Rede Globo com a Lava Jato de Curitiba. E em outro momento ele se questiona se realmente não houve uma atuação política da Lava Jato em Curitiba:
"Segundo ele, Souza disse que a intenção da força-tarefa era “horizontalizar para chegar logo lá na frente”, e não “verticalizar” as investigações, e que, por isso, teríamos dificuldade em fundamentar os pedidos de inquérito. O que seria “horizontalizar para chegar logo lá na frente”? Não entendi direito o conceito. Creio que meus colegas também não. Só depois de muito tempo, quando vi Sergio Moro viajando ao Rio de Janeiro para aceitar o convite para ser o ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro, é que me veio de novo à cabeça aquela expressão. Horizontalizar implicaria uma investigação com foco num determinado resultado? Eu não quis imaginar isso lá atrás e também não quero me esticar nesse assunto agora, mas isso ainda me incomoda um bocado, sobretudo quando penso em dois episódios separados no tempo, mas muito parecidos. Estou falando dos vazamentos de trechos de depoimentos de Youssef e do ex-ministro Antonio Palocci na reta final das eleições presidenciais de 2014 e 2018, respectivamente."