Mariana 02/05/2012S. Meyer - A HospedeiraStephenie Meyer é uma escritora de romance, isso não se pode negar, mas a pegada científica que ela conseguiu nesse livro foi incrível. Invejável, eu diria. Ela conseguiu dar uma lição nos humanos ao mesmo tempo em que agradava a um pedaço da sociedade que gosta do tema ufológico com a introdução das Almas na trama. Almas são seres parasitas que dominaram o corpo dos humanos com o intuito de salvar a Terra. Claro que diante dessa atitude surgem muitos pontos de vista e lados da história. É difícil conseguir entender os dois lados, dos humanos e das almas, porque o livro narrado em primeira pessoa dificulta a visão geral, mas aí é que entra uma boa sacada de Meyer.
Peregrina é uma alma deslocada, que já viveu em muitos hospedeiros sem nunca ter encontrado um lugar onde quisesse realmente permanecer por mais de uma geração. Melanie é uma humana destemida, que tem o intuito de sobreviver a mais nova ameaça. Eis que Melanie é capturada pelos buscadores de rebeldes e Peregrina é inserida em seu corpo, tendo como missão encontrar outros rebeldes. Peregrina espera uma total liberdade dentro da mente de Melanie, mas esta se recusa a desaparecer e permanece intacta dentro da mente que agora, aparentemente, é de Peregrina. Melanie consegue desvirtuar a atenção de Peregrina quanto à localização dos rebeldes introduzindo imagens de Jared, o homem que ama, assim estreitando a relação das duas e fazendo com que Peregrina se sinta atraída pelo homem também.
A grande sacada não se resume a relação amorosa, embora seja por esse aspecto que os fóruns sobre o livro se mantenham, mas sim na relação humano-extraterrestre e a dupla visão da dominação das Almas. Eu explico: Assim que Peregrina começa a sentir que Melanie ainda está ali, começa a relação de amizade e de confidência das duas. É onde Melanie comete o erro de deixar Peregrina impressionada com Jared. As duas conversam, trocam confidências, mas Melanie nunca mostrando mais do que devia.
Aos poucos, elas vão construindo uma amizade onde uma se preocupa com o bem estar da outra. A dupla visão da invasão das Almas se entrelaça nesse aspecto por entre conversas e reflexões das duas protagonistas. Cada uma defende seu ponto de vista e o que é mais impressionante é que Peregrina vence na maior parte do tempo usando de argumentos que nós usamos quando em conversas boêmias sobre a sociedade, porém ela é convencida com o caso isolado de Melanie. Talvez por tê-la muito próxima. Melanie apenas pensa e anseia a companhia de Jared e de seu irmão mais novo, Jamie.
A Hospedeira fala sobre amor. Mas fala sobre um amor que não é exatamente carnal. Fala sobre uma amizade, que não deixa de ser amor, construída pela convivência de Peregrina e Melanie. E fala sobre um imenso amor fraternal de Melanie por Jamie, que é o que move a humana a voltar aos rebeldes. Acaba que esse anseio de Melanie é atendido e Peregrina parte em busca do esconderijo que, anteriormente, o tio de Melanie havia indicado. As duas se aventuram pelo deserto e logo depois chegam à montanha onde mais ou menos quarenta humanos vivem escondidos, entre eles Jared e Jamie.
É claro que as coisas não ficam tão bem quanto deveriam ficar, já que é Peregrina quem controla o corpo de Melanie e a relação dos rebeldes com a Alma não é muito amigável. O que faz com que Peregrina, aos poucos conquiste amigos e ganhe o apelido de Peg é o fato de que Melanie ainda vive dentro dela. Peg ainda ganha um admirador que aos poucos conquista, em sua cabeça, o espaço que Melanie insistia em preencher com lembranças de Jared. Aí é que nós percebemos que as desavenças e o quarteto amoroso com apenas três corpos é iniciado.
Discordo da contracapa do livro quando este diz que ali acontece um triângulo amoroso com apenas dois corpos. Peg nunca amou Jared, apenas sentia aquilo que Melanie sentia por ele, afinal aquele era um corpo que queria Jared e dentro dela ainda vivia a mente de uma humana que queria Jared. Acredito que ali existia um quarteto amoroso com três corpos. Ian é um personagem que não pode ser ignorado, nesse aspecto concordo com Stephenie Meyer quando esta divulgou este pensamento. Ele tem uma forte presença e podemos perceber que Peg se sente abalada quando este está por perto, mesmo que quando tocada por ele, sempre o compara com Jared.
Eu não encarei a leitura desse livro como um romance propriamente dito, porque o romance entre Melanie e Jared ou de Peregrina e Ian mal acontece. É apenas ensaiado, no caso do segundo casal, enquanto que o outro já está consumado. É mais uma história de busca e descobrimento. Busca por um lar e por companhia, enquanto busca completar a si mesmo, isso em ambas as personagens principais, já que Melanie queria voltar para casa e Peregrina queria encontrar uma casa. Eis que Peg acaba conquistando a maioria dos humanos e ali vemos qual a relação que Peg fazia dos humanos antes de chegar à Terra e realmente conhecê-los.
Os humanos eram julgados pelas almas como sendo extremamente violentos e sem amor nenhum pela terra na qual viviam. Para os humanos, as Almas eram seres sem sentimentos e que apenas se preocupavam em se hospedar. A característica em ambas as espécies era generalizada. Nisso podemos aplicar algumas teses de pensadores quando estes dizem que o estranhamento nos faz generalizar uma característica e temer aquilo que vem de fora. Peg é extremamente temida quando está em solo humano, assim como Melanie era temida quando em solo das Almas.
A Hospedeira promete uma continuação, até porque terminar o livro do jeito que terminou era pedir uma revolução por parte dos leitores. Ainda não há confirmação de datas e muito menos confirmação de que a autora está realmente trabalhando nisso. Eu, sinceramente, espero que ela continue e que não se perca no meio do caminho como aconteceu com a Saga Crepúsculo, porque A Hospedeira é realmente uma boa história e que merece ser trabalhada sem pressa e com muita análise social e teórica ao redor das relações humanas (ou não), pois é exatamente essa a principal pegada dessa trama: as relações humanas (ou não) acima de qualquer aspecto racial ou origem planetária.