Fran 04/06/2021
Destruidor de Mundos é dono de uma premissa que promete muito, e tentou apostar nisso seu sucesso ― uma fantasia de modelo mais clássico, com longas viagens, batalhas épicas, personagens marcantes e uma história repleta de reviravoltas. Embora aborde muito bem alguns desses itens, outros acabam não passando de um rascunho pouco aproveitado.
Seu ponto alto é, sem qualquer dúvida, a construção do mundo. Embora passemos por uma grande variedade de locais durante a história, ainda é apenas uma pequena fração de todo o universo dela. Todala é um lugar enorme e muito diverso, até mesmo um pouco confuso no início, e recebe uma atenção proporcional durante o livro ― cada cidade é distinta entre si, e todas são encantadoras por suas particularidades. O mundo dá a impressão de ser vivo, algo extremamente difícil de se conseguir com essa perfeição. Tudo sobre ele é descrito em detalhes, algo tão bom quanto ruim ― para quem gosta, é um elemento atraente, que pode ser considerado chato e cansativo para quem não liga tanto para isso.
O “grupo de bandidos e maltrapilhos”, destaque na sinopse e o foco em quase todo o livro, é bem variado ― e essa variedade é interessante ―, mas nem todos acabam recebendo o mesmo tratamento. Entre eles, temos personagens bem trabalhados, com motivações claras e personalidades notáveis e relevantes (Sorasa Sarn e, em um grau menor, Domacridhan), porém também alguns que são rasos e nada convincentes (Andry Trelland e, infelizmente, a protagonista Corayne an-Amarat), os tornando menos simpáticos ao leitor do que alguns personagens secundários que pouco aparecem. Fora, é claro, os que se juntaram ao bando em uma parte mais avançada da história, e ficaram praticamente esquecidos nela.
Os relacionamentos entre personagens são outra questão controversa. É perceptível a intenção da autora de adicionar romance de uma forma muito sútil, contudo ela faz isso melhor em alguns casos do que em outros ― o começo do romance em que Corayne se envolve, por exemplo, é extremamente bobo e destoante do resto. Fora isso, como um grupo de desconhecidos, o que os une até então é o desejo frágil de salvar a esfera, como é ressaltado o tempo todo, algo que é compreensível e apropriado.
Apesar da descrição de Taristan como um homem sedento por poder e imensamente cruel, pouco vemos do vilão durante o livro. Faz breves aparições, sempre pelo ponto de vista de outros personagens, então não há muito o que sabemos sobre ele até então. Vemos muito mais sobre o outro vilão ― que a história só nos apresenta em um ponto mais adiantado ― pois ele possui seus próprios capítulos, mas também existe pouco a se dizer. Suas ações acabam sendo levemente controversas no começo, e sua motivação é bem unilateral.
O enredo segue a conhecida base da jornada do herói, muito utilizada no passado, mas rara de se ver atualmente (e, consequentemente, mais rara ainda de se ver dando certo). Como a própria Victoria Aveyard disse, Destruidor de Mundos foi escrito com grande inspiração na trilogia O Senhor dos Anéis, e isso é muito evidente em vários momentos, seja nas extensas descrições do mundo (que, no entanto, não são tão excessivas como na obra de Tolkien), nos detalhes do enredo (o “grande vilão” por trás de tudo ser uma força poderosa de essência anormal, um grupo de escolhidos nada adequados acabar com a missão de salvar o mundo), ou na forma como a história se desenvolve de forma lenta.
Esse último ponto citado acaba sendo o pior do livro. Apesar do grande foco em desenvolver o mundo e, em certa medida, os personagens, o mesmo não pode ser dito do enredo em si. As longas viagens e fugas fazem pouco pelo avanço da trama, que fica quase todo por conta da participação dos vilões. A história se arrasta em um ritmo exageradamente lento, até mesmo monótono durante algumas partes, pontuada por poucos e breves momentos de ação ou drama, com algumas reviravoltas um tanto previsíveis.
Apesar de apresentar uma construção geral muito boa, é um livro que acaba entregando muito menos do que se propôs. Ainda assim, não é uma leitura desagradável. Se tratando do primeiro de uma trilogia, resta esperar para ver se a autora saberá aproveitar a base que construiu para desenvolver igualmente o resto de seus elementos em uma história realmente satisfatória.
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