Incidente em Antares

Incidente em Antares Erico Verissimo




Resenhas - Incidente Em Antares


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T.N.T.Rock 13/03/2024

Assombrado com à atualidade da obra.
Em princípio, uma viagem sobre a história do Brasil, fatos históricos como A Guerra dos farrapos, Império, Era Vargas, JK etc, vão sendo retratados tendo a pequena cidade de Antares como centro de disputas políticas, evoluindo de um coronelismo tradicional para o moderno.
A caminhada para o Incidente que dá título a obra parece acontecer a passos curtos, mas é nesse trajeto que vamos conhecer cada aspecto e personagens notáveis da cidade. Quando o fatídico dia em uma sexta-feira 13 de dezembro de 1963, os 7 mortos se levanta de seus caixões, vamos compreender quando eles assombram e apontam a hipocrisia e sujeira que Antares vive.
Os mortos vivos de Antares não vão nos assustar, mas vamos ficar aterrorizados com à atualidade do texto da obra, temas como: conspiracionismo, negacionismo, alienação midiática, conservadorismo, violência política e policial, etc seguem a mesma dinâmica dos nossos dias.
Finalmente, fico bastante surpreso dessa obra ter sido lançada em pleno regime militar, mesmo Veríssimo não tendo poupado críticas a violência do estado bem como a outras esferas sociais. Incidente em Antares apesar de momentos espinhosos, é uma leitura muito divertida e agradável, sem dúvidas, um dos maiores clássicos da nossa literatura.
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Grosman0 21/12/2022

Um livro - não sobretudo mas completamente - político
Érico Veríssimo, eu já sabia que tu era bom pelas minhas aulas de Literatura no 3° ano do ensino médio mas não sabia que tu era bom desse jeito. Desse jeito bem ... consciente de classe.

Incidente em Antares se divide na parte 1 - contexto histórico e formação da cidade de Antares - que é mais chato e massante, o que é o único ponto negativo que vejo, porém é extremamente necessária para a total compreensão do incidente, em si. O autor da uma aula de história ao mesclar a história do Brasil com Antares, com direito a Getúlio Vargas em pessoa interagindo com a burguesia antarense.

Na parte 2 - o incidente - a narrativa me prende e leio veloz as páginas. Queria saber mais sobre o plano dos defuntos e como cada um com sua própria peculiaridade prejudicaria a elite de Antares. Descobrimos a história de mortes de cada um dos sete defuntos e a maioria é extremamente tocante e triste. Tudo fica ainda mais sensível quando lembramos o que viria depois, a ditadura militar.

A obra é uma grande sátira com a burguesia brasileira e nem por isso brinca com a realidade material e crua. Por exemplo, no final do livro quando o incidente já passou, o poderosos de Antares fazem de tudo para esquecer sobre e que os podres revelados sobre eles, caem no esquecimento. Você fica revoltado porque sabe que acontece dessa maneira aqui na vida real.

Prepando as próximas leituras do Érico Veríssimo.
Ligia14 21/12/2022minha estante
Eu quero MUITO ler ele mas acabei dropando na parte do contexto histórico porque me interessei por outro livro, aí deu por isso mesmo e ele ficou abandonado, mas quero retornar a leitura dele e pelo jeito vou ter que ler tudo de novo porque me esqueci KKKKKK


Grosman0 21/12/2022minha estante
A parte do contexto história tem hora que foi terrível mesmo, ainda mais pq eu não tava sabendo identificar que parte da historia do Brasil era aquela especificamente. Mas não desiste não que é mt bom ??


Ligia14 21/12/2022minha estante
Ai amg eu quero muito ler ? adoro livros clássicos, amo uma fofoquinha antiga, já leu o cortiço?


Grosman0 21/12/2022minha estante
Não li pq me soa chato mas daria uma chance sim


Ligia14 21/12/2022minha estante
Eu amei porque é um cortiço cheio de personagem e fofocas, é uma edificação pra uma fofoqueira literária como eu, uma baixaria total

Nota: 5 estrelas


Grosman0 21/12/2022minha estante
KKKKKKK vou ler só pela fofoca então




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rhuancsl 22/01/2022minha estante
sabia que iria gostar hihi




Ka Castoldi 30/04/2009

Passei excelentes momentos com esse livro! Érico veríssimo é sempre genial em seus livros. E "Incidente em Antares" é a exuberancia de todos os ingredientes que existem em suas obras: comédia, politicidade(?), tragédia, e aquele inegável amor ao solo gaúcho. Eterno e inigualável.
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Felipe 20/08/2020

É até difícil falar desse livro de tão incrível e bem escrito que eu achei ele.
Mas bom, é um livro simplesmente onde tudo se encaixa. Coisas que foram se desenrolando ao longo da trama, sendo elas negativas ou positivas (a maioria negativas), voltam com tudo quando acontece o fatídico incidente em Antares. Cidade a qual acontece o mesmo, é muito conservadora por parte de seus moradores, mas que também não deixa de se desenvolver com relação a isso por conta das novas gerações que foram surgindo, com um novo olhar tanto pro âmbito político, que é algo que permeia muito a história toda, como pelo social, onde o caráter das pessoas da cidade vai se revelando aos poucos, tudo correlacionado com o tão marcante acontecimento.
O livro se passa em dois momentos, a Antares antes e depois do incidente. O primeiro momento narrado, trás todo um viés de desenvolvimento da cidade e sobretudo um viés político, que perduraria, porém com os dias contados, até o momento em que se encerra a trama. Ainda nesse ponto, temos na pequena cidade desde de muito tempo, um coronel, patriarca da futura família dos Vacarianos, que comanda a região que está situada a Antares, antes mesmo dela virar uma cidade independente, e receber o atual nome, tirado de uma estrela, mas onde muitos acham que é devido ao território onde se encontra a cidade, ter tido muitas antas. Até que chega na cidade os Campolargo, família que disputaria por décadas o comando da cidade contra os Vacarianos, que em consequência dessa disputa, muitas vidas inocentes foram tiradas sem um justo motivo, a não ser o motivo político de comandar a pequena cidade de Antares.
Ambas as famílias, ao longo dessas décadas, tiveram relações muito próximas com os governadores e até futuros que viriam a ser tornarem presidentes dos ?Estados Unidos do Brasil?, como era chamado o país nas décadas passadas, até a constituição do Brasil ser criada. E em decorrência desse contato muito próximo, os patriarcas dessas duas famílias, em contato com o ilustre Getúlio Vargas, mais conhecido pela era política do Brasil, a qual recebeu seu nome, a ?Era Vargas?, fizeram um acordo de pacificação da qual a grande disputa entre as duas famílias, que já era insustentável para a cidade por conta de seus escândalos, teve um fim que consistente ou não, perdurou até as gerações que tiveram grande parte do papel importante para a história do livro.
Por parte dos Vacarianos, temos Tibério Vacariano, um personagem com muitas camadas e extremamente bem desenvolvido, apesar de ter sido em certo ponto detestável por diversas atitudes tomadas, e além disso, seguindo toda a história da família, era extremamente ambicioso e muito político em tudo que fazia. Por outro lado, os Campolargo, como último patriarca homem da família tinha Zózimo Campolargo, talvez um dos personagens que mais gostei. Ele era bastante alheio a tudo relacionado a política e demais coisas relacionadas a isso, e só queria viver de uma forma que não precisasse se se preocupar tão afincadamente a isso. Também foi um personagem muito bem desenvolvido, e com muitas reflexões trazidas por falas do mesmo em conversação com o próprio Tibério.
Não menos importante, e com certeza a minha parte favorita, o incidente que ocorre na cidade é algo pode não ser nada fora do comum, para a nossa atualidade, mas ao mesmo tempo é. Porque em nenhum momento o autor deixa claro que forma tal acontecimento poderia ter ocorrido, e é um questionamento muito colocado em perguntas que os personagens se fazem um para o outro, e com isso penso eu, que foi algo deixado subentendido, talvez para nós mesmos leitores, pensarmos nas possibilidades de como tal coisa pôde acontecer. O incidente é muito categorizado como um delírio coletivo, o que mais pra frente vai ser usado pelo atual e até mesmo pelo futuro governo da cidade, como uma forma de manipulação, já que é possível notar que o mesmo ocorreu muito próximo do início de uma das mais difíceis fazes enfrentadas pelo Brasil, a ditadura militar, que teve início em 1964, procedendo o incidente que ocorreu em 1963. Ainda sobre a ocorrência, realmente fica difícil dizer se realmente aconteceu, pois após tirar uma foto do ocorrido, o fotógrafo ambulante da cidade se depara com uma fotografia sem nada, apenas com o cenário de tudo. Então faz a gente pensar, porque devido a tal situação, não deveria ser possível fotografar os envolvidos do incidente?
O incidente trás ainda outro ponto crucial pra narrativa, que eu considero uma completa lavação de roupa suja, pois é nesse momento que tudo de ruim, seja corrupção, extravio de dinheiro, abuso de poder, adultério e entre outros, é exposto a todos os presentes. E quando ouvido os próprios atos ilícitos, os personagens não deixam de se preocupar com tudo que está sendo dito, como tudo terá de alguma forma, consequências. Porém não por completo.
Enfim, é um livro com várias camadas, difícil enxergar todas elas, um livro muito impactante, que trás suas personagens como seres humanos reais, que podem ser tão podres por dentro como podem ser bons. Sem dúvida em questão de representação humana, esse foi um dos mais fiel, pra tal coisa, e chega a ser inacreditável o quão bem o autor descreve tudo que se passa na cabeça e o que torna-se atitude das personagens. O mais incrível é como termina tudo, a última página da história. Da até certa agonia, pois apesar de ser um livro ficcional, retrata tão bem a realidade que é até certo ponto muito angustiante ler o livro como uma ficção, embora seja a realidade do próprio país onde moramos. Um livro bastante necessário, e mais atual do que nunca, principalmente no atual cenário da qual temos vivido ultimamente. Recomendo muito, pra todo mundo a leitura.
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Rafaela 16/08/2020

"[...] depois dessas transfusões todas, quando o sangue que me corre nas veias não é mais o meu velho sangue, mas o de centenas de doadores... acho que muitas outras pessoas, que nunca vi, estão falando agora pela minha boca..." (p. 104)

"A progressão social repousa essencialmente sobre a morte. Os vivos são sempre e cada vez mais governados pelos mortos." (P. 312)

"[...] se por um lado o homem jamais se habitua à idéia da própria morte, por outro aceita sempre, e com admirável facilidade, a morte alheia." (P. 327)
Alê | @alexandrejjr 25/08/2020minha estante
Destacasse trechos incríveis, Rafaela! Que livro maravilhoso, chê!




Ana 11/10/2020

Favoritos
Esse livro vai entrar para os meus favoritos. Recomendo ardentemente. Ele é engraçado, triste, sério, inteligente e muito real. Ele é feito de Brasil mesmo. Gostei muito da história, a parte fantástica não deixa a desejar. Um livro com defuntos que se levantam, intrigas, traições, fofocas e política, só podia ser maravilhoso. Leiam!
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Daniel 18/06/2012

Uma história que assume muito bem o papel de criticar a podridão da elite que comandava o poder político na primeira metade do século passado. Uma metáfora que continua atual.
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otxjunior 01/10/2012

Incidente em Antares, Érico Veríssimo
Nunca parei para conferir essa moda de protagonizar romances com vampiros, lobisomens, zumbis, monstros marinhos, anjos, demônios e outros seres extraordinários, que parecem dominar qualquer lista de livros juvenis atualmente. Então, foi com surpresa que descobri que o incidente em Antares é provocado por mortos-vivos, que insatisfeitos por não terem sido sepultados, resolvem acertar as contas com os vivos, habitantes deste vilarejo fronteiriço do Rio Grande do Sul.
A primeira parte do livro faz um panorama político da História do Brasil, do período de pré-emancipação até o golpe militar de 1964. Apreendemos os fatos históricos à luz do microuniverso de Antares, do ponto de vista de seus personagens conservadores, liberais, comunistas, fascistas ou estrategicamente indefinidos. Depois do leitor estar familiarizado com o ambiente, surge o incidente do título, onde todos os principais personagens são desconstruídos, as sutilezas são expostas, os segredos são revelados e as máscaras caem.
Com bastante humor (sobretudo, negro), Érico Veríssimo faz uma crítica à sociedade conservadora dominante e à política do coronelismo, representada aqui pela figura comicamente absurda do Coronel Tibério Vacariano. E se esse conto de zumbis em algum momento me assustou, foi por, em pleno século XXI, ter encontrado nessa sátira política algum reflexo em acontecimentos recentes em nosso País!
Arsenio Meira 04/10/2013minha estante
Excelente, Osman. Érico nunca datou. Um dos autores clássicos da nossa literatura. É dignificante e um prazer ler o Érico Verissimo.

E o 'Incidente em Antares' é tão atual quanto (aqui fazendo uma analogia com a realidade) o brutal (des)governo da Rússia, local onde os atuais Czares cospem nas pessoas sem cerimônia alguma. É triste ver "os incidentes" constantes no berço do genial e inesquecível Fiódor Dostoievski...




Luiz Gustavo 13/08/2020

“Incidente em Antares” é dividido em duas partes; na primeira, há uma recontagem da história da fictícia cidade de Antares juntamente com a História do país desde meados do século XIX. Muitos problemas que vemos hoje no Brasil – a dissimulação da realidade, o racismo estrutural, a mesquinharia e as disputas dos “pró-homens” por posses e poder; os conflitos de classe, geracionais e/ou sexuais; entre outros – sempre estiveram presentes em nossa História, e a narrativa deixa isso tão claro que a única reação possível ao leitor é rir nervosamente e ficar se perguntando “como é que pode?”. Antares é uma representação metonímica do Brasil, cuja História está cheia de peripécias políticas e de situações absurdas que nos leva a pensar, como diz uma das personagens, que “nada é sério mesmo neste país”. Na segunda parte do romance, a narrativa se concentra nos acontecimentos fantásticos que se passaram em Antares em 1963, e vemos, além disso, os pensamentos e comportamentos que levariam à ditadura civil-militar. Os conflitos políticos e ideológicos entre os personagens são frequentes e angustiantes de se ler, porque os estamos revivendo intensamente, e há muitas passagens que permitem esse paralelismo do passado com o presente. Além disso, ler “Incidente em Antares” durante a pandemia de covid-19 foi desesperador, pois há um diálogo intertextual muito forte com a obra de Camus. Maria da Glória Bordini aponta, no texto de apresentação do livro, que “a estranha indiferença que assola o romance do existencialista francês – “A peste” – ressoa na naturalidade insólita com que é recebido o extraordinário incidente na praça de Antares”. Esse diálogo só aumenta o nervosismo causado pela leitura, pois estamos, hoje, experienciando dilemas muito semelhantes e tentando dar um sentido ao evento extraordinário de nosso tempo. Da mesma maneira como os personagens do romance são forçados a enfrentar seu passado, seus comportamentos e segredos, estamos hoje sendo compelidos a repensar a forma como vivemos, no mundo todo. Leitura excepcional e providencial!
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Jessé 19/12/2021

Vale a pena ler de novo ?
Ótimo livro,ótima leitura, com muitos detalhes e muito conteúdo...

"Trata-se de um livro que desperta o riso. Não o riso fácil e impostado da falsa euforia, do esquecimento, da alienação, mas o riso - às vezes apenas sorriso - da ironia capaz de perceber, por trás das verdades de fachada, impostas por poderosos de má-fé, a verdade do medo em que eles vivem e a fragilidade de suas imposições. "
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@shaneingrado 30/10/2020

Uma obra de arte
King era meu autor favorito. Daí eu li Érico Veríssimo.
Que obra incrível meus amigos, repleta de ironias e críticas a sociedade burguesa. Mas tudo feito de uma forma tão genial, que mesmo deixando sua crítica explícita e em alguns pontos dizendo qual a intenção da obra, ainda assim foi publicado em meio a censura da ditadura militar.
Quem é gaúcho vai indentificar bem a sociedade interiorana, e quem não é vai aprender muito sobre a nossa cultura.
Mas aviso que a obra é lenta e fala muito sobre política e sobre a história do Brasil. O que pode tornar a leitura maçante para alguns. Mas a escrita do Érico Veríssimo é tão maravilhosa que as páginas voam.
Leitura extremamente necessária, principalmente na época em que vivemos. As vezes olhando para o passado podemos compreender o presente!
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João Moreno 25/09/2020

'Incidente em Antares' ou 'Brasil: uma biografia'?

Sou viciado em redes sociais. Para regular o vício, condicionei o acesso à essa bosta [Twitter] à leitura de um livro. De ontem (24/9) pra hoje (25/9), li quase duzentas páginas de 'Incidente em Antares', de Érico Veríssimo. Óbvio que, para além da tentativa de voltar ao vício, a qualidade do texto, os capítulos curtos e a quantidade de diálogos ajudaram a regular a velocidade com que conduzi a leitura.

Pensei em escrever um longo texto, mas desisti. Por que é tão difícil falar de 'Antares'? Talvez, porque, antes de literatura, trate-se de História do Brasil. 'Antares' é o pretexto de Veríssimo (1988) para narrar a nossa formação social: do colonialismo, que permitiu a formação dos Coronéis [1] (os quais disputaram, a ferro, fogo, tortura e extermínio, o poder e a sua perpetuação. Neste caso, a perpetuação do poder numa uma pequena cidade) até a naturalização de suas condições [de senhores, donos do mundo!] frente às desigualdades geradas perante a concentração do poder político, econômico e territorial.

Sim, é a tal luta de classes, por mais que queiramos classificá-la como "teoria do século XIX", arcaica, démodé etc. 

"– Mas o seu reino acabou – retorquiu o rapaz. – O senhor é um dos últimos representantes do velho coronelismo no Rio Grande do Sul.
Tibério ficou por um instante pensativo, a fumar, e depois murmurou:
– Pode ser. Mas ainda não morri. E enquanto me restar um pingo de vida ninguém me pisa no poncho. Hei de defender as minhas idéias com as armas que tiver.
– Mas que idéias? – provocou-o o neto.
– Não sejas bobo, menino. As minhas idéias são as minhas propriedades, o meu sossego, a minha vida, este crioulo, as coisas que sempre gostei de fazer e, acima de tudo, a minha liberdade. Não vou entregar nada do que é meu a esses comunistas de merda, declarados ou disfarçados.
– E que me diz da liberdade alheia? E do bem-estar dos outros? – perguntou Martim Francisco.
– Ora, professor, que cada qual cuide da sua vida. Quem for mais capaz e mais macho vence. É a lei do mundo. Sempre foi.
– E por quanto tempo o senhor e os de sua classe imaginam que podem manter os seus privilégios?
– Espero morrer antes da vitória da canalha.
– Mas isso que o senhor chama de canalha – observou Martim Francisco – constitui a maioria do povo brasileiro.
– Haja o que houver – disse o velho, piscando um olho – temos um trunfo escondido.
– O Exército?
– Adivinhou. Você não é tão burro como parece" (VERÍSSIMO, 1988, p. 469-470).

Está tudo em 'Antares':

1) a exclusão do povo dos processos decisórios (notem que são poucos os excluídos com voz, na narrativa. Babilônia, a grande favela, por exemplo, é discutida 'por cima'. (E no Brasil real é diferente?);

"– Decaída? Por que não diz logo puta? – Leva a mão em concha ao ouvido. – Creio que ouvi murmúrios do respeitável público, chocado pelo nome “horrível” que acabo de pronunciar. Quatro letrinhas. P-u-t-a. O meu colega Dr. Mirabeau gaba-se de conhecer os quarenta sinônimos que o imortal Rui Barbosa descobriu para prostituta, mas parece não se impressionar com a prostituição propriamente dita. Claro! Vossa moral é puramente verbal. O delegado Pigarço estará sempre pronto a prender como subversivo todo aquele que escrever com realismo sobre as misérias da nossa Babilônia e outros antros de indigência, mas essas favelas propriamente ditas não preocupam a burguesia. Aquilo sobre que ninguém fala ou escreve não existe. Se um espelho reflete um ato e um fato que consideramos escandaloso, quebramos o espelho e voltamos as costas para o ato e o fato, dando a questão como resolvida. Neste país quase todos os problemas políticos, econômicos e sociais são solucionados no papel. Meu caro Dr. Mirabeau, queira ou não queira Vossa ‘Excelência, vai falar agora a puta Erotildes" (VERÍSSIMO, 1988, p. 362).

2) a hipocrisia das classes conservadoras, mais para Juremir Machado, com seu 'Raízes do Conservadorismo Brasileiro', do que as fanfics (sic) escritas por Roger Scruton ("conservadoras, não! Produtoras!");

"– Todos sabem que o Cêl. Tibério é o presidente de honra dos Legionários da Cruz, cujo lema é Deus, Pátria, Família e Propriedade. Ora, as relações de nosso furibundo pró-homem com Deus são só de cumprimento, de longe, apenas um toque de dedo na aba do chapéu. O velho Vacariano não reza, não vai à missa e nem se confessa, e durante toda a sua gloriosa existência teve incontáveis oportunidades de transgredir os dez mandamentos. Pátria? A flor dos Vacarianos ama tanto a sua, que tem passado a vida a lesar os cofres públicos e a mamar nas tetas desta pobre república. Ah, mas com a família o caso é diferente! O Cel. Tibério preza tanto essa instituição, que em vez de uma mulher tem duas: a legítima, que vive no palacete que vemos ali na esquina, e a ilegítima, instalada numa outra casa e numa outra rua. Agora, acima de Deus, acima da Pátria, acima da Família, o nosso Tibério, imperador de Antares, adora a Propriedade, e é capaz de matar e até de arriscar-se a morrer para defender as suas propriedades, aumentãndo-as à custa da propriedade alheia. Daí o seu sagrado horror a qualquer mudança do presente status quo político, econômico e social que tanto lhe convém." (VERÍSSIMO, 1988, p. 355).

3) a violência das autoridades, as quais existem para garantir a lei, a ordem e a propriedade privada dos meios de (re)produção social!;

“– Na minha opinião esta é a hora certa para o golpe – afirmou Tibério.
Quitéria ergueu os olhos para ele:
– Golpe de quem contra quem?
– Das Forças Armadas, para impedir que o Juscelino e o Jango tomem posse!
– Mas se eles foram eleitos pela maioria do povo e reconhecidos pelo Congresso! Estamos numa democracia, homem de Deus!
– Qual democracia! – replicou o Cel. Vacariano.
– Vivemos numa cafajestocracia, isso é que é. Se dependesse de mim, eu puxava na corrente da descarga para toda essa porcaria ir-se cano abaixo (...)
- Mas vocês não compreenderam ainda – replicou – que se não tomarmos o poder agora estamos perdidos? Quem vai governar mesmo no próximo qüinqüênio é o Jango e o maluco do cunhado dele, o Leonel Brizola. Os dois, mancomunados, continuarão manobrando os sindicatos, encorajando as greves, fazendo passar mais e mais leis favoráveis aos seus eleitores e “pelegos”, aumentando o salário mínimo, em suma, estrangulando cada vez mais as classes produtoras. Vamos acabar no socialismo!” (VERÍSSIMO, 1988, p. 94-95).

4) as hierarquias sociais, que se reproduzem, apesar do discurso meritocrático (escondido, mas presente na forma como os privilégios (positivos e negativos) são repassados às mesmas famílias, geração a geração).

"(...) Faça-se justiça ao nosso truculento Cel. Vacariano, pois ele ostenta com naturalidade e coragem cívica o manto antipático do poder discricionário, que herdou de seus ancestrais, dessa estirpe de bandidos, abigeatários e contrabandistas históricos ..." (VERÍSSIMO, 1988, p. 342).

Se na primeira parte a História do país é romanceada através do desenvolvimento da cidade de Antares e de suas personagens, na segunda tem-se uma retomada, rebuscada, é verdade, dos acontecimentos que precederam a Ditadura Militar, a escrita de Veríssimo (1988) passa pelos porões do DOI-CODE à conivência dos jornais com os acontecimentos (se ninguém notícia, obviamente, o fato não existe, na Opinião Pública, não é mesmo Jornal 'A Verdade'?, rs).

Assim, é interessante perceber a adequação da História e da Memória Coletiva aos interesses dos poderes constituídos: como foi possível esconder a mobilização social por melhores condições de trabalho? Esconder os desvios das elites os quais garantem o status quo? A aparição dos mortos? Os desvios da Lei para garantir a Ordem (excludente, mas é claro)? A democracia não democrática?

Dito isso, e eu disse pouco e mal, o maior problema de 'Antares' é a sua atualidade. Quase 50 anos depois (a obra é de 1971), é possível perceber que, de tão atual, fora os "sete mortos", no parágrafo anterior, não saberia dizer se estava me referindo à Antares ou ao Brasil de 2020. Voltando às comparações entre 'Antares' e o Brasil "redemocratizado" (sic), afinal, quem não conhece, hoje, em 2020, uma favela igual à Babilônia ou um Coronel Vacariano? (No meu estado, virou governador!).

Por fim, gostaria de registrar que ganhei o livro em 2015, um presente de aniversário da grandíssima amiga Luana Alves, hoje jornalista, à época universitária. Foi a 'leitura do ônibus' e da espera em filas de banco enquanto resolvia pepinos referentes a projetos culturais patrocinados via Lei de Incentivo. Talvez, se tivesse lido ainda em 2015, não teria aproveitado tanto. Virou favorito.

site: https://literatureseweb.wordpress.com/2020/09/26/incidente-em-antares-ou-brasil-uma-biografia/
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