LeonardoFM 19/01/2024
Um farol aos corações aflitos deste mundo
Que tinta deveria eu escorrer em resenha deste trabalho tão célebre e que por tantas bocas vagou numa incessante coalizão de reverências? Neste ano de Nosso Senhor, 2024, que haverá de inédito e que valha o bico da pena nos sofrimentos e nas lamúrias de Werther, um homem que matamos - sim, matamos - por ter em seu peito mais alma do que cabe na Criação em sua totalidade? Não muito.
Hoje tomamos por garantido o arquétipo do apaixonado louco e infeliz, mas isso nem sempre foi moda, sabe? É anacrônico visitar Wallhelm esperando mais uma história desse tipo quando, em verdade, estamos expectando a primeira de muitas. Os Sofrimentos do Jovem Werther arruinou uma geração inteira de homens? Sim. Mas é inegável que o texto suceda em sua transposição do sentimento inebriante do amor por meio de uma prosa tão minuciosamente poética que eu bem a entregaria a uma raça alienígena sem qualquer entendimento do que é a paixão humana. Ler Os Sofrimento do Jovem Werther é o êxtase da cumplicidade, é ouvir segredos confiados a nós de um homem louco que não podemos ajudar. Não há mão que possamos estender a ele e isso nos mata pouco a pouco também.
É a insanidade do amor destilada num contraste página a página, entre o que há de mais belo no mundo e o que há de mais trágico no coração dos homens. O equilíbrio entre esses dois fatores torna a derrocada de nosso protagonista ainda mais impactante, pois é a beleza de um sentimento rasgando-se para encaixar no mundo que a desdenha. A inevitabilidade do destino de Werther é horrível, como um jardim de rosas e orquídeas pisoteado pela realidade, ou um casaco de bebê foca.
Como a escrita demanda muito emocionalmente do leitor, e minha leitura é naturalmente fragmentada entre os intervalos que roubo para mim mesmo na hora de levantar da cadeira do trabalho e ir ao banheiro ou beber café, não posso sempre ser um bom ouvinte às carências de Werther, e quando você não foca o suficiente para calçar os sapatos infinitamente sôfregos de nossos protagonistas românticos, inevitavelmente cenas passaram a mesma novelidade canastrona do primeiro parágrafo desta resenha. Desculpa que eu não tenha estado sempre lá para seus sofrimentos, jovem Werther.