Queria Estar Lendo 04/12/2021
Resenha: O Encanto dos Corvos
Mais um lançamento divino da Editora Literalize chegou em cortesia aqui pra gente. O Encanto dos Corvos, da autora Margaret Rogerson, encanta pela narrativa e pelo universo mágico. A parte principal, no entanto, está nos personagens. São poucos, mas são extremamente bem desenvolvidos e constroem a atmosfera fantástica da melhor maneira possível.
Isobel é uma pintora - a melhor da cidadezinha onde vive, quiçá do reino Excêntrico. Sua realidade se divide com a do povo feérico, que vem para as redondezas em busca de coisas feitas pelos mais talentosos. Eles não possuem o cuidado ou a alma humana necessária para criar as coisas, e trocam encantamentos pelo Ofício.
Isobel, com seu talento, recebe as fadas em sua casa e pinta seus retratos em troca dos pagamentos mágicos. Até que o príncipe da corte do outono aparece e, sem querer, Isobel retrata emoção nos olhos da pintura. Mostra sua vulnerabilidade e, para o príncipe, algo que pode custar seu trono e até sua vida.
Levada ao mundo dos féericos para um julgamento, Isobel acaba tropeçando - quase literalmente -, na realidade mágica e em tudo que o mundo deles oferece. Toda a liberdade, mas também toda a prisão e a sensação de que coisas belas podem esconder segredos terríveis.
Com tradução de Sofia Soter, O Encanto dos Corvos é um livro simples. E por isso tão magnífico. Estabelece sua realidade e seus personagens e conta uma história de amor e aventura que vale a pena acompanhar.
Tem uma riqueza de detalhes que já havia sido vista em O Feitiço dos Espinhos - publicado aqui pela Literalize também - e que encanta pela maneira rica com que a autora tece tais detalhes na trama.
"A capacidade de sentir é uma força, não uma fraqueza."
Toda a apresentação de mundo é fascinante. O reino Excêntrico e o Mundo Além são fascinantes. É uma construção que entrega um novo olhar sobre criaturas mágicas já trabalhadas em outras histórias. Também tem espaço para política e conflitos territoriais, além de falar sobre intolerância e desconstrução do medo do desconhecido. E, é claro, romance.
Isobel e Rook - o príncipe da corte outonal - são protagonistas carismáticos. Ela, mais do que ninguém, carrega o livro nas costas. O lado humano da pintora versus o lado imortal do príncipe trazem ótimos questionamentos aos personagens, e mesmo o romance se equilibra bem à parte mágica que dá tom à narrativa.
Isobel é ótima. Tem atitude, presença e força. É frágil, também, e humana acima de tudo. Ela não tem grandes sonhos ou desejos; quer ver o mundo, sim, mas também quer ficar com sua família - bastante curiosa, por sinal, composta pela tia que a adotou e pelas gêmeas March e May, cabras transformadas em garotas graças a um encantamento que deu errado.
"- Um corvo para riscos incertos. Seis para perigos garantidos. Doze para morte, se não tiver como ser evitada. O feitiço está concluído."
Ela vive para suas pinturas e para a arte, para as cores do mundo e das pessoas. É fascinada pelos feéricos tanto quanto os teme, com toda sua sensatez. Em Rook, Isobel vê fragilidade e um traço de emoção que não existe nos outros imortais. É sutil, mas está ali. Ao retratá-lo, ela acaba quebrando toda a rotina pacífica e é dragada para dentro do universo fantástico; é uma prisioneira e então é uma aliada, porque a situação entre as fadas não é de toda ordem.
Pelo contrário, é o mais completo caos. Eles vivem em um verão eterno, sob o reinado de um monarca temido. As cortes são divididas e seus membros, egoístas. Mais do que qualquer coisa, a visão que é entregue com o desenvolvimento da obra é o quanto toda a beleza, perfeição e impecabilidade dos feéricos esconde o que eles realmente são. Rook tem aquela aura vulnerável, mas outros vão além disso.
O poder de se encantar e de encantar seus entornos é um vício, e a mentira é a droga que eles usam.
Por falar no Rook, que amor de personagem bem desenvolvido! Num primeiro encontro, ele é aquele ser místico e fascinante. Depois, o príncipe turrão e brusco parece desesperado por justiça, sem entender exatamente o que ela significa. E, então, conforme a interação entre ele e Isobel se desenvolve, acontece aquela química e conexão poderosas. São dois corações distintos, de universos que convivem, mas não se unem, e podem estar dispostos a ir contra leis antigas para entender seus próprios sentimentos.
Deu pra ler as cores que compõem as cortes, os detalhes naturais de cada canto explorado pela protagonista, assim como as partes vis e temíveis desse mesmo mundo. Margaret Rogerson pinta O Encanto dos Corvos com a mesma delicadeza e riqueza com que sua protagonista pinta seus quadros; ela dá cor a um universo tenebroso e enigmático, cheio de magia, monstros nascidos de transmutações terríveis, e caminhos sem fim.
"- Você nunca foi um peão. Desde o começo você sempre foi a rainha."
Diferente de O Feitiço dos Espinhos, que é uma grande aventura, O Encanto dos Corvos lida mais com o emocional, com o romance e com o perigo que representa se entregar a um novo mundo. É uma romantasia.
A edição da Literalize segue impecável e apaixonante ao olhar. Combina perfeitamente com o clima da história, com os detalhes nos inícios de página semelhantes a pinturas e a divisão entre os capítulos remetendo a pingos de tinta. A diagramação está bem espaçosa, e a adaptação da capa ficou ótima. A tradução da Sofia Soter também caiu como luva, de novo (ela foi responsável por traduzir O Feitiço dos Espinhos).
Se você é apaixonade por universos criativos, um pouco sinistros, e por um romance arrebatador e proibido, esse é o livro para estar na sua estante. O Encanto dos Corvos é volume único e tem um final agradável e bem fechado. É uma história perfeita para quem ama fantasia, romance e aventura.
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