elycely 23/04/2022
Ser mulher e ser cristã
A autora organiza o livro a partir de aspectos do caráter de Deus (beleza, vida, ira, ordem, criatividade, etc) e o que eles implicam para a feminilidade. É o mais atual e honesto dentre os livros sobre a temática que já li.
A leitura é fluida, agradável. Os argumentos são bem organizados e apresentam de forma clara as posições teológicas que a autora defende.
Pontos positivos no conteúdo:
- Questiona os modelos de feminilidade florida e romântica, saída dos livros de Jane Austen, e o que chama de feminilidade exclusiva (só é possível ser mulher de fato se nos encaixamos em determinado padrão de personalidade, conduta, escolhas, estilo pessoal, etc). Propõem-se a ampliar o modelo e ser inclusiva à mulheres cristãs com diferentes vidas.
- Faz uma discussão honesta, equilibrada e bastante sensata em relação ao feminismo. Concordo que é preciso admitir que, embora o feminismo teórico é muitas vezes questionável, sem o feminismo prático nós mulheres ainda hoje estaríamos em lugares de total ausência de direitos.
O que não gostei tanto:
- Em vários momentos, acaba reforçando os mesmos estereótipos que inicialmente diz que pretende combater. Na estrutura e assuntos escolhidos, na discussão, nos exemplos usados, especialmente na segunda metade do livro, há um modelo de feminilidade casada, com filhos, do lar, com ministério específicos na igreja. Repetem-se lugares comuns, o que é pouco útil, e às vezes um peso, para as mulheres que não estão neste perfil.
- Senti falta de aplicações mais amplas, trazendo de fato a inovação que promete. Afinal, falar em feminilidade não se reduz a falar de beleza, casamento, filhos e atuação na igreja, certo? Qual de nós, na vida real, só fala sobre isso ou preocupa-se apenas com essas temáticas?
Cadê as mulheres na vida civil, ou vivendo suas missões de vida de tantas e tantas outras formas, ordinárias, extraordinárias? A história é repleta de exemplos de mulheres cristãs que tiveram vidas marcantes e inspiradoras principalmente por seu amor a Jesus, não pelos papéis sociais que ocuparam. Muitas delas, do contrário, para poder viver uma vida de obediência e fé, desafiaram a ordem social de seu tempo ainda em épocas em que "empoderamento feminino" era uma viagem ao futuro.
De toda forma, recomendo a leitura, pois o livro é, com certeza, um avanço dentro da discussão. Fiquei assustada que alguns assuntos ainda precisem ser mencionados (ex: ser mulher cristã implica um código de vestimenta florido e esvoaçante) e cheguei às últimas páginas sonhando com o dia em que a existência feminina cristã, na literatura, avance além dos reducionismos.