theus33 05/08/2023
? ? aquele com a resiliência de toda uma família;;
?Durante anos neste país, não houve ninguém em quem homens negros pudessem extravasar sua raiva, exceto mulheres negras.? É com esse trecho de um discurso de Toni Morrison que somos introduzidos em Memphis. E, bom, não consigo imaginar melhor forma de fazê-lo. Esse livro, ao mesmo tempo tão forte e tão simples, nos apresenta não só um cenário de violência urbana e domiciliar, mas também a união e o amor de mulheres fortes que lutam contra esses fatores diariamente.
Memphis apresenta a visão de 4 mulheres da família North: Hazel, a avó já falecida; Miriam e August, irmãs, filhas de Hazel; Joan, filha de Miriam e única personagem que tem sua história narrada em primeira pessoa. Ao longo do enredo, somos apresentados às lutas internas de cada uma dessas personagens (particularmente muito bem desenvolvidas e ricas psicologicamente) e seus dilemas, que são influenciados pela violência contra a população negra dos Estados Unidos. Hazel lida com a violência policial e com o desafio de ser uma mãe solteira, negra, nos EUA dos anos 60. Miriam também enfrenta o problema de ser mãe solteira, mas também os traumas da violência doméstica, enquanto August é impedida de seguir sua carreira artística, além de lidar com o fato de o filho estar entrando no mundo do crime. E, por último, Joan, lida com um dos fantasmas mais dolorosos do livro: ter sido vítima de abuso aos três anos de idade.
É de se esperar que todos esses problemas constituam uma obra de atmosfera pesada, cinzenta, mas não é exatamente o que acontece. Claro que, todos esses eventos são de quebrar o coração de qualquer um. Porém, a autora constrói em volta dessas mulheres um sentimento de união tão forte, de comunidade que, assim como elas, acreditamos que tudo vai ficar bem no final.
Porém, claro que todos não vivem num conto de fadas entre si; Miriam e Joan entram em embates muito fortes em relação ao seu futuro, e August também possui certas diferenças com Miriam. Dito isso, também há Derek, o primo que abusou de Joan e com o qual ela teve de dividir o teto por dois longo anos. À parte de brigas, é importante salientar: a arte é algo muito importante neste livro, tal qual a música. Os dons da família North para a arte discorrem sobre as páginas nos impressionando, sempre.
A construção das personagens é muito boa, sentimos suas dores e seus anseios ao longo de Memphis, e a escrita lírica da autora deixa tudo melhor. O meu único motivo para não dar 5 estrelas é querer mais destaque para August, pois ela é a personagem mais intrigante do livro e merecia receber mais destaque. O fato de ela não acreditar em Deus, por sentir que ele tirou tudo dela, por exemplo, é algo muito forte e que deveria ter sido mais trabalhado.
Além disso, vale destacar a constituição de Memphis enquanto cidade-personagem. Não, não existem ações realizadas por Memphis, como em O Cortiço, de Aluísio Azevedo, mas a escolha do local em questão para o enredo é interessante, já que Memphis é o palco do movimento e de maior população negra dos EUA, sendo muito importante na história dos direitos civis. Além disso, foi o local onde Martin Luther King Jr. foi assassinado.
Por fim, obviamente recomendo Memphis, é um ótimo livro, rápido de ser lido e fácil de se apegar.