spoiler visualizarTauane.Fracarolli 21/07/2020
As Três Marias, Rachel de Queiroz
"Olho as Três-Marias, juntas, brilhando. Glória reluz, impassível, num raio seguro e azul. Maria José, pequenina, fulge tremendo, modesta e inquieta como sempre. E eu, ai de mim, brilho também, hei de brilhar ainda por muito tempo - e parece que a minha luz tem um fulgor molhado e ardente de olhos chorando."
As Três Marias é o romance mais autobiográfico de Rachel de Queiroz, escrito em 1939, onde ela retrata, na voz de Guta, seus anseios, suas descobertas e a saudade de casa após ser deixada num internato pelo pai e pela madrasta aos doze anos.
É no Colégio que ela conhece Maria José e Glória, e logo se tornam amigas inseparáveis. O apelido de três Marias
é dado por uma das Irmãs do internato logo no início do livro, por estarem sempre grudadas em todos os cantos. A partir daí, as estrelas se tornam marca registrada do trio.
Glória é órfã e tem uma vida sofrida, envolta pelo luto do pai e da mãe. Maria José foi abandonada pelo pai, que
deixou a família para viver com outra mulher. Juntas, as três compartilham dos mesmos dramas e também das
diferenças, fortalecendo sua amizade cada dia mais.
O Colégio era grande e dividido. De um lado, viviam as meninas - muitas delas órfas - mais afortunadas; no centro, grandes salas serenas e iluminadas abrigavam as Irmãs, e ninguém além delas tinha permissão para entrar
ali; e, do outro lado, as meninas mais humildes aprendiam o trabalho penoso dos pobres, as "obrigações de mulher".
O contato entre os dois lados era expressamente proibido, mas nem isso impediu que amizades secretas se
formassem.
A história nos mostra, de certa forma, a impotência das mulheres daquela época, que, ou tinham vocação para o
matrimônio, ou para a vida religiosa. As que não se encaixavam nesses padrões acabavam "excluídas da sociedade", vivendo e sendo tratadas, muitas vezes de forma degradante.
Quando enfim saiu do Colégio, Guta esperava se libertar das amarras de sua infância, mas o que encontra em casa é a continuação de uma vida cheia de regras e completamente monótona, com sua madrasta lhe impondo deveres e ensinamentos de como cuidar de um lar.
Decide então voltar para Fortaleza quando surge um emprego de datilógrafa, passando a dividir o quarto com Maria José, que morava com a mãe e a ajudava com as despesas e sustento dos irmãos.
Rachel de Queiroz afirmava não ser feminista, porém o romance nos traz uma visão totalmente contrária. Ela deu voz às mulheres num século onde a literatura era completamente dominada pelos homens. E, mais além, colocou todos os papéis masculinos em segundo plano, nos mostrando que as mulheres podem sim ter um destino totalmente diferente do que o que era pregado naquela época.
Cada uma das três escolheu por seguir um caminho completamente diferente: Glória viveu um casamento feliz e devoto, enquanto Maria José seguiu pelo caminho religioso e Guta decidiu que queria ser livre, experimentar e descobrir o mundo.
Antes mesmo de ser um tema abordado pela sociedade, Queiroz já nos abria a mente para o poder da emancipação feminina.