Natalia 12/05/2020
Da árvore do menino brota delicadeza
O Menino do Dedo Verde é um livro singelo, cheio de sentimentos e recheado de discussões importantes para todas as faixas etárias. A escrita de Maurice Druon é compreensível para as crianças e fluida para os adultos, que buscam nas entrelinhas as mensagens profundas encadeadas página a página. Lembro-me de quando uma professora leu para a minha turma um capítulo desse livro -- foi encantador! Para mim e para meus colegas, que alugaram todos os exemplares da biblioteca antes que eu tivesse chance. O tempo passou e novos livros chegaram; a mente das crianças esquece rápido e, de quebra, já tinham me contado o final (que me revoltou profundamente)... Talvez por isso eu me recordasse dele com uma pontinha de tristeza. Felicidade a minha de revisitá-lo e entender melhor seus caminhos, entremeados na história de Tistu. São muitas as reflexões que ficam após a curta leitura desse clássico tão lindo.
Tistu era uma criança que não se dava bem com a escola. Nas carteiras, cochilava, dormia, sonhava e roncava. No lugar da falta de esperança e desistência, foi proposta uma educação libertadora: para a vida com lições da vida. O menino passeia por conceitos de gente grande com a sutileza que só o olhar de um ser em formação pode nos passar. Druon, através de Tistu, conversa sobre arte, o valor de um mestre, a relação com os pais, cárcere, pobreza, o processo saúde-doença, compaixão, os fundamentos da guerra, comércio, luto e coragem.
Durante a jornada do menino, seu talento foi encontrado e ele revolucionou a sua cidade. Por menor que fosse Mirapólvora, a sua mudança é enormemente representativa, pois ali a paz venceu a guerra através da arte. Seria bom se esse resultado se estendesse para o nosso mundo real, que ainda cria e alimenta guerras para vender armas. Que bonito seria se as armas virassem flores e nós, simplesmente, nos contentássemos com o encanto desse cenário e passássemos a não olhar para o próximo com afastamentos e preconceitos; afinal, compartilhamos a mesmíssima vontade de sermos felizes. Ah... Como vocês podem ver, "O menino do dedo verde" faz sonhar alto (e utópico).
Com um pouco mais de pé no chão (talvez nem tanto), fica um aprendizado: se olhássemos para as crianças com mais carinho, com certeza, acharíamos dons quase mágicos, capazes de mudar a realidade das nossas casas, ruas e cidades... Quem sabe do país e do mundo? Ver os seres em formação como extensões das nossas expectativas como pais, avós, tios, professores ou, simplesmente, adultos, é extremamente improdutivo e cerceia as liberdades de quem só quer florescer no seu tempo, com a dose certa de orientação. Não deveríamos -- com imposições, regras, instituições e sistemas falidos -- cortar as asas dos nossos anjos.