Lurdes 15/01/2024
Aí, Annie Ernaux... Que bom saber que você, uma mulher tão inteligente, poderosa e racional, já se entregou a uma paixão desvairada, de tirar o fôlego, tirar o apetite, tirar o chão, tirar a razão.
Quem nunca?
Quem já não passou por este estado de semiconsciência, em que tudo gira em torno do objeto de nossa paixão?
Annie compartilha conosco este período em que ela ficou completamente entregue a este sentimento por um homem estrangeiro, casado, que nem sempre estava disponível, mas era desejado, lembrado, adorado 24 horas por dia.
Sua rotina era esperar seu telefonema, planejar o encontro e, tão logo este acabasse, iniciar a espera pelo próximo. Nada mais parecia ter importância.
"O tempo todo me assaltava o desejo de terminar, para não ter mais que ficar à mercê de uma chamada, para não sofrer mais, e logo imaginava o que viria com o término: uma sequência de dias sem nada para esperar."
Ela tenta analisar como chegou a este ponto e planeja sair desta dependência obsessiva, mas a sensação é sempre esta: a de que sem ele não vai restar nada, nem mesmo a espera.
Mais uma vez a autora nos nocauteia com sua escrita, tão cirúrgica.
Recomendo este, como todos os outros dela.
O que seus livros tem de pequenos em tamanho, tem de imensos em profundidade.