Wellington Ferreira 11/03/2018
Ninguém é o que parece ser...
Tendemos a ver e a julgar no outro as suas más condutas, as falhas no comportamento, os desvios de caráter, os pecados e transgressões que cometem, os erros, os fracassos... enfim, tudo de condenável que fazem. Todavia, ao fazermos esse diagnóstico da existência do outro, nos esquecemos que, se fizermos uma análise profunda e introspectiva do nosso Eu, perceberemos que na verdade toda essa representação comportamental que repudiamos na vida alheia é, na verdade, reflexo de características intrínsecas que habitam em nós, mas que, por cegueira existencial, orgulho ou egoísmo, fingimos não tê-las, pois apontar o dedo para o outro é mais fácil e não nos causa dor.
Dostóievski, nessa obra, "O Duplo", pega esse conceito e o dramatiza na vida de um homem que julga-se bom; bom em tudo: bom cidadão, bom homem, bom funcionário, bom patrão, boa pessoa... no entanto, ao deparar-se com um outro ser fisicamente igual a ele, porém, diametralmente oposto no que tange a valores e princípios, ele fica chocado com o que vê e, principalmente, com as atitudes do seu outro "eu", pois as considera abomináveis, inescrupulosas e desleais. Na sua cabeça, ele jamais seria ou faria o que o seu outro Eu é e faz.
Apesar de Dostóievski não ter se aprofundado tanto na análise das peculiaridades psicológicas do protagonista (isso pode ser explicado pelo fato de "O Duplo" ter sido seu segundo livro, ou seja, lemos aqui um autor ainda em início de carreira, portanto, não cabe a comparação do Dostóievski que escreveu "Crime e Castigo" e "Irmãos Karamazov", nesses dois livros, o autor já era bem mais maduro e já tinha vivido e sofrido muito), a mensagem que ele quer passar no livro fica muito clara: Ninguém é tão bom quanto acha que é ou parecer ser. Todos temos o nosso lado bom e o lado mau, e tendemos a usar um ou outro, de acordo com a conveniência, segundo escreveu Maquiavel.
Em resumo, "O Duplo" é o espelho do lado podre da nossa alma, que fingimos não ver ou existir, pois preferimos caracterizá-lo e representá-lo no outro, talvez como uma desculpa ou medo de nos confrontarmos e nos escandalizarmos com a podridão que encontraremos dentro nós.
Leitura recomendável para todos aqueles que se julgam "santos" e adoram criticar e apontar o dedo para os erros, fracassos e pecados alheios.
Fica a dica!?
Wellington Ferreira