Diário do Hospício e O Cemitério dos Vivos

Diário do Hospício e O Cemitério dos Vivos Lima Barreto




Resenhas - Diário do Hospício e O Cemitério dos Vivos


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MindNotes 09/01/2022

Obra complexa
Comecei a ler porque é um livro cobrado no vestibular, achei a história um pouco maçante mas entendi o desenrolar dela e os pensamentos decorrentes do protagonista.
De qualquer forma, vou procurar por uma resenha comentada sobre a obra.
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bella 30/04/2021

Cemitério de dentro e de fora
insta: @atocadaraposa

O livro "Cemitério dos Vivos", do jornalista e escritor Lima Barreto, é uma história que até pode ser considerada autobriográfica. O livro começa contando sobre o, personagem principal, Vicente Mascarenhas que, na primeira página, já revela que sua mulher está morta. A sra. Efigênia, como ele mesmo diz, moribunda prestes a morrer, lhe disse: "Vicente, você deve desenvolver aquela história da rapariga, num livro". Este é o ponto quando Mascarenhas volta no tempo para explicar o sentido da frase, como também, a história com seu amor inusitado.

​Mas antes de se ater ao dito casamento e a história do livro ele conta como foi difícil para ele, jovem pobre, ir para a grande Rio de Janeiro para estudar "pra ser doutor". Ele passa a frequentar a pensão de dona Clementina, mãe de Efigênia, seu ainda não tão grande amor. Ao pensar que poderia se apaixonar pela jovem, evita ir à pensão e conversar com ela, o que acaba por ser inevitável, ela rompe a timidez e começa a conversar. Os meses passam até que dona Clementina fica doente, quase a falecer, e, num dia de visita à senhora, Efigênia pede Mascarenhas em casamento, que aceita surpreso.

Vicente, jovem e inteligente, começa a trabalhar num jornal, por mais que não gostasse e por mais que escrevesse coisas de que não gostava, apenas para conseguir dinheiro para se sustentar. Então, após 5 anos de casamento e 1 filho de 4 anos no colo, sua mulher morre, de uma doença súbita.

Ele se vê sem caminho, sua esposa que tanto amava havia ido embora, sua sogra que não morrera estava viva para atormentá-lo, seu filho já crescido mostrava-se ainda analfabeto e sem vontade de estudar, seu emprego não lhe era satisfatório. Cansado, Mascarenhas se vê alcóolotra e, após um episódio triste, acaba sendo acometido em um hospício, onde passa a maior parte do livro. Convivendo com outros "loucos" e "alienados", ele descobre um pouco da personalidade de cada um, dentro daquele local com condições insalúbres para viver, um são em meio à loucos num verdadeiro cemitério dos vivos.

O livro pode ser considerado como uma autobiografia de Lima Barreto, visto que este foi internado em um hospício por alcolismo. Também, muito me lembrou as histórias contadas por Daniela Arbex em "Holocausto Brasileiro", livro que conta a realidade dos hospícios brasileiros com superlotação, maus-cuidados, entre outros problemas.

Apesar de tocante, em certas partes, o livro não muito me interessou. Admito que não gostei deste, talvez eu tenha que relê-lo mais pra frente mas, por enquanto, esta é minha opinião. Por mais que eu goste desse tipo de história, como gostei de Holocausto Brasileiro, não gostei da história do Dr. Vicente Mascarenhas e não recomendo. Lima Barreto, não foi dessa vez.

site: https://www.instagram.com/atocadaraposa/
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Taisa 17/04/2022

Ótima edição!
Esse livro foi um belo achado! A partir do diário, é possível conhecer o tratamento dado à época aos loucos (e reconhecer que não é tão diferente do atual...) e conhecer um pouco o processo criativo de Lima Barreto.
Os contos selecionados também são ótimos.
Igualmente, as ilustrações do livro.
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Bruna.Carolina 14/12/2021

Li apenas porque preciso pro vestibular, entendo a importância literária e histórica da obra mas foi um livro muito difícil de ler, extremamente lento, muito descritivo e cansativo.
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jordana 12/01/2022

Lima Barreto
Deve ser um livro muito interessante para críticos e pessoas mais cultas, mas pra mim, foi razoável e não me interessei tanto assim. Eu entendo a fama do Lima Barreto, sua história de vida e o porquê de ter ficado famoso, achei incrível o fato de ele não ser um louco mas estar dentro de um hospício. Ele fez diversas análises construtivas e realistas sobre esse sistema injusto. A parte mais interessante ao meu ver foi dos outros autores, como o Machado de Assis, pois, acredito que eu estou mais acostumada com a escrita deles do que do Lima Barreto.
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Camila 23/08/2021

Não gostei
Não consegui engajar na história, não gostei dos personagens e nem da escrita do autor. Entendo o contexto literário e histórico, mas não gostei.
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pluto 11/08/2021

Desnudou os ideais da época.
Eu li esse livro como obrigatório para a escola, e talvez por isso a leitura tenha sido massante e muito demorada para mim. O livro contém dois em um, então falarei separadamente de cada.
Em "Diário de um Hospício" o autor escreve uma autobiografia, e, na minha opinião, é inconcebível falar mal de uma história biográfica (é como reclamar da vida que a pessoa levou, que poderia ter sido mais emocionate, etc). Mas a escrita é criticável, e eu a achei muitas vezes cansativa e pouco fluida (o que pode ser consequência justamente do estado do autor).
Em "Cemitério dos Vivos" eu gostei da ficção. E, diferentemente do primeiro livro, nesse a escrita crua e, muitas vezes, inacabada, apenas me fez sentir mais conectada com a trama. Como se fosse um conceito, já que ele realmente estava escrevendo em condições precárias.
Gostaria também de elogiar a edição física, muito bem feita e bem acabada. As notas de rodapé eram essenciais em alguns pontos para a compreensão da narrativa (mesmo que se tornassem excessivas algumas vezes).
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Bruno Oliveira 04/06/2022

Um retrato a partir do Diário do Hospício, de Lima Barreto
1. Fazia algum tempo que eu desejava ler algo mais “autoral” de Lima Barreto. É que, independentemente dos méritos de seus romances, tais textos me davam a impressão de que o intelectual que os escrevia era mais interessante do que eles. Em função disso, Diário do hospício foi exatamente o livro que eu procurava: uma obra em que o escritor fala por si mesmo, sem o recurso dos personagens. Longe de atrapalhar, a diminuição das interposições literárias tornou mais nítido para mim o intelectual instigante que foi Lima Barreto.

2. Confesso que não costumo me reconhecer muito nos escritores que leio, nem mesmo nos meus favoritos. Talvez isso ocorra porque eles pensem muito diferente de mim, ou melhor, porque tenham vivido vidas bem diferentes da minha: Descartes, Espinosa e Hume, por exemplo, receberam uma educação privilegiada a qual eu sempre invejei, além de terem ao seu redor pensadores brilhantes para polir seus crescimentos. Machado, Bill Waterson e Quintana, por sua vez, conquanto tivessem vidas mais modestas, possuíam um tino artístico que eu nunca tive.

Afirmo isso porque, embora eu não goste muito do escritor Lima Barreto, admiro bastante o intelectual e me reconheço nele um bocado. Comecei a lê-lo por Triste Fim de Policarpo Quaresma, naquelas leituras da adolescência, porém o retomei agora mais velho, notando muito em comum entre nós. É verdade que ele era um negro alcoólatra lá das primeiras décadas depois escravidão, algo cuja dimensão está muito além de meu alcance, todavia ele também era um intelectual paupérrimo e decepcionado com a vida, um homem infeliz e mentalmente doente, como eu.

“Digo com franqueza, cem anos que viva eu, nunca poderão apagar-me da minha memória essas humilhações que sofri. Não por elas mesmas, que pouco valem; mas pela convicção que me trouxeram de que esta vida não vale nada, todas as posições falham e todas as precauções para um grande futuro são vãs”, p.82.

3. Diário do hospício não é propriamente um diário, quer dizer, o livro não consiste num registro cotidiano da passagem do autor pelo hospício, mas num relato ponderado acerca daquilo que ele viveu por lá. Memórias do cárcere, de Graciliano Ramos, por exemplo, diariza ─ à náusea ─ a passagem do autor pela prisão, algo que Diário do Hospício nem se aproxima de fazer. Somente algumas coisas são relatadas e o autor ainda tenta dar-lhes certo sentido literário que está em franca construção ao longo das páginas.

Por sinal, o livro é inacabado tanto como texto quanto como projeto. Como texto isso fica um tanto óbvio desde o começo: ele não está completo, certas histórias simplesmente não se resolvem e, na última parte do livro, sobram uma porção de excertos dispersos que ainda seriam trabalhados pelo autor. Como projeto, por sua vez, esse inacabamento aparece aos poucos, a medida que percebemos que o autor descreve coisas que sabemos não ter acontecido (como a esposa que ele descreve, mas que jamais existiu), ou que ele muda abruptamente de um tom autoral para um tom literário, como se tivesse acabado de ter uma ideia. Segundo o prefácio, o autor pretendia transformar o livro num romance e essas “invenções” foram criadas para serem reutilizadas mais tarde.

“Se foi o choque moral da loucura progressiva de meu pai, do sentimento de não poder ter a liberdade de realizar o ideal que tinha na vida, que me levou a ela [à bebida], só outro bem forte, mas agradável, que abrisse outras perspectivas na vida, talvez me tirasse dessa imunda bebida que, além de me fazer porco, me faz burro.
Não quero morrer, não; quero outra vida.”, p.57–58.

4. Como Lima Barreto foi parar no hospício? Segundo ele próprio, a bebedeira o levou a desenvolver episódios de delírio, o que fez com que seus parentes o internassem. Entretanto, como o autor não entra em detalhes a respeito do que lhe ocorre, seu diagnóstico fica bem obscuro.

O psiquiatra interpretava que o álcool lhe causara certo dano (*), produzindo os delírios, porém o literato parece não concordar com isso. Ele interpretava o álcool como apenas um resultado, um sintoma de outras coisas citadas com discrição ao longo do livro: a pobreza, a falta de reconhecimento, a ausência de perspectiva e o enlouquecimento do pai.

Em certa passagem, Lima Barreto afirma que a situação do pai lhe causou um medo constante de precisar, a qualquer momento, enterrá-lo ou pagar por algum tratamento com o qual não pudesse arcar. Provavelmente, ele viveu em agonia durante muito tempo, imaginando que a qualquer momento sua vida poderia ruir, algo que lhe cobrou um alto preço. Nesse sentido, a bebida é menos uma causa e mais um sintoma de coisas mais profundas e complexas.

No entanto, é preciso intervir um pouco aqui, pois a interpretação de Lima Barreto deixa algumas lacunas. Conquanto seja fácil colher de sua situação familiar e social motivos para explicar por que ele enlouqueceu, seu texto apresenta algumas coisas que o tornam mais complexo do que isso. Por exemplo, num determinado trecho, Lima Barreto menciona que a “mania de suicídio” o acompanhara desde criança.

Ora, o ideário suicida na infância não é um dado trivial. Mesmo numa vida ruim, a ideia de morrer não costuma passar pela mente de uma criança, tanto que o suicídio infantil é bem menos comum do que o adulto. Com efeito, é difícil não postular que ele tivesse certa tendência deprimida desde a juventude, algum componente endógeno que fazia de Lima Barreto alguém ainda mais complexo do que ele mesmo pensava.

“Tenho orgulho de me ter esforçado muito para realizar o meu ideal; mas me aborrece não ter sabido concomitantemente arranjar dinheiro ou posições rendosas que me fizessem respeitar. Sonhei Spinosa, mas não tive força para realizar a vida dele; sonhei Dostoiévsky, mas me faltou a sua névoa”, p.94.

5. Lima Barreto não se resolveu com a literatura, não virou o escritor que pretendia, nem causou o impacto almejado em termos de crítica e público. Os revezes do racismo, da pobreza e da doença do pai o prejudicaram profundamente, negando-lhe uma situação material condizente com seu talento. Ao que parece, ser um intelectual promissor pouco importa quando se é negro.

Inclusive, mesmo sua saúde não escapou disso: os Diário do Hospício foram escritos em 1919 e o autor morreu três anos depois, do coração. Seu pai morreu dois dias depois dele, como que preso ao filho por um cordão umbilical.

A bem dizer, é fácil idealizar as pessoas de que gostamos e pensar que suas alegrias compensam seus sofrimentos. De fora, é simples justificar uma vida. Todavia idealizações desse tipo não funcionam bem com Lima Barreto, uma vez que ele próprio as recusa ao ser profundamente lúcido a respeito de sua infelicidade. Aliás, creio ser nisso em que mais me reconheço nele: nesse sofrer transparente que não se esconde, nem procura por consolações ilusórias. Não se trata de um pessimista que interpreta todas as coisas pela mesma ótica decaída, mas de um artista sensível, capaz de notar o peso invisível que as coisas colocam sobre nós e, pouco a pouco, arruína-nos. É claro, nisso e em sua audácia de confessar publicamente seu grande pecado:

─ Estou vivo e tem sido horrível.

(*) Algo que não fica claro nem mesmo no prefácio que acompanha a obra é qual seria, nesse período em particular, o estatuto do alcoolismo. Pensava-se no alcoólatra como um doente? Como um degenerado moral? Ou nada disso?

site: https://medium.com/@br.oliveira
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legarcia 29/08/2022

Um gênio no manicômio
?Diário do hospício? é um relato das internações de Lima Barreto, o qual, posteriormente, serviria de material para a escrita do romance inconcluído ?Cemitério dos Vivos?.

A figura de Lima é muito particular e, nesse contexto das internações, a personalidade e o esforço desse grande autor superaram o meio degradante em que se encontrava, produzindo assim, textos que demonstram a lucidez e amplitude de reflexão deste.

A obra nos imerge em um cenário angustiante, narrando cenas as quais evocam os sentimentos mais pertubadores ao exporem a realidade do cotidiano em um manicômio, vivenciada por alguém em lucidez e que percebia os absurdos os quais era submetido.

Lima consegue nos transmitir muito bem as dores sentidas em cada aspecto de sua internação, como a perda de autonomia e de privacidade, a desumanização sofrida pelos internos e a convivência direta com a loucura. Tudo isso experenciado por alguém que detinha uma grande capacidade de compreensão acerca de sua realidade.

É angustiante ler os trechos em que o autor faz uma auto-análise de sua condição, refletindo sobre sua dependência química e percebendo que não viveu uma vida com sentido, que se perdeu e que, ali no manicômio, era submetido a situações atrozes sem poder lutar contra.

Lima escreve suas dores com uma impressionante técnica narrativa, o que torna os textos ainda mais poderosos e potencializa o seu efeito no leitor. Fiquei maravilhada com a capacidade de escrita do autor e com seu grande entendimento e sua admirável compreensão da realidade.

Por fim, a leitura dessa obra é muito agregadora, uma vez que nos permite ter contato de uma forma pungente com realidades, infelizmente, vivenciadas por internos e também de ter contato com a loucura para que possamos ter reflexões importantes acerca dessas questões.
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Maria.Conceicao 22/03/2021

Se eu pudesse te ajudar, seria te dando amor.
Diário de um hospício e cemitério dos mortos, é de lomge um livro lindo, bem editado e uma das obras mais sinceras, afetivas e subejivas de Lima. Ainda no pós-abolição, temos o pai da Literatura afro-brasileira militante, nos apontando um caminho com a própria vida: não deixe que eles destruam você. Lima, em tudo foi grandioso. Obra simplesmente genial. Cuidemos da nossa saúde mental e afetiva. Afinal, somos seres humanos.
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Levi_Motta 18/06/2023

Excelente escritor, mas...
Eu já tinha lido o Lima Barreto há alguns anos, então eu conhecia mais ou menos o que ele escrevia e tals, mas esse livro não me pegou. Sei da importância histórica da obra, inclusive algumas referências são bem interessantes, mas eu fiquei confuso em alguns momentos, principalmente na segunda parte, que é uma história mais ficcional.
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João 02/12/2020

Diário do hospício e Cemitério dos vivos - Lima Barreto.

Não há dúvidas de que o escritor carioca Lima Barreto, ícone da literatura pré-modernista, foi um dos maiores escritores brasileiros do século XX. No entanto, o reconhecimento do público e da crítica em geral sobreveio tardiamente, postumamente.

Hoje, lendo-se não só os romances e os contos do Lima Barreto, mas especialmente suas crônicas e diários, nota-se o amor às letras, a devoção ao conhecimento, a abnegação do estudioso e a lucidez do crítico de seu tempo.

A inteligência e a sensibilidade aguda do escritor carioca pulsavam já nos seus primeiros textos literários e jornalísticos. Daí em diante a verve do autor logo ganha firmeza para consolidar o estilo crítico, satírico e erudito que tanto marcaram seus trabalhos.

No entanto, a independência e o espírito livre do autor fizeram dele um escritor marginalizado. As decisões tomadas ao longo da vida levaram o escritor carioca a traçar um caminho não convencional na cena público-literária do país. Entre outras circunstâncias que possivelmente contribuíram para o pouco prestígio do autor estão o fato de Lima Barreto se recusar a compor o círculo de bacharéis da República brasileira, acreditando antes no seu talento intrínseco, e desprezando o fetiche pelo título universitário que não deveria constituir garantia de inteligência e de talento. Só por isso, ele deve ter perdido visibilidade entre os letrados da República Velha. Some-se o fato de que Lima Barreto estava convencido de que o seu talento intrínseco deveria ser fator suficiente para a obtenção da glória literária. E por isso recusava a se sujeitar a bajulações e a quaisquer convenções que se mostrassem incoerentes com seu caráter franco e independente.

Daí decorre que Lima Barreto obteve muito pouco reconhecimento dos seus contemporâneos. Algumas importantes manifestações a seu favor vieram de escritores como José Veríssimo e Monteiro Lobato, vozes praticamente isoladas no tocante à obra do escritor. Basta lembrar que, embora tenha se candidatado três vezes à ABL, foi rejeitado em todas elas.

Lima Barreto sofreu profundamente a rejeição, ou melhor, o silêncio indiferente de seus contemporâneos. Tal situação feriu de morte o orgulho do escritor que desde a primeira infância tinha consciência do seu valor e inteligência. O autor nutriu desde muito cedo o desejo de ser grande, de realizar coisas belas e significativas no cenário das letras. Mas amargou o silêncio da indiferença, o preconceito racial e todas as agruras que daí decorrem.

Resulta, então, que machucado pela desilusão e pela desesperança, o escritor já não possuía coragem moral para suportar os dissabores do dia a dia. Os dramas familiares e a falta de dinheiro tornam-se problemas crescentes na vida do autor, selando o círculo de angústias.

No seu “Diário” fez constar: “A literatura ou me mata ou me dá o que eu peço dela”.
É nesse contexto que Lima Barreto torna-se um alcoólatra. E o consumo exagerado de bebidas alcoólicas passa a deflagrar crises mentais, permeadas por delírios, que levam o escritor a ser internado por diversas vezes no manicômio, por influência da família e pelas “mãos da polícia”.

E é nos momentos de lucidez, durante as internações do autor, que surgem os textos que compuseram o “Diário do hospício”.

O “Diário” contém notas e frangemos esparsos acercas das observações feitas pelo escritor. E, ao que parece, essas notas carregam o mote que dará vida e cores às crônicas posteriormente elaborados pelo autor.

Lima Barreto permaneceu - na última vez em que esteve internado no hospício – durante algumas semanas recolhido com dezenas de outros malucos e débeis mentais. Toda essa matéria humana que vai desde os inspetores, guardas, médicos e enfermeiros, até toda a sorte de mentecaptos que habitam os manicômios constituiu-se em um rico campo de observação para o escritor carioca.

O testemunho do autor não é indiferente às cenas pitorescas que marcaram sua permanência entre os loucos, cujas manias as mais diversas são capazes de despertar riso e piedade. Como é de se supor, houve também espaço para pequenas considerações acerca da loucura.

Importante constatar que mesmo machucado pela bebida e pelos delírios, Lima Barreto não abandona sua verve e seu olhar perscrutador durante os dias que foi mais um dentre os loucos no manicômio. Sequer abandonou as leituras diárias, graças a uma biblioteca de obras clássicas que guarnecia o sanatório.

As anotações reunidas no “Diário do hospício” serviram de adubo para a criação do romance inacabado “Cemitério dos Vivos”. Trata-se de um livro de memórias de Lima Barreto, fundado sob bases evidentemente autobiográficas, mas entremeados por personagens e episódios mais ou menos ficcionais, o que naturalmente conduz a uma certa confusão entre o que é ficção e o que é real.

A narrativa possui dois momentos bem marcados. Um concentrado na juventude do protagonista Vicente Mascarenhas, estudante cheio de sonhos e de ambições intelectuais. Porém, não se trata de um estudante qualquer, mas sim de um com as feições e o gênio do próprio Lima Barreto, dado ao autodidatismo, às coisas grandes e avesso à formação puramente acadêmica devotada do bacharelismo pedante; o outro momento é voltado para a ruína pessoal do protagonista, agora internado no hospício após sucessivas crises de alcoolismo acompanhadas de delírios e alucinações.

Conforme teria se passado com a vida do próprio escritor, todas essas crises por que passa o protagonista Vicente Mascarenhas guardam relação com as desgraças de ordem familiar, aliadas ao drama pela falta de dinheiro e à frustração pelo não reconhecimento do seu valor nos círculos literários.

O “Cemitério dos Vivos” agrada desde o início pela fluência e ritmo narrativos. Começa com o protagonista, à maneira de um defunto autor (para lembrar de Brás Cubas), rememorando a sua primeira mocidade. Logo, damo-nos conta de suas semelhanças com a história do próprio Lima Barreto. Trata-se assim de um personagem inteligente, honesto, com independência e sinceridade intelectual e profundamente entusiasmado com seus projetos pessoais de estudo.

Vicente Mascarenhas era, no entanto, de temperamento arredio e avesso a travar relações com as mulheres de sua geração. Sentia timidez, incapacidade e um não sei quê de medo e de receio. Jamais desejou o casamento, não se imaginava numa relação a dois. De algum modo entendia que isso poderia jogar por terra seus planos em torno de um futuro glorioso através dos estudos e das letras.

Entretanto, por força de acontecimentos improváveis (“o homem faz planos e Deus ri”), acabou casado com uma moça por quem possuía um misto de afeto e piedade.
Com a morte prematura de sua esposa, não demorou muito a perceber a falta de cumplicidade e de confiança mútua que havia entre ambos durante o casamento. Desenvolveu remorso ao se dar conta de que sua falecida esposa exercia, no final das contas, grande apoio moral sobre ele, instigando-o em seu trabalho intelectual e admirando-lhe a inteligência.

Vicente Mascarenhas é corroído pelo arrependimento, fundado no sentimento de que não soube compreender sua esposa, agora morta. Aterroriza-o, ainda, a percepção de que faltou amor durante toda a sua vida, uma vida que parece ter se desenvolvida num ambiente de extrema independência emocional e autonomia intelectual, mas cujas consequência agora eram sentidas. “ [...] não era bem a morte que eu queria, não era o aniquilamento da minha pessoa, a sua fragmentação até o infinito, nas coisas e nos seres, era outra vida, mais cheia de amor, de crença, de ilusão, sem nenhum poder de análise e isenta de toda e qualquer capacidade de exame sobre mim mesmo”.

O sofrimento do protagonista ainda é agravado pela falta de dinheiro e pelas humilhações daí decorrentes. Tudo isso o conduz à bebida. E a embriaguez contumaz desperta nele delírios e alucinações. Não demora muito para que os parentes mais próximos, com o auxílio da polícia, providenciem sua internação no hospício.

E daí nasce um novo momento narrativo calcado na observação atenta dos personagens que habitam o manicômio, desde os enfermeiros, médicos e guardas, até os seus companheiros de loucura, aqueles internos cheios de manias e delírios.

O romance é recheado de imagens literárias, de observações argutas sobre o universo circundante e pejada de referências à literatura e ao conhecimento científico em geral, próprias ao veio erudito de Lima Barreto.

Boas leituras!

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Isasc.exe 12/04/2024

Sinto que li esse livro no automático então não vale tanto minha opinião aqui
Quero poder reler algum dia com o olhar minucioso que ele demanda e merece
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Lucas Poliseli 22/09/2019

Arrastado
Sofri lendo este livro.
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Diego 29/07/2020

Muito interessante como Lima Barreto já tecia críticas extremamente relevantes aos manicômios décadas antes da Reforma Psiquiátrica italiana. A ficção e a realidade se confundem em muitos momentos
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