Helder 15/06/2011Um bem vindo romance nacionalAssim como uma pessoa já falou abaixo, eu também confesso que comecei a ler este livro cheio de preconceitos.
Acho que sou um dos únicos habitantes mundial que nunca li um livro sobre vampiros ou anjos nos últimos 5 anos. Acho este tipo de ficção uma bobagem sem tamanho, e nada me tira da cabeça que são livros para mulheres,por serem extremamente açucarados.
Por outro lado, tinha medo de ser um livro religioso, que quisesse pregar uma mensagem ou puxando para o lado da auto ajuda, ou ainda um livro cheios de batalhas, feito para moleques viciados em campeonatos de jogos de computador realizados em Lan House ou RPG.
Se você também acha qualquer uma destas coisas sobre este livro, e até agora não teve coragem de lê-lo, pare agora o que está fazendo e comece a leitura.
Acho que de tudo o que eu tinha medo, o que mais se aproxima dos meus preconceitos é a linguagem um pouco nerd no começo, descrevendo armas magníficas, armaduras invencíveis e personagens mais imortais do que o coiote do Papa Léguas.
Às vezes é mesmo um monte de baboseiras, mas deixe-se levar pela leitura e vai se surpreender pelo magnífico mundo criado pelo brasileiro Eduardo Spohr. Só ai já ganhou pontos comigo. Acho péssimo ir a livraria e a literatura nacional ser formada somente por livros de contos ou auto-ajuda. Quando encontramos um “doido” que se predispõe a pesquisar algo, criar uma estória e escrever um romance, com certeza merece nossa atenção e nossos aplausos.
Talvez por não ter contato com o mundo dos anjos, vampiros e afins, achei o livro bem original. Conta a estória de Ablon, um anjo que foi expulso do paraíso, por ser contra as idéias do Arcanjo Miguel , que em nome de seu pai, Deus, resolveu exterminar a humanidade.
De maneira bem inteligente, assim como Forrest Gump ia passando por eventos da história americana, Ablon vai passando por eventos da história mundial e principalmente por eventos citados na Biblia, mas tudo em forma de romance, nada associado a mensagens bíblicas para te converter a alguma religião.
Aliás, como já citado em outras resenhas por aqui, pessoas muito religiosas poderão se ofender muito com algumas descrições e com o “samba do anjo doido” criado pelo autor. Se fosse um livro estrangeiro, com certeza teria gerado muita polêmica por ai e poderia ter ganhado uma boa grana em cima disso. Afinal de contas, se Codigo da Vinci pos em dúvida a virgindade de Cristo, o que falar de um livro que põe em cheque sua origem / paternidade?
No inicio do livro encontramos Ablon no Rio de Janeiro, sentado sobre os braços do Cristo Redentor e aguardando a chegada de Orion, o antigo rei de Atlantida que veio convidá-lo a se unir a Lúcifer. E é no Rio de Janeiro e na época presente, que Ablon nos conta o que está acontecendo no mundo do momento. Na terra, o mundo se dividiu em dois e está prestes a começar a 3ª guerra mundial. No plano dos anjos, isso nada mais é do que o inicio do Apocalipse, onde os anjos entrarão em guerra entre eles mesmos para ver quem conquista o poder de Deus, que no momento está dormindo, pois tudo isso está rolando durante o sétimo dia após a criação do mundo.
E assim, o livro vai rolando em dois tempos. No presente, onde a cada momento o apocalipse fica mais próximo, e no passado, aonde vamos conhecendo a estória de Ablon e Shamira, sua amiga feiticeira. O autor nos leva a Babel, Atlântida, Sodoma, China antiga, Mesopotâmia, Roma, Constantinopla, Inglaterra Feudal, Jerusalém, além do céu e do inferno. Sempre colocando sua ficção associada a tempo ou geografia conhecida por nós, em nossos livros de história e/ou geografia do ginásio.
Assim como livros americanos que fazem este tipo de trabalho (vide Forrest Gump ou o mais novo Queda de Gigantes de Ken Follett), no mínimo o autor faz com que a gente tenha vontade de ir a net pesquisar os eventos e locais descritos. E não é nada daquele excesso de detalhes que torna alguns livros de fantasia muito chatos. Aqui, a maioria dos detalhes servem para fazer a estória andar e você se divertir.
E se quando está no passado a estória é muito interessante, quando ela vem para o presente também nos brinda com momentos incrivelmente “pops”, que com certeza dariam um filme. Que vontade de ver o anjo Ablon numa moto sobre a ponte Rio Niteroi com anjos pendurados nos postes, ou ele e seus parceiros andando de metrô, ou Sieme, a anja da mente aprendendo como pilotar um avião lendo a mente de um agente de vôo da torre de controle do Galeão.
Haja criatividade. E parabéns ao autor. Que ele continue consumindo e transformando muita cultura pop. O livro nos traz lembranças desde os filmes bíblicos que passavam na sessão da tarde na Pascoa, até Matrix. Tudo misturado.
Outro ponto legal também é que no fim ele consegue uma explicação surreal, mas se você estiver aberto a surpresas, até bem interessante, para sua estória maluca. Impossível imaginar tal rebelião e aliados.
O grande ponto negativo da estória, é a tão citada falta de livre arbítrio dos anjos. Ai o autor cometeu um grande furo, pois o que os anjos mais fazem por ali são escolhas. Impossível entender o que o autor quis dizer com isso. Então cada vez que vinha com esse papo de novo sobre os anjos me dava vontade de rir. Fico imaginando o que Miguel e Lucifer teriam feito se tivessem o poder de escolha.
Por fim, não posso deixar de dizer uma coisa que ao ler o livro diversas vezes me passou pela cabeça : ser imortal deve ser muito chato, pois não consigo me imaginar tendo que viver mil anos para reencontrar um amigo ou alguém que ame.