Literatura & outros blues 15/04/2015
Toma um fósforo, acende teu cigarro e leia Augusto dos Anjos!
Schopenhauer escreveu que “a morte é a musa da filosofia” – Augusto dos Anjos tinha essa frase tatuada em sua pele. “Eu e outras poesias” não é um livro para pessoas sensíveis. O poeta martela este lugar-comum: em um curtíssimo intervalo de tempo, somos apenas uma porção de carne - carne que escarra, carne que sangra, carne que vai virar comida para vermes, etc. Mas de tanto martelarmos chegaremos à náusea de Augusto dos Anjos e perceberemos que não ali não é lugar-comum, é antes um campo hostil destinado aos fortes. O "Eu e outras poesias" fala basicamente da “Psicologia de uma vencido”, que apanhou da vida (do amor, pelo que parece) e agora se depara com a morte.
Eu, particularmente, não gosto do poema metrificado ao qual o poeta ainda se sentia preso, pois acredito que a poesia está bem além de uma fôrma preestabelecida, de rimas, de outras questões de sonoridade. Até confesso que encontrei em Baudelaire satisfação, mas ainda assim creio que a poesia está além da fôrma. Agora me pergunto o que é que há de tão atrativo neste livro de poesia do Augusto dos Anjos? A resposta é seca: A liberdade. Numa época em que os poetas ficaram rotulados na história de Parnasianos ou Simbolistas pelos temas abordados, vem este poeta e, de forma inescrupulosa, grita sua angústia nua e cruamente. Ele foi o único poeta de renome nacional que não fez parte de uma escola literária (os pré-modernistas não é uma escola). E o que há de grandioso nisto? Ser grande de forma original, pois geralmente os escritores não fazem nada mais do que se copiarem – Daí vem a história para rotulá-los de “tal” e “tal”.
Bem, em meu livro de poesia “Crás!”, escrevi um soneto (apesar de não gostar muito de soneto) dedicado ao Augusto dos Anjos, abordando o fazer poético, e aqui quero compartilhar aos admiradores da obra do genial Augusto dos Anjos:
poema-escarro
A Augusto dos Anjos
o que é um verdadeiro poema
senão manchas de sangue?
é isso mesmo – o poeta tosse sangue
mancha tua folha com café
e ainda não serás poeta
baba em tua folha
e ainda não serás poeta
lhe darei a fórmula
tudo começa com escarros
escarra escarra escarra
até chegar ao sangue
da cor pus às hemácias
é uma longa jornada mas
é isso mesmo – o poeta tosse sangue
(07/05/14)